Apagão: uma explicação mais lógica
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Apagão: uma explicação mais lógica


Não deu para apagar o apagão

O governo tentou encerrar a discussão sobre o blecaute apelando para raios simultâneos, mas a gênese do problema pode ter sido uma falha no isolamento elétrico da linha de Itaipu


Fábio Portela

Fotos Wilton Junior/AE e Mauricio Lima/AFP
EVASIVOS
O ministro Edison Lobão (à esq.) tentou encerrar o assunto do apagão; Dilma Rousseff
apenas desconversou


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Desorientado pelo apagão que atingiu dezoito estados do país no último dia 10, o governo federal foi rápido como um raio na hora de tentar tirar o problema de seu colo. Poucas horas depois do término do blecaute, o ministro Edison Lobão – que ocupa a pasta de Minas e Energia, mas não tem a menor intimidade com volts, watts e ampères – veio a público. Ansioso para encerrar o assunto, Lobão se apressou em garantir que o apagão havia sido causado pela queda de três raios, praticamente simultâneos, nas três linhas que compõem o maior ramal de transmissão elétrica do país, entre a usina de Itaipu e a cidade de São Paulo. Os três raios teriam causado três curto-circuitos, que deram início à reação em cadeia que deixou boa parte do país no escuro. A explicação não é crível por três razões: o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que monitora raios em todo o país, diz que nenhum deles atingiu o ramal de Itaipu na hora do apagão; mesmo que isso tivesse ocorrido, as linhas de transmissão são projetadas para suportar raios sem entrar em colapso; por fim, a probabilidade de três raios extremamente poderosos caírem em três linhas do mesmo ramal com diferença de milésimos de segundo é praticamente nula.

Na semana passada, especialistas começaram a trabalhar para tentar encontrar uma explicação lógica para a gênese do apagão. Foram convocados mais de setenta profissionais que atuam no setor elétrico brasileiro. Os mais decisivos para esclarecer o caso são os da usina de Itaipu, de Furnas (a empresa que administra as linhas que entraram em pane) e do Operador Nacional do Sistema (ONS), órgão que controla, segundo a segundo, toda a eletricidade produzida, transportada e distribuída no país. Após compararem os dados gravados com o comportamento do sistema elétrico na noite do apagão, eles passaram a formular uma nova hipótese, bem mais plausível que a dos raios triplos do ministro Lobão.

A primeira contribuição desse grupo de técnicos é a seguinte: os três curto-circuitos podem ter tido sua origem em uma falha do sistema de isolamento das linhas de transmissão. Esse isolamento é fundamental porque os cabos que conduzem a eletricidade são de metal e as torres que os sustentam também. Se os cabos tocassem as torres, o sistema viveria em curto. Para que isso não ocorra, os cabos são protegidos por peças de cerâmica chamadas de isoladores. Assim não há contato direto com as torres – e a eletricidade pode fluir ao longo da linha. O sistema de isolamento pode ter sido rompido pela água. Na hora do apagão, chovia forte na cidade paulista de Itaberá, onde as três linhas de transmissão vindas de Itaipu se encontram em uma subestação transformadora. A água da chuva pode ter formado uma película em volta dos isoladores, reduzindo a sua eficiência. "A chuva e os ventos que balançavam os cabos durante a tempestade podem ter reduzido a capacidade de alguns isoladores. A água é um condutor elétrico. Se um isolador acumula água da chuva, pode deixar de funcionar. A energia ‘escapa’ e tem-se um curto-circuito", disse a VEJA Hermes Chipp, diretor-geral do ONS. Essa hipótese se fortaleceu porque se descobriu que três isoladores do sistema ficaram chamuscados depois do apagão: dois localizados nas linhas de transmissão e um dentro da subestação de Itaberá.

Apesar disso, pode ser que a causa do blecaute não seja cravada com 100% de certeza. "Vamos finalizar nosso relatório na semana que vem. Ele deve contemplar duas hipóteses: a dos raios e a da quebra do isolamento", diz Chipp. A manutenção da hipótese dos raios é mais política do que técnica, embora o diretor-geral do ONS não diga. Serve apenas para não desmoralizar ainda mais Lobão, que foi mal nessa história. Como não poderia deixar de ser, os políticos aproveitam o episódio para fazer a dança da chuva esperando que raios e trovoadas atinjam o campo adversário. A ministra Dilma Rousseff, de quem se esperava uma atuação firme na condução das ações do governo, por ser ela uma especialista no setor elétrico, saiu de cena. Apareceu bem depois apenas para comentar, com aquela suavidade que lhe é característica, que o blecaute do governo Lula era menos grave do que o que ocorreu no governo de Fernando Henrique Cardoso. Como se dois erros produzissem um acerto. Do lado da oposição, o quadro mostrou-se ainda mais bizarro. Na semana passada, o líder dos tucanos no Senado, Arthur Virgílio, convocou um espírito conhecido como Cacique Cobra Coral, que seria especialista em meteorologia, para falar no Congresso. O tal cacique deveria encarnar em uma médium para dar sua opinião. Blague ou não, é um desrespeito para com os cidadãos. Enquanto o governo se esconde e a oposição ouve vozes, o Brasil continua no escuro – sem saber ao certo por que razão 88 milhões de pessoas ficaram sem luz no início do mês, e sem garantia de que isso não se repetirá.





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