Política
A hora do voto consciente - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 06/10 Se fossem verduras e legumes, os prognósticos sobre a eleição em São Paulo feitos pelos politólogos ao longo desta campanha dariam uma boa salada. Poucas vezes houve tanta divergência de interpretações sobre a intenção de voto e o desempenho dos candidatos como na atual disputa paulistana, o que torna extremamente difícil antecipar o resultado. Tal cenário de confusão, em que nada é o que parece e intenções de voto migram de lá para cá ao sabor de picuinhas e diz-que-diz, reflete muito mais os problemas dos postulantes que suas virtudes. Nada menos que 37% dos eleitores não sabem dizer em quem vão votar, segundo a pesquisa do Datafolha que mede a intenção espontânea - aquela em que o eleitor deve dizer o nome de seu candidato. Em meio a esse desanimador cipoal eleitoral, porém, não se deve perder de vista a importância política desta eleição: o Município de São Paulo é o principal objetivo do PT em todo o País e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na missão que se atribuíram de liquidar a oposição e de se tornarem hegemônicos no Brasil. A grande surpresa da reta final foi a queda abrupta de Celso Russomanno (PRB), que perdeu 10 pontos porcentuais em duas semanas, segundo o Datafolha divulgou na quinta-feira. Com seus 25%, ele aparecia tecnicamente empatado com José Serra (PSDB), que tinha 23%. A candidatura de Russomanno despencou do mesmo modo como havia subido, isto é, como bom aventureiro ele não tinha um patrimônio eleitoral sólido no qual pudesse sustentar sua dianteira. As explicações para a liderança do "menino malufinho" variaram, mas a mais exótica delas foi atribuir-lhe poder de sedução sobre um certo "eleitor-consumidor", graças a seu passado de paladino na TV dos consumidores lesados. Em poucos dias, porém, ele espantou sua freguesia, e o Datafolha mostra que os votos que ele perdeu foram pulverizados entre os seus adversários - ou seja, Russomanno era o candidato de insatisfeitos de qualquer partido à direita e à esquerda. Com isso, até o azarão Gabriel Chalita (PMDB), em quarto lugar, animou-se a se considerar no páreo. Outras hipóteses sobre a extrema instabilidade do cenário se acumularam ao longo da campanha. Russomanno estaria liderando, por exemplo, em razão da "fadiga de material", como sugeriu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, referindo-se à polarização entre PT e PSDB em São Paulo e também ao "cansaço do eleitorado com a predominância do PSDB por longo tempo". O fator religioso também foi bastante mencionado. A proximidade de Russomanno com os evangélicos da Igreja Universal, a afinidade de Serra e de Chalita com os católicos e a suposta ofensa de Fernando Haddad (PT) aos religiosos graças ao famoso "kit gay" foram invocadas como elementos importantes na eleição. Nada disso, porém, foi capaz de mobilizar os eleitores - as pesquisas indicaram que a maioria deles não leva em conta questões de fé na hora de escolher seus candidatos. Do mesmo modo, os levantamentos demonstraram que os eleitores não pretendem votar pensando no escândalo do mensalão. Isso significa que a explicação para a estagnação da candidatura de Haddad deveria ser procurada em outro lugar - talvez no fato de que a eleição municipal não leva em conta questões nacionais, como pretendia Lula, que até a última pesquisa não conseguira transferir seu formidável capital popular para o candidato que inventou. A ironia é que um ingrediente importante dessa salada eleitoral foi introduzido pelo próprio Lula, ao estimular o crescimento do PRB de Russomanno e da Igreja Universal. O modelo lulista, que inclui abraçar Paulo Maluf e o bispo Edir Macedo, aposta na confusão ideológica, levando ao esvaziamento da política e abrindo caminho ao mais raso dos populismos. Amanhã estará nas mãos do eleitor paulistano, portanto, o poder de impedir que tal situação prospere. É na cabine de votação que os cidadãos interessados em abortar o arrivismo político, representado por Russomanno, e o aparelhamento do Estado a serviço de um partido e de seu projeto hegemônico, como pretende fazer o lulismo em São Paulo, poderão exercer o enorme poder que a democracia lhes confere.
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