Política
A paciência acabou O Estado de S. Paulo EDITORIAL,
Pouco depois de o presidente Rafael Correa ratificar a decisão que tomou no dia 23, determinando que a Construtora Odebrecht deve deixar o Equador, o Itamaraty comunicou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia determinado o cancelamento de uma missão chefiada pelo ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, que iria a Quito no dia 15 para negociar o financiamento de obras de infra-estrutura viária daquele país. A nota do Itamaraty esclarece que o presidente Lula tomou a decisão diante dos "últimos desdobramentos envolvendo empresas brasileiras, que contrastam com a expectativa de solução favorável quando do recente encontro entre os dois presidentes em Manaus".
Esta é a primeira vez que o governo petista reage com uma medida concreta - na verdade, uma retaliação - ao esbulho de interesses brasileiros nos países ditos bolivarianos. Duas refinarias e campos de petróleo e gás na Bolívia foram ocupados militarmente e virtualmente expropriados sem que o governo brasileiro reagisse à altura. Ao contrário, o chanceler Celso Amorim, na ocasião, afirmou o direito do governo boliviano às riquezas minerais do país, quando não era disso que se tratava, mas da maneira atrabiliária como o governo de Evo Morales se apropriou do patrimônio da empresa estatal brasileira. O caudilho Hugo Chávez também obrigou a Petrobrás a aceitar mudanças radicais em contratos de exploração de petróleo na Bacia do Orenoco, sem que Brasília esboçasse sequer um protesto.
No Equador, primeiro o presidente Rafael Correa determinou, no dia 23 do mês passado, a ocupação de quatro obras, no valor de US$ 500 milhões, tocadas pela Odebrecht, decretou a expulsão da empresa do país e suspendeu os direitos individuais de quatro diretores brasileiros da construtora - dois dos quais estão asilados na residência do embaixador brasileiro em Quito desde então -, e depois forçou a Petrobrás a devolver uma concessão de petróleo e a renegociar, a toque de caixa, o contrato de exploração de outro. A única reação do chanceler brasileiro a esse esbulho, seguido de violação de direitos fundamentais de cidadãos brasileiros, foi recomendar "paciência". O presidente Lula, por sua vez, ponderou que tais medidas de força faziam parte do quadro político determinado pela realização, naqueles dias, do referendo para aprovar a constituição bolivariana do Equador, e assumiu a posição do irmão mais velho, que deve suportar as estripulias do "irmão menor".
Custou para o governo brasileiro se convencer de que o que se passa no Equador é mais do que um simples incidente em disputa eleitoral ou uma afirmação de direitos soberanos sobre recursos nacionais. Embora a Constituição recém-aprovada seja muito mais branda que as adotadas pela Venezuela e pela Bolívia, no que diz respeito ao direito de propriedade e à iniciativa privada, está havendo no Equador uma nítida mudança do capitalismo para o "socialismo do século 21" bolivariano - e as empresas brasileiras que lá operam foram escolhidas para servir de exemplo.
Nessa terça-feira, depois que o presidente Correa ameaçou mais uma vez expulsar a Petrobrás do país, se a empresa não aceitasse imediatamente a transformação de seu contrato de concessão de área petrolífera em contrato de prestação de serviços - sem ao menos definir as indenizações pela expropriação e as condições do novo regime de exploração -, a paciência do presidente Lula começou a dar sinais de fadiga. Ao contrário do que fez nos casos da Bolívia e da Venezuela, autorizou a Petrobrás a negociar segundo os seus interesses e admitiu a hipótese de uma retirada da empresa do Equador, se os termos da negociação não fossem favoráveis. O chanceler Celso Amorim reiterou essa posição, acrescentando que a Petrobrás, saindo do Equador, deverá ser "adequadamente" compensada pelos investimentos lá feitos.
Não são, afinal, investimentos pequenos. Desde 1997 a Petrobrás aplicou no Equador US$ 430 milhões, dos quais US$ 200 milhões na pesquisa do bloco que foi obrigada a devolver recentemente, por não ter sido autorizada a explorá-lo. A Odebrecht, por sua vez, tem uma carteira de obras no valor de US$ 500 milhões - e Rafael Correa ameaça não pagar ao BNDES o financiamento de US$ 230 milhões para a construção da Hidrelétrica de San Francisco. O governo brasileiro deve exigir a justa compensação por esses investimentos.
loading...
-
A Má-fé De Correa
O chanceler Celso Amorim "não queria dizer nada (sobre o assunto), para que não soasse a ameaça". Mas, em Nova Délhi, onde acompanhava o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acabou dizendo o óbvio: se o governo do Equador não pagar...
-
Reação Tímida E Tardia Folha De S.paulo Editorial
FINALMENTE o governo brasileiro decidiu reagir às crescentes investidas do presidente do Equador, Rafael Correa, contra empresas brasileiras que operam no país. Nota divulgada ontem pelo Ministério das Relações Exteriores informa que o Brasil adiou...
-
Eliane CantanhÊde Brincando Com Fogo
- Mesmo quem tentava defender o presidente do Equador, Rafael Correa, agora concorda: ele ultrapassou todos os limites e está brincando com fogo. Com a retração do crédito mundial, quem vai investir no Equador e na Bolívia? Os EUA, que estão...
-
Equador Confirma Expulsão Da Odebrecht
Folha de S.Paulo, Governo dá um mês para construtora brasileira encerrar operações em suas quatro obras, que incluem duas hidrelétricas Atrito começou em junho, após problema que parou produção em uma usina; empresa não se pronuncia; decreto...
-
Está Na Hora De Perder A Paciência
As pesquisas de opinião indicam que a nova "constituição socialista e bolivariana" do Equador será aprovada, folgadamente, no referendo de domingo. Mas o presidente Rafael Correa não brinca em serviço. Para garantir a...
Política