Política
Ponto crítico Miriam Leitão
O GLOBO
Aqui vão algumas frases que nos ajudam a pensar neste domingo, dia de olhar por outro ângulo esta onipresente crise. "O sucesso mascara as vulnerabilidades", disse Michael Porter, professor de Harvard, guru da competitividade. Para ele, "houve um amolecimento geral" e isso porque "a economia ia bem, os mercados progrediam e mesmo quem tinha uma estratégia ruim era capaz de surfar a onda".
Consigo pensar em tantos exemplos que confirmam a frase acima que só a lista já completaria esta coluna. Ficando num exemplo distante: a Rússia se sentia tão poderosa que foi capaz de entrar numa aventura militar. Tinha reservas de quase US$600 bilhões, acumuladas pelo fluxo de capitais para o país, depois da crise de 1998, e pelas altas do preço do petróleo. Desde o ano passado, o país enfrenta uma forte fuga de capitais, queimou bilhões de dólares tentando segurar o rublo e uma das hipóteses é impor controle de capitais.
No mercado financeiro, jovens com alta performance, em ativos exóticos, garantiam que o risco havia acabado e que, contrariando a lei da gravidade, as ações brasileiras só subiriam. Em política econômica, qualquer insensato era gênio. Na Venezuela, Hugo Chávez encampava multinacionais, rasgava contratos e estatizava empresas de adversários, mas o risco Venezuela caía. No Brasil, o governo estava convencido... deixa pra lá, como diria Ancelmo Gois. Segundo Porter, "entramos num período de limpeza, um momento de repensar tudo e voltar ao básico".
"A crise é uma oportunidade boa demais para ser perdida", disse Michael Silverstein, vice-presidente do Boston Consulting Group. Esqueça aquela velha conversa do ideograma chinês, tão batida. Crise, às vezes, é risco puro. Mas, como em qualquer situação, algumas portas se abrem. Só que escolher por qual delas entrar é mais perigoso.
Empresa tímida demais ficará num comportamento defensivo e pode perder mercado e competitividade. Quem tiver um comportamento aventureiro e desconhecer os riscos extremos de um momento tão fluido pode acabar saindo do mercado. Esse é o dilema que vai presidir o dia a dia das empresas nos próximos meses. O ponto ideal de equilíbrio é o de assumir riscos, sim, mas bem medidos e pesados.
Dirk Buchta, diretor da A.T. Kearney no Oriente Médio, lembra que a primeira iniciativa de qualquer empresa quando quer cortar custos é demitir funcionários. Ele alerta que nem sempre é a melhor solução. Aconselha "focar em fatores internos para garantir o crescimento lucrativo". Tudo o que uma empresa fizer, deve fazer da melhor forma que puder. A frase dele é: "Na crise, o nome do jogo é eficiência."
Melhor que a frase de Dirk Buchta é a do diretor geral da Marcopolo, José Rubens de la Rosa, sobre a qual falei aqui algumas colunas atrás. Ele chamou a equipe e disse que não pode haver erro algum. "Estamos na floresta e os animais estão nos ameaçando." A imagem pode não ser ecologicamente correta, mas trabalhar com senso de urgência, e em busca do erro zero, é um bom lema para as empresas que quiserem se fortalecer nesta turbulência.
"A crise é, na verdade, o momento de clarear a mente sobre nossas estratégias", diz Richard Rumelt, professor da Anderson School of Management, da Universidade da Califórnia. Só mesmo nas crises é que as organizações se dedicam ao saudável exercício de parar para pensar e se perguntar em que direção estão indo. Nos momentos de euforia, esses encontros das empresas são sempre autocongratulatórios.
Em geral, nos momentos de boom, quando são feitos os planejamentos estratégicos, a tendência é construir cenários como se o futuro fosse ser sempre igual ao presente. Quem construir o cenário de ruptura, com consequências extremamente negativas, será tratado com desprezo, a menos que registre o cenário com um percentual ínfimo de probabilidade. Assim, só para inglês ver.
Estratégia é mais do que uma apresentação de PowerPoint no data show em reuniões de fim de ano. Nas crises, ela vira uma questão de vida ou morte. "É preciso ter uma estratégia para a crise, mas estratégias são ineficazes sem implementação. A execução é tudo, atenção no dia a dia para os detalhes e aprender com os erros", explica Jeffrey Pfeffer, professor de Comportamento Organizacional da Universidade de Stanford.
As urgências são tantas numa crise que deixa de haver separação entre metas de curto e longo prazo. O futuro começa agora, no minuto seguinte. "Ao enfrentar uma crise, a experiência nos ensina que os passos para lidar com os problemas imediatos devem ser a base de uma estratégia de longo prazo", diz Michael Porter.
Os economistas costumam olhar com desprezo para os especialistas em administração, como os pesquisadores da ciência pura olham para os da ciência aplicada. Na verdade, ambos erraram nesta crise e deveriam, como disse Porter, "voltar ao básico".
Algumas grandes empresas brasileiras ou setores empresariais fortes não precisam perder tempo com nada do que foi dito acima. Basta pegar o próximo voo para Brasília e montar um bom lobby por uma ajuda governamental, um empréstimo subsidiado, uma venda salvadora de ações, uma rolagem de dívida em banco público, uma isenção tributária. Para dar certo a estratégia, basta dizer a certos ouvidos governamentais que o setor, ou a empresa, corre o risco extremo de ser comprado por multinacionais e desnacionalizado. Isso abre portas, ou melhor, cofres, em Brasília.
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