Tsunami de palavras - EDITORIAL O ESTADÃO
Política

Tsunami de palavras - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 06/03/12



A presidente Dilma Rousseff tem fortes motivos para se preocupar com a enxurrada de euros, dólares e libras lançada nos mercados por três dos maiores bancos centrais do mundo rico. Essa inundação de moeda - tsunami, segundo ela - é realmente prejudicial ao Brasil e a outras economias em desenvolvimento. Mas nenhum problema será resolvido com sua peroração contra as políticas fiscal e monetária adotadas para combater a crise nos Estados Unidos, na zona do euro e no Reino Unido. A presidente exibe uma evidente inclinação para um velho esporte latino-americano - atribuir aos outros toda a responsabilidade por seus infortúnios e fazer muito menos que o necessário e possível para corrigir as próprias deficiências. Ela tem um motivo legítimo para preocupação, mas os brasileiros têm dois: o efeito cambial da inundação monetária e a pouca disposição do governo para cuidar seriamente dos problemas internos de competitividade.

A chanceler alemã Angela Merkel prometeu e já deve ter explicado à presidente brasileira a estratégia europeia de combate à crise, determinada em grande parte pelos políticos da Alemanha. Essa estratégia inclui um forte aperto fiscal na maior parte dos países, porque quase todos enfrentam graves desajustes orçamentários e têm pouco espaço para aumentar seus gastos. De fato, até poderiam gastar um pouco mais e aumentar o estímulo fiscal à recuperação, como propõem as autoridades brasileiras, mas isso os líderes alemães não aceitam. A crise tem sido atenuada pela expansão monetária promovida pelo Banco Central Europeu (BCE), formalmente autônomo em relação aos governos da zona do euro. O dinheiro emitido para operações de socorro - cerca de 1 trilhão só a partir de dezembro - tem dado algum alívio aos Tesouros e alguma segurança adicional aos bancos.

Ontem, um repórter perguntou à presidente Dilma Rousseff, na Alemanha, se, ao se queixar à chanceler alemã, o governo brasileiro não estaria sugerindo uma intervenção na política, legalmente autônoma, do BCE. "Não" respondeu a presidente, "e sabe por quê? Por que estão interferindo na nossa." Não está claro se ela entendeu a pergunta, mas pelo menos quanto a um ponto não há dúvida: sua resposta indica uma confusão entre fatos muito diferentes.

Qualquer decisão econômica tomada num grande país ou bloco importante pode afetar positiva ou negativamente a economia de outros países, sem, no entanto, violar sua autonomia. Brasília não violou a autonomia argentina, quando sancionou a desvalorização do real em janeiro de 1999. Foi uma ação direta sobre o câmbio. No caso da enxurrada de euros, o efeito cambial é indireto. Tampouco se pode atribuir aos dirigentes do BCE a intenção de mexer indiretamente no mercado cambial ou de criar uma barreira protecionista - acusação formulada pela presidente brasileira. Ao contrário do BCE e do Federal Reserve, dos Estados Unidos, o governo chinês tem uma clara política de subvalorização cambial, muito raramente citada pelo governo brasileiro.

Políticas cambiais pertencem, ainda, à jurisdição exclusiva de cada país, embora afetem diretamente as trocas internacionais. Mas o assunto, apesar do justificável empenho brasileiro, continua fora da pauta oficial da Organização Mundial do Comércio (OMC). Muito menos sujeita ao controle externo é a política monetária, e há excelentes razões para isso. O governo brasileiro não deveria esquecer esse fato.

As autoridades de Brasília, podem, no entanto, fazer muito, internamente, para tornar a empresa nacional mais eficiente e mais capaz de competir. Poderia ir muito além das ações defensivas, incluídas nesse conjunto as medidas de controle do fluxo de capitais. Antes das novas ações do BCE já se esperava um ano ruim para as exportações. Projeções do Banco Central do Brasil divulgadas em dezembro já indicavam uma grande redução do superávit comercial.

A expectativa de crescimento recém-anunciada pelo governo da China - 7,5%, depois de muitos anos com taxas entre 9% e 10% - reforça os motivos de preocupação, mas não traz novidade radical. Apenas confirma a inércia do governo brasileiro diante das ineficiências e custos excessivos da economia nacional.



loading...

- Sem Solução Para A Crise - Celso Ming
O Estado de S.Paulo - 09/10As novas projeções sobre o desempenho da economia global que acabam de ser divulgadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) são bem mais pessimistas (veja tabela). Em vez de ceder, a crise tende a se aprofundar, sem sinais...

- Faroeste Cambial - Celso Ming
O Estado de S.Paulo - 30/08Ontem, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, passou recado de reconhecida gravidade no site do jornal alemão Die Zeit. Disse que a política de juros do BCE, única para o euro, já não alcança toda a...

- O Esperneio Presidencial Celso Ming
O Estado de S. Paulo - 06/03/2012  É compreensível o esperneio da presidente Dilma quando denuncia o estrago sobre o câmbio do Brasil ocasionado pelo enorme despejo de moeda por parte dos grandes bancos centrais. Nesta segunda-feira, em sua viagem...

- Agora, é Surfar No Tsunami - Alberto Tamer
O Estado de S.Paulo - 04/03/12 O Banco Central Europeu (BCE) injetou mais 530 bilhões no sistema financeiro e todo mundo no Brasil se assustou. Os euros, convertidos em reais, serão aplicados aqui, onde juros elevados, equilíbrio fiscal...

- Uma Lição Na Ata Do Copom Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo - 14/09/11 Certo ou errado, o corte de juros anunciado há duas semanas pelo Banco Central (BC) foi pelo menos apresentado numa embalagem com o desenho correto. O governo está empenhado em arrumar as contas públicas e isso abre espaço...



Política








.