Dora Kramer - A bossa da conquista
Política

Dora Kramer - A bossa da conquista



O Estado de S. Paulo - 04/03/2010

Nem Lula nem Fernando Henrique. Os responsáveis pelos avanços institucionais, econômicos e sociais do Brasil nestes 25 anos de retomada da democracia foram os fundadores da Nova República, cujo legado os governantes devem manter e superar em prol do desenvolvimento.

Esta será a tônica do discurso do governador de São Paulo, José Serra, quando assumir a condição de candidato a Presidência da República. Não por acaso, foi essa a linha adotada no pronunciamento de ontem no Congresso na solenidade em homenagem ao centenário de nascimento de Tancredo Neves.

Hoje Serra estará em Minas Gerais ao lado do governador Aécio Neves. O cerimonial só prevê discursos do governador e do vice-presidente José Alencar.

Se o protocolo for alterado e puder se pronunciar, José Serra optará por uma fala direta à população mineira para ressaltar a importância do papel do Estado na política nacional.

Independentemente de Aécio vir ou não a ser o vice, os tucanos vão se empenhar para alterar a ideia muito disseminada em Minas de que a vaga na chapa presidencial oferecida a Aécio Neves significa subalternidade de Minas a São Paulo.

Ao contrário, a disposição de Serra é dizer que os paulistas não pretendem ser antagonistas dos mineiros, inclusive porque têm muito a aprender com eles na política.

A comemoração do centenário de Tancredo em Belo Horizonte seria, na visão dos tucanos, uma oportunidade de Serra começar a se aproximar mais do eleitorado de Minas e tentar aplacar os ânimos que vêm sendo bastante acirrados por iniciativa dos correligionários do governador mineiro.

O editorial do jornal Estado de Minas de ontem, sob o título Minas a reboque, não!, vocaliza essas queixas. Acusa os dirigentes do PSDB de querer impor um papel subalterno ao Estado, "só para injetar ânimo e simpatia à chapa que insistem ser liderada pelo governador de São Paulo, José Serra".

Preocupados com a boataria de que Serra poderia desistir da candidatura à Presidência em decorrência do significativo crescimento da candidatura Dilma Rousseff nas pesquisas, os tucanos chegaram à conclusão de que nesta semana o governador precisaria fazer gestos que indicassem a confirmação, ou a desistência da candidatura, e pusessem fim às especulações.

O primeiro sinal foi dado na terça-feira, com o anúncio do afastamento de integrantes do governo que passariam a compor a equipe de campanha.

O segundo foi o discurso do Congresso, tido pelos correligionários como indicativo do tom a ser adotado na disputa com o PT, e o terceiro poderia ser dado hoje em Minas.

Havia esperança no PSDB de que Serra pudesse iniciar a abertura de um caminho que levasse Aécio ? hoje resistente ? a aceitar o lugar de vice na chapa tucana sem que pareça capitulação a um papel coadjuvante.



Contexto

O processo eleitoral está no seguinte pé: uma campanha liderada por um presidente forte com candidata fraca, contra um candidato forte de oposição sem campanha.

A questão a ser esclarecida no transcorrer da disputa é se vai prevalecer a competência da campanha ou a consistência dos candidatos como fator de convencimento do eleitorado.

Até agora tem prevalecido o quesito em que Lula é bamba, a agitação de palanque. A oposição argumenta que ele joga sozinho.

Mas joga porque, além das circunstâncias desigualmente favoráveis fornecidas pela combinação dos instrumentos de governo e total ausência de pudor no seu uso, seus adversários deixaram que jogasse.

Ativeram-se unicamente à própria estratégia de fazer tudo a seu tempo. É de se concordar que talvez não tivessem outro jeito, dada a falta de traquejo no ofício de se opor.

Isso, no entanto, não tira o mérito de Lula. Ele conseguiu antecipar o calendário. Deixou a agenda tão adequada à sua conveniência que, ao contrário de eleições passadas, quando antes de abril não se oficializava nada, exige-se o lançamento de candidatos três meses antes das convenções partidárias para a escolha de candidaturas.

Nesse aspecto, o presidente deu um baile no adversário, por ter conseguido atravessar o período em que a oposição foi franca favorita nas pesquisas, com pose de campeão.



Caso encerrado

Ou o DEM reivindica a vice na chapa do PSDB como forma de pressão sobre Aécio Neves aceitar ou resolveu esquecer o acordo firmado lá atrás com o tucanato. Uma terceira hipótese é que ande em busca de um assunto para se desviar de suas agruras.

Quando Gilberto Kassab foi escolhido vice de José Serra na Prefeitura de São Paulo, em 2004, o partido abriu mão da vaga na chapa presidencial em 2010 e assim ficaram combinadas ambas as partes.

Isso antes dos escândalos do DEM




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