Honduras A busca de uma saída para a crise
Política

Honduras A busca de uma saída para a crise


O risco do neogolpista

A crise em Honduras é prova de que a América Latina 
aprendeu a lidar com os golpistas clássicos. Resta saber 
como impedir os populistas de solapar a democracia


Thomaz Favaro

Fotos Jose Cabezas/ AFP e AFP
SÓ FALTA CONVENCER OS HONDURENHOS
À direita, o presidente deposto Zelaya conversa com o costa-riquenho Oscar Arias em busca de uma 
solução negociada para o conflito. À esquerda, manifestação contra o presidente deposto em Honduras


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A condenação rápida e uníssona à deposição do presidente Manuel Zelaya, de Honduras, comprova o repúdio latino-americano aos golpes de estado. Ninguém deve mesmo apoiar golpes militares contra um presidente eleito. As sanções orquestradas por governos e instituições multinacionais, como a Organização dos Estados Americanos, encurralaram os golpistas e abriram caminho para a busca de uma solução negociada para a crise hondurenha. As conversações começaram na quinta-feira passada, com a mediação do presidente da Costa Rica, o Nobel da Paz Oscar Arias. A América Latina é hoje um continente democrático. Com exceção de Cuba, todos os países da região elegeram seus governantes em votação livre. Três décadas atrás, apenas Colômbia, Costa Rica e Venezuela tinham esse privilégio. O golpe em Honduras é um inédito golpe de estado bem-sucedido nas últimas duas décadas. Uma quartelada chegou a depor Chávez, em 2002, mas os golpistas resistiram apenas dois dias.

Esse cenário não significa, infelizmente, que a democracia esteja segura no continente. "As instituições latino-americanas ainda são, em sua maioria, muito frágeis", disse a VEJA o americano Jake Dizard, da Freedom House, instituição que monitora a situação da democracia no mundo. "Isso permite aos caudilhos usar as ferramentas da democracia para solapar a democracia." Os golpistas de hoje preferem a mobilização populista e os plebiscitos. O método foi aperfeiçoado por Hugo Chávez e utilizado por seguidores em outros países. O hondurenho Zelaya aliou-se ao presidente venezuelano e pretendeu aplicar a metodologia chavista em um ambiente pouco apropriado. Ele tentou mudar a Constituição e prolongar o próprio mandato mesmo sem ter apoio popular para tal aventura. Ao depor o presidente, o Exército contou com o respaldo da Suprema Corte, do Legislativo e da maioria dos hondurenhos. Isso naturalmente não justifica a deposição. Deve-se sempre procurar uma saída institucional, mesmo que o presidente conspire contra a democracia.

A mais sangrenta tentativa de golpe militar das últimas duas décadas foi comandada por Hugo Chávez, quando ele era coronel paraquedista, em 1992. A quartelada contra um presidente eleito acabou com 97 mortos e Chávez na prisão. O fracasso o fez mudar a estratégia para alcançar o poder absoluto. Ele foi eleito num momento de crise econômica e desmoralização dos partidos tradicionais da Venezuela. Logo tirou proveito de sua popularidade para convocar sucessivos plebiscitos que o autorizaram a modificar a Constituição e controlar o Congresso e o Judiciário. Sem o freio de poderes independentes, ele viu-se à vontade para governar a Venezuela como se o país fosse sua fazenda.

A tática do uso do voto para arruinar a democracia tem tido sucesso também na Bolívia e no Equador – mas nesses países o processo ainda não está completo. O equatoriano Rafael Correa convocou uma Assembleia Constituinte com o intuito de se perpetuar no poder, mas foi obrigado a desistir da reeleição indefinida para conseguir aprovar a nova Carta. "As mudanças na Constituição com o objetivo de ampliar o poder dos governantes são perniciosas, pois minam a credibilidade da democracia e abrem espaço para a perpetuação da corrupção no governo", diz o argentino Gabriel Negretto, do Centro de Pesquisas e Docência Econômicas do México.

Isoladamente as urnas não são um sinônimo de democracia. O sistema democrático pressupõe também a existência de instituições independentes, respeito aos direitos individuais e, como característica principal, a alternância no poder. Muitas ditaduras promovem eleições para dar uma demão de legitimidade ao regime. Na Cuba dos irmãos Castro, os parlamentares são "eleitos": mas só concorrem 614 candidatos para 614 cadeiras da Assembleia. Todos eles previamente escolhidos pelo Partido Comunista. Chávez e seus discípulos escolheram a ferramenta dos plebiscitos para tirar proveito da péssima reputação dos políticos. Apenas 20% dos latino-americanos confiam nos partidos políticos e 27% no Legislativo de seu país. Nos discursos populistas, as consultas populares são apresentadas como uma forma superior de democracia. Não são. A chamada democracia direta, aquela que passa por cima das instituições, é um bem conhecido instrumento de manipulação do eleitor.




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