O presidente Luiz Inácio da Silva pede calma aos correligionários
prometendo entrar em campo depois da Copa do Mundo para dar uma
"virada" na campanha de Dilma Rousseff e passa a ordem unida a
milhares de trabalhadores reunidos para comemorar o 1.º de Maio:
"Vocês sabem quem eu quero."
Não obstante o discurso ao molde de código para fugir à vigilância da
Justiça Eleitoral - em tempos distantes Lula nessa data afrontava a
durindana -, chama atenção nos dois atos descritos acima a
centralidade exclusiva que o presidente atribui ao seu papel no
resultado dessa eleição.
Substituindo-se à candidata e ao livre arbítrio de seus admiradores.
"Eu quero" tanto pode ter sido uma licença inadequada de linguagem
como uma manifestação até involuntária daquela viagem aludida por Ciro
Gomes quando, no auge da irritação por ter sido preterido sem aviso
prévio, disse que o presidente navegava "na maionese", se sentindo o
"todo-poderoso", capaz de simplesmente ungir sua escolhida.
Não há novidade no comportamento autorreferido do presidente Lula,
cujo bordão "nunca antes neste País" não só foi incorporado à cena
como, a julgar por seus altos índices de popularidade, é muito bem
aceito pela maioria.
Isso diz respeito a Lula e ao exercício de seus dois mandatos
presidenciais. Um sucesso de bilheteria, nem tanto de crítica, mas
questão vencida e resolvida.
O ponto em aberto passou a ser a sucessão. Como Lula escolheu disputar
de novo por intermédio de candidata sem histórico político, eleitoral
ou partidário, o problema posto inicialmente foi a sua capacidade de
transferir votos para Dilma Rousseff.
Lula precisou tomar a frente do processo a fim de transmitir ao
eleitor o recado de que era ela a escolhida. Fez isso durante dois
anos, desde fevereiro de 2008 quando do batizado da "mãe do PAC", e
conseguiu tirar Dilma de 2% para a casa de 30% de intenções de votos
nas pesquisas.
Não adianta discutir os métodos. Nessa altura trata-se de examinar os
fatos. E estes expõem o seguinte: a oposição à frente nas pesquisas,
com uma situação política mais favorável inicialmente, sem que isso
tenha tido reflexo comprovado nas intenções de voto. Ainda não saíram
novas pesquisas.
Portanto, a vantagem que se observa agora para a oposição pode ou não
ter ultrapassado do campo político para o terreno eleitoral.
Ou seja, o presidente se baseia na realidade quando pede que seus
correligionários não se deixem tomar pela ansiedade.
Conviria, porém, que ele também contivesse a ânsia do ego inflado e
deixasse algum espaço para que as qualidades de Dilma Rousseff
aparecessem.
Evidente que o presidente como principal arquiteto da própria sucessão
precisa ter papel ativo na campanha. O problema é a calibragem. Saber
o momento em que essa atividade ultrapassa o limite e passa a ser uma
arriscada hiperatividade.
Por exemplo, quando diz que depois da Copa do Mundo ele entra em campo
e tudo se resolve, Lula praticamente está dizendo que Dilma sozinha
não dá conta do recado.
Outro exemplo: no afã de ganhar terreno em relação ao adversário -
contrariando o apelo à serenidade - acaba criando oportunidades, como
aconteceu no 1.º de Maio, de a oposição recorrer à Justiça Eleitoral.
E é claro que o risco para o governo é sempre maior, porque se de um
lado em tese a posse da máquina pública possa favorecê-lo esse é um
fator que o deixa mais vulnerável nos julgamentos do Tribunal Superior
Eleitoral.
Esse tipo de contestação na fase atual, se aceita, no máximo rende
multa. Depois do início oficial da campanha pode significar cassação
do registro de candidaturas.
Além disso, há carência de celebração à candidata. Até agora não se
ouviu de Lula uma explanação séria e fundamentada sobre as razões
pelas quais os brasileiros deveriam escolher Dilma para presidir o
Brasil.
Seu último pronunciamento sobre isso foi artificial - "se eu soubesse
antes que ela era tão boa não teria sido candidato" -, quase jocoso.
Seria um bom começo: parar de falar de si, que deixará a Presidência e
logo será passado, e começar a falar dela que sinaliza uma
representação do futuro.