Brincando com fogo
Política

Brincando com fogo


O ESTADO DE S PAULO EDITORIAL,
Por pouco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não termina o ano imerso numa grave crise militar ? seria a primeira desde a redemocratização, há um quarto de século. O governo petista brincou com fogo ao permitir a edição do decreto que instituiu o Programa Nacional de Direitos Humanos. Esse plano, que reúne 25 diretrizes e mais de 500 propostas e ações nas mais variadas áreas, seria apenas uma coleção de intenções, se não tivesse sido enxertado com algumas medidas que podem solapar os instrumentos que serviram de base para a pacificação da sociedade brasileira, na transição do regime militar para o Estado Democrático de Direito.

A reação dos comandantes militares à tentativa ? mais uma vez patrocinada pelo ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi ? de revogar a Lei da Anistia foi enérgica e recebeu inteiro apoio do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que há tempos vem tentando conter as iniciativas revanchistas de Vannuchi e do ministro da Justiça, Tarso Genro.

As pessoas pouco afeitas aos fatos ligados à repressão política, durante os governos militares, e que somente tomem conhecimento das iniciativas daquela dupla de ministros certamente terão a impressão de que os quartéis, na atualidade, estão cheios de torturadores e as Forças Armadas são dirigidas por liberticidas. Nada mais falso.

Os militares que cometeram abusos, torturaram e mataram durante a repressão há muito deixaram o serviço ativo. Seus nomes e seus feitos são conhecidos, assim como os de suas vítimas. Alguns deles estão sendo processados e o Supremo Tribunal Federal deverá decidir qual o alcance e a abrangência da Lei da Anistia. Esses acontecimentos as lideranças militares veem com "naturalidade institucional", ou seja, não perturbam a rotina castrense.

Muito diferentes são as tentativas de revogar a Lei da Anistia, para punir todo e qualquer agente do Estado que participou da repressão ? e isso não significa necessariamente ter abusado, torturado ou matado ?, mas garantindo a imunidade dos que atentaram contra as leis e a ordem vigentes, mesmo tendo abusado, torturado e matado ? pois a esquerda armada também fez isso.

Para os militares, é ponto de honra que a Lei da Anistia permaneça em vigor, nos termos em que foi aprovada em 1985. Entre outros motivos, porque assim se isola a instituição de uma fase histórica conflituosa, que exigiu que os militares deixassem de lado sua missão profissional tradicional e assumissem os encargos da luta contra a subversão. Isso não se fez sem prejuízos à coesão e à hierarquia das Forças Armadas.

Para a Nação, a manutenção da Lei da Anistia é mais que um ponto de honra. É a garantia de que os acontecimentos daquela época não serão usados como pretexto para que se promova uma nova e mais perniciosa divisão política e ideológica da família brasileira. Aqueles que viveram os acontecimentos de 1964 para cá sabem que a Lei da Anistia foi o marco que permitiu a reconciliação nacional e a redemocratização ? esta completada três anos depois com a nova Constituição ?, sem que houvesse os episódios de autoritarismo e violência que pipocaram durante os processos de abertura na Argentina, Chile, Uruguai e Peru.

Diante do pedido de demissão do ministro da Defesa e dos três comandantes militares, o presidente Lula recuou. Pediu ao ministro Nelson Jobim que garantisse aos comandantes das três Forças que o Palácio do Planalto não será porta-voz de medidas que levem à revogação da Lei da Anistia. Mas o mais absurdo é que o presidente da República argumentou que não tinha conhecimento do inteiro teor do Programa Nacional de Direitos Humanos ? daí prometer rever a parte do decreto que causou descontentamento e adiar o envio ao Congresso do projeto de lei de criação da comissão encarregada de investigar os abusos cometidos durante a ditadura.

O programa, de fato, é caudaloso. Inclui de medidas que permitiriam à polícia invadir dependências das Forças Armadas, "para identificar e preservar locais de tortura", até a regulamentação da taxação de grandes fortunas ? o que quer que isso tenha a ver com direitos humanos. Por isso mesmo, o dever do presidente da República era não apenas conhecer o cartapácio, como determinar a seus assessores o expurgo dos excessos ideológicos que lá estão registrados.



loading...

- Presidente Da Oab Diz Que Exemplo Da Argentina Ao Abrir Arquivos Deveria Ser Seguido
Do JB on line:"O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, afirmou nesta quinta-feira que a decisão da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, de abrir os arquivos confidenciais referentes à atuação das Forças Armadas...

- O Pig E Sua Fábrica De Crises.
A fábrica de crises por Maria inês Nassif, no Valor Econômico A crise militar fabricada em torno do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos tem sabor artificial. A história da elaboração do PNDH-III não justifica toda a comoção criada em...

- A Ditadura De Esquerda Chegando. VinganÇa Ou Maluquice? Por Alexandre Garcia
BLOG CASAGRANDE O País viveu em paz por 30 anos, até que a dupla Genro/Vanucci resolveu desenterrar o passado. Os militares não queriam o poder. Pressionados pelas ruas, pelos meios de informação, derrubaram Goulart e acabaram ficando 30 anos. Quando...

- Merval Pereira:: O Papel De Cada Um
O GLOBO Desde outubro, o presidente Lula sabe que estava crescendo "chifre em cabeça de cavalo" devido ao Programa Nacional de Direitos Humanos e, na tentativa de chegar a uma posição que agradasse tanto aos militares quanto aos militantes...

- José Nêumanne :eles Não Arriscavam A Pele Pela Democracia
O ESTADO DE S. PAULO Já que o secretário de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, está tão interessado em investigar a violação de direitos humanos pela ditadura militar que provocou uma crise interna no governo federal...



Política








.