Governo e BNDES recuam EDITORIAL
Política

Governo e BNDES recuam EDITORIAL


 O Estado de S.Paulo - 02/07/11
Depois de elogiar enfaticamente o projeto de fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour, o governo decidiu ser mais cauteloso nas manifestações de apoio ao negócio. A presidente Dilma Rousseff e seus assessores parecem haver percebido mais claramente o perigo de se envolver numa transação desse tipo - sujeita à disputa judicial e à contestação pelos órgãos de defesa da concorrência. Está em jogo muito mais que os R$ 3,9 bilhões da possível participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nessa operação. Um erro de avaliação poderá lançar o governo em sérias dificuldades legais e impor um alto custo político à presidente.

A decisão de agir com maior prudência está claramente refletida em uma "nota de esclarecimento" publicada pelo BNDES. A nota, divulgada na quinta-feira, enfatiza dois pontos: 1) a fusão deve ocorrer por meio de uma oferta "não hostil" e ser aprovada por todas as partes envolvidas; 2) o banco "reitera seu compromisso com a estrita observância das leis e dos contratos". Em outras palavras, o BNDES condiciona sua participação no negócio a um prévio entendimento entre o empresário Abilio Diniz e o Grupo Casino, seu atual sócio francês no Grupo Pão de Açúcar. Dirigentes do Casino acusam Diniz de violar o acordo de associação e de agir ilegalmente ao negociar a fusão com o Carrefour. A segunda condição mencionada no texto da nota do BNDES é uma alusão a este conflito. Segundo o Grupo Casino, o sócio brasileiro fere uma regra estabelecida na constituição da Wilkes, a holding controladora do Pão de Açúcar. Nenhuma das partes, alegam os sócios franceses, poderia negociar um acordo com potencial para afetar o controle da companhia brasileira. Advogados do grupo francês levaram esse lembrete ao BNDES.

O banco havia divulgado na terça-feira um primeiro comunicado sobre seu possível envolvimento na fusão. Segundo o informe, o BNDES havia enquadrado para análise uma operação equivalente a até 2 bilhões, "relativa ao projeto de internacionalização do Grupo Pão de Açúcar". No fim do comunicado havia apenas uma breve referência aos demais participantes: "A operação também deverá ser aprovada pelas demais companhias envolvidas". Apenas dois dias depois a diretoria do banco achou conveniente divulgar a "nota de esclarecimento", para afirmar seu cuidado com "a estrita observância das leis e dos contratos".

Dirigentes do BNDES e autoridades do primeiro escalão do Executivo cometeram indisfarçável imprudência ao apoiar a fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour. Deixaram-se envolver antes de avaliar com um mínimo de serenidade e bom senso as implicações do negócio. Como não dispunham de argumentos sensatos para defender a operação, expuseram-se ao ridículo com alegações absurdas e tolas. A mais espantosa foi apresentada pela ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. Não seria, segundo ela, usado dinheiro público na transação, como se o BNDES e o BNDESPar, seu braço de investimentos, trabalhassem com recursos privados.

Falta saber se o governo decidiu fazer apenas um recuo tático, diante da péssima repercussão do negócio, ou se passará de fato a avaliar com mais cuidado o seu envolvimento na fusão dos dois gigantes do varejo. Nenhuma autoridade precisará de muito esforço para perceber as contraindicações: nada justifica o envolvimento do poder público num negócio tipicamente privado e sujeito a importantes complicações legais. Menos ainda se justifica a intromissão do Palácio do Planalto, por meio de um banco público, para defender os interesses estritamente particulares de um empresário brasileiro.

Mas a presidente Dilma Rousseff deveria aproveitar a oportunidade para uma revisão geral dos critérios seguidos pelo BNDES nos últimos anos. O banco tomou rumo perigoso, aplicando somas enormes em empreendimentos sem real valor estratégico para o Brasil, apoiando estatais e outras grandes empresas capazes de levantar financiamentos no mercado e funcionando como instrumento de centralização do poder econômico. As melhores e mais ambiciosas intenções da presidente Dilma Rousseff jamais serão satisfeitas com essa política.



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