Crítica ao “Império” de Toni Negri
Política

Crítica ao “Império” de Toni Negri


Multidões reunidas aleatoriamente por causas efémeras, tipo lego: montáveis, variáveis e desmontáveis a qualquer momento, venceriam um Poder virtualmente instalado que seria obrigado a submeter-se à vontade das maiorias consoante os interesses em causa.

a IV Frota dos EUA recentemente reactivada para o controlo da posição imperialista na América Latina acaba de destruir a ideia que pode haverImpériosem imperialismo. (segundo a obra de Michael Hardt Antonio Negri). Mais uma vez se demonstra que as réplicas da História são impiedosas com as modas intelectuais, que a seu tempo sempre luzem como indiscutíveis e inexpugnáveis. Mas as ideias nefastas acabam sempre por ser sepultadas pelos “factos, que, como se sabe “são infalíveis”
Bush estafou o par de botas texano

Alex Callinicos:

A leitura que Negri faz de Marx implica de facto uma reescrita sistemática de algumas das suas posições chave. Três exemplos:
(1) a lei da tendência de queda da taxa de juro - esta teoria é a base da teoria de Marx da crise capitalista. Porém para Negri, aqui fiel ao seu passado “operário”, o desenvolvimento do modo de produção capitalista está reduzido ao conflito directo entre capital e trabalho. Assim afirma que “a tendência de queda da taxa de juro indica a rebelião do trabalho vivo contra o poder da acumulação de juros”. Negri sabe perfeitamente que Marx, no volume III de “O Capital” faz desta tendência uma consequência da acumulação competitiva do capital, que leva os capitalistas a investir muito mais nos meios de produção do que na força de trabalho, causando assim uma queda das taxas de juro (porque o trabalho é a única fonte da criação de mais valias e riqueza), porém afirma que quando se conceptualiza nestes termos “toda a relação capital-trabalho será deslocada para o nível económico e impropriamente objectivizada”.

(2) a teoria dos salários – qualquer teoria que considera as crises uma consequência imediata directa do conflito entre capital e trabalho muito provavelmente atribuirá uma grande importância aos salários. Isto é assim, por exemplo, para as chamadas explicações do encolhimento dos juros pela subida dos salários, na primeira grande crise do pós-guerra durante os anos 70, quando a atribuiram ao facto de os trabalhadores bem organizados haviam obtido vantagem do pleno emprego para empurrar para cima os salários, reduzindo portanto a taxa de juro. Uma das implicações deste tipo de explicação é que os salários devem ser tratados como um factor autónomo. Consistente neste ponto, Negri afirma que quando o salário realmente aparece no primeiro volume de “O Capital”, considerando e reunindo um número de temas explicitamente lançados nos “Grundisse”, aparece como uma “variável independente”. As suas leis surgem da condensação num sujeito de revolta contra o trabalho contido no desenvolvimento capitalista.
Esta é uma passagem surpreendente. O que Marx realmente disse no volume I de “O Capital” é precisamente o oposto: “calculada matematicamente, a taxa de acumulação é a variável independente, não a dependente; a taxa de salários é a variável dependente, não a independente". Os salários são a variável dependente relativamente à acumulação de capital, porque os capitalistas, pelo seu controlo da taxa de investimento, também determinam a taxa de desemprego. Quando são confrontados com trabalhadores militantes, podem mudar a relação de forças entre classes a seu favor, organizando a paragem dos investimentos aumentando portanto o desemprego. Os trabalhadores, face à ameaça de despedimento, caem debaixo da pressão de aceitar salários mais baixos e de forma mais geral um aumento da taxa de exploração. Isto é precisamente o que vem a acontecer nos paises do débil capitalismo europeu desde a década de 70 - (cujo corolário de desinvestimento no trabalho se revelam agora como consequências sociais na presente crise)

(3) o trabalho como um sujeito absoluto – a flagrante má interpretação da teoria do salário de Marx é sintomática de uma volta conceptual mais profunda. Ainda que conceba o capitalismo como definido pelas relações antagónicas entre capital e trabalho, a primazia nesta relação é “o trabalho como subjectividade, como fonte, como potencial de toda a riqueza”. Uma vez mais isto contradiz directamente as próprias posições de Marx, mais especificamente no seu ataque na “Crítica do Programa de Gotha” à ideia que o trabalho é fonte única de riqueza: “o trabalho não é fonte de toda a riqueza”. A natureza é tanto a fonte dos valores de uso (e seguramente a riqueza material consiste neles) como o trabalho, que é só a manifestação de uma força da natureza, a força de trabalho humana.
A transformação feita por Negri do trabalho num tipo de sujeito absoluto tem reflexos na sua teoria da crise. Afirma que “a lei de queda da taxa de juro deriva do facto que o trabalho necessário é uma quantidade rígida"– o mesmo é dizer que, quando os capitalistas procuram reduzir a porção de trabalho necessário (requerido para reproduzir a força de trabalho na jornada laboral), e portanto aumenta a taxa de exploração, encontram “uma força com cada vez menos vontade de ser sujeitada, e menos disposta a ser comprimida”. Esta resistência obstinada significa “a autonomia da classe operária dentro do desenvolvimento do capital”.
Ora bem, Marx não é Deus. Não há nada sagrado nas suas teorias, e portanto não é nenhum crime revê-las. As perguntas interessantes têm que ver com a direcção das revisões de Negri e, se nos permitem ou não compreender efectivamente melhor o mundo contemporâneo. Críticamente Negri procura transformar o marxismo numa teoria do Poder. Assim afirma que “a relação capitalista é imediatamente um relação de poder” Dá uma importância especial ao facto que os “Grundrisse” (em português "Rascunhos" compilados tendo em vista a escrita de "O Capital" e apenas publicados em 1941) começam com uma extensa discussão sobre o dinheiro. Mas só a partir deste ponto Marx avança “da crítica do dinheiro para a crítica do poder”

(publicado originalmente em "Revolta Global.Net")
(3) ver também: "Teses sobre a não-centralidade do Trabalho"
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