O ministro da Defesa, Nelson Jobim, acaba de renovar um clássico. “De onde menos se espera é que saem as melhores surpresas”, diz o ditado cujo sentido – de tão desmentido – já havia sido substituído pela versão mais esperta do Barão de Itararé, “de onde menos se espera é que não sai nada mesmo”.
Pois Jobim fez uma limpa na Infraero, deixou o PMDB aos berros e mostrou que não é bem assim.
Na última leva foram demitidos o irmão e a cunhada do líder do governo no Senado, Romero Jucá; a ex-mulher do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves; um sindicalista ligado ao PT; e um indicado pelo ex-presidente da Câmara, o petista Arlindo Chinaglia.
Realmente uma grata surpresa a ação na empresa administradora dos aeroportos. Não só porque se trata de uma rara atitude em prol da probidade nessa fisiológica República, como também por representar um ponto (positivo) fora da linha de impropriedades em série que nos últimos anos marcaram a atuação de Nelson Jobim
Em silêncio, distante da figura estridente que presidiu o Supremo Tribunal Federal querendo presidir o país, depois assumiu o Ministério da Defesa com pose de valente e fantasia de caçador, Jobim deu cabo de um bom combate ao executar o desmonte na Infraero.
Evidentemente, o mérito deve ser dividido com o presidente Luiz Inácio da Silva, cujo sinal verde foi indispensável para a extinção de um dos inúmeros aparelhos partidários da Esplanada e adjacências.
Aprovou-se um novo estatuto para a empresa que reduziu para 12 os cargos em comissão (hoje ainda são 109, mas já foram 240) e estabeleceu que, dos 5 diretores da Infraero, 4 terão de ser necessariamente funcionários de carreira.
A motivação, segundo alguns autores, foi a necessidade de arrumar a empresa para o processo de privatização dos aeroportos brasileiros. De acordo com outros mais descrentes da disposição do governo em executar mesmo esse plano, usou-se o pretexto e aproveitou-se o ensejo para esvaziar alguns cabides.
Tenha sido isso ou aquilo, o ato requer alguma celebração. Ainda que não represente uma revisão de critérios para o preenchimento de cargos, mesmo sendo a decisão pontual e com objetivo específico, possibilita a realização de um teste de resistência do governo à pressão de sua “base” partidária.
O PMDB pulou na frente. Esperneou, exigiu ser recebido pelo presidente Lula em palácio, pôs o presidente da Câmara na liderança da comitiva e marchou rumo ao Planalto para exigir seus “direitos”: a revisão das demissões ou compensações em outras áreas da administração federal.
Lula prometeu dar “um jeito”. Se não der – vale dizer, se não recuar ou não recompensar – o PMDB promete retaliar. Votar contra os “interesses do governo” no Legislativo.
Seria interessante assistir ao que aconteceria se o presidente resolvesse pagar para ver.
Refém da crise no Congresso, onde preside as duas Casas, até o pescoço, inseguro quanto ao cenário da sucessão de 2010, inquilino de um naco substantivo dos postos federais em todos os escalões e ocupante de governos estaduais absoluta e voluntariamente dependentes da boa relação com Lula, o PMDB tem muito pouco espaço para se mexer.
Ameaçará morder, inclusive para manter acesa a chama do mito da dependência, mas logo assoprará ante a realidade de que no quesito dependência manda quem pode. E por ora, pode mais quem detém a caneta e o controle do Diário Oficial: Luiz Inácio da Silva.
Lula precisa do apoio do PMDB para tentar eleger Dilma Rousseff ou para levar adiante um plano B? Certamente. Só que o PMDB precisa muito mais de Lula se quiser continuar de posse dos instrumentos que lhe asseguram a condição de maior legenda do país.
O partido sabe bem a diferença entre disputar eleições como aliado ou inimigo do poder. O festejado desempenho peemedebista nos pleitos municipais de 2008, por exemplo, guardou relação direta com a adesão total a Lula depois da reeleição em 2006.
Arriscaria seus projetos por meia dúzia de parentes demitidos da Infraero? Nem por força de decreto imperial. Por tão pouco anunciaria desde já adesão à candidatura da oposição? Nem por muito mais. Vai continuar onde está. No poder e ao mesmo tempo cortejado pelos oposicionistas, simplesmente porque não há razão para mudar.
Portanto, se o governo ceder será por pura vontade de viver de braço dado com o descaso.
Outro patamar
A crise no Congresso começa a deixar o terreno da política para se transformar em caso de polícia. Investigada pelo Ministério Público, a denúncia de que ex-diretores do Senado operavam esquemas de contratos com prestadores de serviços, se confirmada, guardará – em dimensão maior – semelhança com o caso de Severino Cavalcanti, obrigado a renunciar por ter recebido propina para renovar o contrato de um dos restaurantes que funcionavam na Câmara.