Faz sentido rever os índices de correção das dívidas estaduais; se ceder demais na barganha, Planalto pode comprometer contas públicas
Será imprudência se a disposição do governo federal de renegociar a dívida dos Estados com a União conduzir à rediscussão de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal além daqueles que tratem da correção do valor dos passivos estaduais.
As tratativas tampouco podem liberar os Estados dos compromissos assumidos quando transferiram imensos débitos para a União, entre 1997 e 1999. Tais acordos, afinal, têm permitido um relativo controle do endividamento do setor público brasileiro.
O governo federal propõe que a composição de taxas de juros e correção monetária incidente sobre as dívidas estaduais não ultrapasse, de agora em diante, o teto da Selic, a taxa básica do sistema financeiro. A mudança, hoje, beneficiaria ligeiramente os Estados. Até aqui, a dívida era corrigida pelo IGP-DI, um índice de inflação, mais juros de 6% ou 7,5% ao ano.
A renegociação demandaria a mudança do artigo 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal, de 1997. Implicaria, ainda, revisão da lei de renegociação da dívida dos Estados, também de 1997.
Como contrapartida dessa arriscada repactuação, o governo federal demanda o fim de parte da guerra fiscal, proposta que, na prática, foi recusada pelos Estados.
É oportuno lembrar que o refinanciamento da dívida dos Estados não foi um processo de expropriação. A União assumiu quase 80% dos débitos estaduais em 1998. As taxas de juros da renegociação foram muito subsidiadas. Os Estados, quase falidos, passaram a apresentar superavit primários, contribuindo para o controle da dívida total do setor público.
A renegociação devolveu ao governo federal o controle da política macroeconômica, antes solapada também pelo endividamento estadual ilimitado. De 2001 a 2011, a dívida estadual baixaria de 18% para cerca de 11% do PIB.
A situação econômica mudou desde então. As taxas de juros caíram. Parece razoável rever itens como a correção dos débitos estaduais, mas não mais que isso.
Muito menos devem-se admitir pleitos por abrandamento do controle de despesas, aumento do gasto da União ou vantagens em outras searas, como a divisão do Fundo de Participação dos Estados e dos royalties do petróleo. O governo não deve aproveitar-se da ocasião para distribuir facilidades.
Ressalte-se ainda que a renegociação pode implicar gastos maiores nos Estados e, pois, superavit primários menores no setor público, os quais teriam de ser compensados pelo governo central.
Só se admite revisão se for circunscrita. Dado o risco político e financeiro, os Estados precisam oferecer contrapartidas, como o controle da guerra fiscal.