Obama: combinação de pragmatismo e pacifismo
Política

Obama: combinação de pragmatismo e pacifismo


O mundo como ele é

Ao receber o Nobel da Paz, Obama faz um discurso bem equilibrado
entre pacifismo e pragmatismo, e acaba apresentando ali, justo ali,
sua melhor defesa da guerra


André Petry, de Nova York

Thomas Peter/Reuters

"Dizer que a força
às vezes se faz necessária
é um reconhecimento
da imperfeição do homem
e dos limites da razão"
GUERRA 44 x 33 PAZ
Obama, em Oslo, na premiação: sim, somos todos imperfeitos

Barack Obama é o comandante em chefe da maior força militar do planeta, está no meio de duas guerras, acaba de tomar a decisão de despachar mais 30 000 soldados para uma delas e, na semana passada, recebeu talvez o prêmio mais improvável para alguém na sua posição – o Nobel da Paz. Mas, num discurso de 36 minutos, enfrentou com competência a aparente ambiguidade da situação. Falou mais a palavra "guerra" (44 vezes) do que a palavra "paz" (33), porém apresentou à plateia uma peça de oratória honesta, com um delicado equilíbrio entre pacifismo (recomendável para quem ganha um Nobel da Paz) e pragmatismo (indispensável para um chefe de estado). No trecho mais ilustrativo, Obama lembrou as palavras radicalmente pacifistas de Martin Luther King Jr., ditas na mesma tribuna quando recebeu o Nobel, em 1964, e reconheceu que só estava ali em função da vitoriosa luta do ativista contra a segregação racial nos EUA. Disse: "Sou uma testemunha viva da força moral da não violência".

Em seguida, pragmaticamente, afirmou que, como chefe de estado, não podia se guiar apenas pelo exemplo de heróis pacifistas, como Luther King ou Mahatma Gandhi: "Encaro o mundo como ele é, e não posso ficar indiferente diante das ameaças contra o povo americano. Não nos enganemos: o mal existe. Um movimento não violento não teria barrado os exércitos de Hitler. Negociações não convencem líderes da Al Qaeda a deitar armas. Dizer que a força às vezes se faz necessária não é um chamamento ao cinismo – é um reconhecimento da história, da imperfeição do homem e dos limites da razão". Em outro trecho, voltou a lidar com as tensões milenares entre guerra e paz: "Sim, os instrumentos da guerra têm um papel na preservação da paz. E, no entanto, essa verdade coexiste com outra – a de que a guerra, por mais justificada que seja, é sempre uma promessa de tragédia humana".

Ao contemplar o fato de que comanda duas guerras simultâneas, Obama defendeu o conceito de "guerra justa". Fez menção rápida e envergonhada ao conflito no Iraque, mas insistiu na guerra no Afeganistão, para a qual autorizou o envio de novas tropas. Disse que os EUA não buscaram o conflito – que se tornou necessário e moralmente justificável. Lembrou a importância vital de combater o terrorismo e concluiu afirmando que "guerra santa" nunca é "guerra justa", seja ela promovida por extremistas islâmicos ou cruzados cristãos. A plateia foi econômica nos aplausos, sugerindo que talvez preferisse mais bandeira branca e menos chumbo grosso. Mas o fato é que ali, justamente na cerimônia de entrega do Nobel da Paz, Obama acabou fazendo sua melhor defesa da guerra. Se ajudar a trazer a paz, não terá sido em vão.




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