Política
Onda azul CESAR MAIA
FOLHA DE SÃO PAULO - 21/05/11
No Brasil, ignora-se a geopolítica. Portugal, o Império e o início da República resolveram nossas questões de fronteiras. A vertical do Tratado de Tordesilhas (1494) partia da Ilha de Marajó e excluía do Brasil colonial parte do Sudeste, o Sul, o Centro-Oeste e a Amazônia. Os limites foram empurrados para o oeste.
Dom João 6º ocupou a Guiana e a Província Cisplatina, defendendo as fronteiras. Depois, os Estados-tampão eliminaram riscos, ao norte e ao sul. O Império impediu aventuras internas (o fatiamento territorial) e externas. Neste caso, inibindo o Paraguai e absorvendo fronteiras naturais com a Bolívia. Em 1903, a República comprou o Acre. Foi um processo de ocupação por brasileiros, desde o Império.
Pesquisas de opinião mostram que o fator espacial fala mais alto. Qualquer georreferenciamento mostra isso. Basta ver o mapa eleitoral do Brasil. Não há salpicamento de pontos de opinião, mas manchas sub-regionais.
A geopolítica sempre esteve à frente das diplomacias otomana, britânica, russa, alemã, francesa, americana, num efeito dominó. Vide agora as rebeliões no norte da África.
O desenho da América do Sul mudou desde 1879, com a Guerra do Pacífico (com o Chile triplicando seu território ao avançar sobre o Peru e a Bolívia), a divisão da Patagônia chilena por pressão argentina, até a Guerra do Chaco, entre a Bolívia e o Paraguai (este ampliou seu território em 87%).
Os conflitos armados de fronteira entre o Peru e o Equador só foram resolvidos no final dos anos 90. As demandas da Bolívia, por uma saída ao mar, e do Peru, pela linha de fronteira marítima, com o Chile estão pendentes.
Desde a crise econômica de 1997-98, entrou e cresceu a onda vermelha na América Latina, partindo da Venezuela e avançando por Equador, Bolívia, Nicarágua, Honduras (obstruída), Argentina e Brasil -neste último, mitigada pelo mensalão em 2005 e pela ascensão sindical na direção do PT. Tal onda está desbotando.
Agora há uma nítida e crescente onda azul. São exemplos a vitória de Sebastián Piñera no Chile, de Ricardo Martinelli no Panamá, a virada de Juan Manuel Santos na Colômbia, a vitória nominal da oposição em 2010 na Venezuela, o empate no plebiscito equatoriano em 2011, o crescimento de Keiko Fujimori no Peru, a impopularidade de Evo Morales na Bolívia, o aumento do voto conservador no Brasil e a "amebização" do Congresso, bem como as expectativas eleitorais desse ano na Guatemala e na Nicarágua.
Mas a política brasileira ignora a geopolítica, o que abre espaços para o chavismo presente no governo federal. Espera-se que a eleição de deputados para o Parlasul (Parlamento do Mercosul) coloque na ordem do dia do debate público brasileiro a geopolítica na América Latina.
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