Ganância Merval Pereira
Política

Ganância Merval Pereira


O GLOBO

Ao definir como "ganância excessiva" do PMDB a tentativa de um grupo do partido, encabeçado pelo ministro Edison Lobão, de mudar a direção do fundo de pensão Real Grandeza, dos funcionários de Furnas, o presidente Lula usou uma palavra muito em moda desde que a crise econômica tornou-se explícita, em meados de setembro, com a quebra do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos. A frase "Greed is good" ("Ganância é bom") foi o lema dos especuladores financeiros dos anos 70 do século passado, e a ganância foi considerada pelo próprio presidente Barack Obama como um dos fortes motivos da crise econômica em que o mundo se debate.

Colocando a palavra na política brasileira, Lula estava revelando uma das razões da crise política que se arma como uma tempestade dentro de sua base aliada. A antecipação da campanha sucessória, articulada pelo próprio Lula com o objetivo de ter tempo para expor ao eleitorado sua escolhida, a ministra Dilma Rousseff, antecipou também a disputa pelos lugares de maior rentabilidade política na máquina do Estado, e PT e PMDB já se digladiam em público, sem pudores.

O castelo no interior de Minas Gerais tem 7.500 metros quadrados de área construída, 36 suítes, 18 salas, oito torres, 275 janelas, uma piscina com cascata, e está lá desde o início dos anos 90 do século passado, e pelo menos um presidente o visitou, Itamar Franco, em 1993.

O casarão de 900 metros quadrados de área construída está no Lago do Paranoá há 13 anos, e são incontáveis as autoridades da República que já estiveram lá.

Por que então somente agora o deputado federal Edmar Moreira e o diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, perderam suas imunidades e acabaram tendo que renunciar aos cargos poderosos que ocupavam, e o deputado, além da Corregedoria, pode também perder o mandato que exerce com eleições consecutivas há anos?

No caso de Agaciel, é surpreendente que nunca houvesse causado espanto a suntuosidade de sua casa, que a certeza da impunidade permitiu até o exibicionismo de mandar fazer uma piscina em forma de taça, assim como, pelas mesmas razões - exibicionismo e impunidade -, um presidente do Banco do Brasil mandou fazer, durante a ditadura, uma piscina em forma de J, primeira letra de seu sobrenome.

Já o deputado Edmar Moreira teve a petulância de disputar um cargo que lhe traria junto a função de eventualmente julgar seus pares, só para avisar que ele não julgaria ninguém pelo defeito da amizade.

A exposição pública dos dois não significa, porém, que a impunidade tenha acabado. Há, sim, um momento favorável à contenção dos "gananciosos", embora eles ainda tenham arrogância suficiente para tentar chantagear seus opositores com ameaças de CPIs.

A dos fundos de pensão, proposta pelo deputado Eduardo Cunha, do PMDB do Rio, é exemplar dessa postura desabrida de quem não teme uma punição, mesmo depois de ter tido sua manobra de tomar de assalto o fundo Real Grandeza frustrada pelo clamor público.

Cunha chega ao desplante de se dirigir indiretamente ao presidente da República, que criticara a "ganância" do PMDB, dizendo que a CPI iria mostrar "de quem é a ganância", a predizer uma briga de foice com o PT.

Todos esses desafios à sociedade acontecem porque, no diagnóstico perfeito do senador Pedro Simon, as pessoas envolvidas se sentem protegidas de uma punição. Esse mesmo deputado Eduardo Cunha já havia chantageado o governo com a CPMF, forçando a nomeação do ex-prefeito do Rio de Janeiro Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas, já de olho no controle do fundo de pensão.

Mas ele, assim como outros envolvidos em denúncias, não agiria de maneira tão aberta se seu partido, o inefável PMDB, não lhe desse suporte político, nomeando-o para dirigir comissões parlamentares que lidam com assuntos prioritários para o governo.

Assim como nomeia, o PMDB retira de comissões parlamentares os que não combinam com sua maneira de fazer política, como foi agora o caso do senador Jarbas Vasconcelos, destituído da Comissão de Constituição e Justiça do Senado depois de ter feito críticas ao espírito corrupto que domina o seu partido.

Sem coragem de promover um processo de expulsão de um dos senadores mais respeitados do país, e fundador do MDB, os que manobram o partido hoje em dia, como o senador Renan Calheiros, retaliam com o que sabem fazer de melhor, a pequena política.

Esse ambiente político, amortecido pelo fisiologismo e apodrecido pelo exercício do poder, sem outros objetivos que o controle do Estado para benefícios próprios, favorece o surgimento de aproveitadores de toda sorte, e não serve à formação de uma sociedade igualitária e justa.

O próprio presidente Lula, nos tempos em que o assunto ainda mobilizava suas energias políticas e era uma das bandeiras do PT, no programa de governo na campanha de 2002, coincidia no diagnóstico da situação quando apontava que a "prática de corruptos e corruptores na esfera do poder se dissemina pela sociedade, como exemplo negativo que vem de cima".

A situação, dizia Lula, exigia "uma intervenção enérgica pelo fim da impunidade" e requeria "ampla ação cultural educativa pela afirmação dos valores republicanos e democráticos em nossa vida política".

O trecho foi repetido ontem da tribuna do Senado pelo senador Jarbas Vasconcelos. Mas ele faz parte do passado pré-mensalão, que levou de roldão a fama de ético do PT e trouxe para dentro do governo o PMDB.



loading...

- Pmdb, Um Estorvo? Merval Pereira
O GLOBO O ano político começou bem, com a comprovação de que não caíram no esquecimento provocado pelo carnaval as denúncias do senador Jarbas Vasconcelos contra a corrupção que domina a política brasileira, que tem no seu partido, o PMDB,...

- Molecagem Em Furnas Suely Caldas
ESTADO DE S. PAULO Molecagem é a palavra certa para definir o papelão da direção de Furnas Centrais Elétricas ao publicar nos jornais, na quarta-feira, comunicado, pago com dinheiro da estatal, com informações falsas que tentam desqualificar...

- E LobÃo Ainda É Ministro
EDITORIAL O ESTADO DE S. PAULO 28/2/2009 Fossem outros os tempos e os homens, o senador Edison Lobão (PMDB) teria se demitido do cargo de ministro de Minas e Energia no instante mesmo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desautorizou expressamente...

- Real Baixeza Dora Kramer
O ESTADO DE S. PAULO A retirada da proposta de substituição de diretores da Fundação Real Grandeza abafa, mas não resolve esse obscuro caso do fundo de pensão dos funcionários de Furnas. Por um triz não se deflagra uma greve inusitada e potencialmente...

- Em Furnas, O Carnaval Começa Na Quinta Elio Gaspari
Nosso Guia, com sua trajetória de sindicalista; a ministra Dilma Rousseff, com seu currículo no setor de energia, e o senador Jarbas Vasconcelos, com as credenciais de caçador de malandros, deveriam marcar um encontro para as 14h de quinta-feira na...



Política








.