O estado de São Paulo aprova a lei antifumo mais restritiva do país. É um grande passo para tentar apagar o cigarro da vida moderna
Sandra Brasil
JB Neto/AE |
SEM ABRIGO Em São Paulo, não poderá mais haver fumódromos dentro das empresas. Quem quiser dar suas baforadas terá de fazê-lo ao ar livre |
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A vida de quem fuma só piora no Brasil e no mundo. Mas agora, em São Paulo, fumar virou um inferno. Daqui para a frente, será proibido acender cigarros, cachimbos e charutos em qualquer ambiente coletivo fechado em todo o estado. Isso significa que: 1) restaurantes não poderão mais ter alas para fumantes; 2) bares terão de aposentar seus cinzeiros; 3) hotéis passarão a fiscalizar seus hóspedes; e 4) empresas serão obrigadas a fechar as acinzentadas salinhas conhecidas como fumódromos. Quem quiser dar suas tragadas só poderá fazê-lo em casa, no carro ou ao ar livre. A lei é tão rigorosa que mesmo ambientes com teto alto e sem paredes, como marquises, serão vetados ao tabaco. Os empresários que não se adequarem à lei em noventa dias poderão ser multados em até 3,2 milhões de reais. É para deixar qualquer um sem fôlego. A nova regra foi uma iniciativa do governador José Serra, do PSDB, o maior expoente da luta contra o fumo no país. Quando esteve no Ministério da Saúde, Serra (que não esconde de ninguém que detesta o cheiro de cigarro) baniu a propaganda de tabaco da televisão e obrigou os fabricantes a expor nos maços imagens chocantes, que mostram os malefícios do hábito.
À frente do governo paulista, Serra já havia tomado medidas domésticas contra a fumaça. Em 2007, ele não apenas acabou com os fumódromos do Palácio dos Bandeirantes como baniu o tabaco de toda a área interna e externa do local, incluindo jardim e estacionamento. Quem quer fumar um cigarro precisa andar 500 metros, cruzar o portão e sair para a rua. "Quando chove é pior, porque a gente precisa usar o guarda-chuva para chegar lá", conta Ricardo Meyer, funcionário da Casa Civil do governo. "Ficou tão difícil fumar que até decidi parar", diz ele. Nem mesmo o vice-governador de Serra, Alberto Goldman, conseguiu escapar da restrição. Quando ele quer degustar seus charutos, também precisa deixar o Palácio. O atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, aprova a iniciativa paulista. "A fumaça que sai da ponta do cigarro contém, em média, o triplo de nicotina e monóxido de carbono e até cinquenta vezes mais substâncias cancerígenas do que a fumaça que entra pela boca do fumante", diz. Por esse raciocínio, é mais do que justo que quem quiser acender um cigarro deva fazê-lo longe de quem não fuma.
Evelson de Freitas/AE |
XÔ, FUMAÇA Serra, que nunca suportou o cheiro de cigarro, respira aliviado |
O fim dos fumódromos fechados, um dos principais desdobramentos da lei, não será uma novidade completa para as empresas de São Paulo. Alguns edifícios comerciais já adotam o sistema que prevê o ambiente completamente livre de tabaco. Eles colocam os fumantes da porta para fora, literalmente. A publicitária Ana Maria Castelo Branco (35 anos, onze deles fumando) trabalha em um desses prédios. Quando quer fumar, desce 22 andares de elevador para matar a vontade em um espaço aberto ao lado do prédio. "Fumo logo uns três cigarros, porque não sei a que horas vou poder fazer isso novamente", diz ela. O fumódromo usado por ela, apesar de aberto, tem uma cobertura para abrigar as pessoas do sol e da chuva, o que é vetado pela nova lei paulista. "Achei um exagero proibir o fumo até debaixo de toldos e marquises. Torço para que isso seja corrigido na regulamentação. Senão, vou fumar onde? Dentro do carro?", queixa-se Ana Maria.
Quem considera a lei exagerada deve saber que São Paulo apenas se alinha a uma tendência mundial. Em Londres, desde 2007 não se pode fumar em espaços fechados, como pubs, cafés, restaurantes e escritórios. Lá, também foram extintos os fumódromos. Em Nova York, já é proibido fumar em lugares fechados desde 2003. No estado americano da Califórnia, a lei é ainda mais dura. Há mais de um ano é vetado fumar dentro dos carros se um dos passageiros tiver menos de 18 anos. Na cidade de Belmont, também na Califórnia, a restrição chega aos lares. Não se podem acender cigarros em apartamentos que dividam chão, teto ou parede com outros. Os fumantes americanos têm outro problema com que se preocupar: eles pagam, em média, 25% a mais pelo plano de saúde, já que o cigarro está associado a um sem-número de doenças. O caso mais radical é o do Butão, pequeno país espremido entre a Índia e a China, que simplesmente baniu a venda de tabaco em 2004. A brasa do tabagismo está se apagando mundo afora. E a maioria não fumante não quer deixar que ela seja reavivada.
Com reportagem de Gabriele Jimenez