Uma História Não Contada
Política

Uma História Não Contada


Vai chegando o 7 de Setembro, e é hora de contar uma história que pouquíssimas pessoas conhecem. Uma história passada em 1987, onde mais de 300 pessoas, entre eles punks, anarquistas e skatistas sofreram uma das maiores repressões da história deste país, numa manifestação antimilitarista em São Paulo.

Mas antes de entrar nessa história. Vamos contar como surgiu essas manifestações antimilitaristas no 7 de setembro, dia da ?Independência do Brasil?, onde acontecem desfiles militares por todo o país.

O primeiro ato antimilitarista nessa data aconteceu em Brasília, em 1986, durante o desfile de 10 mil soldados, armamentos bélicos e politicagem em geral, em frente ao palanque do então presidente da república, o bigodudo José Sarney. Um grupo de anarquistas, punks e carecas, notadamente de São Paulo e Brasília, juntos, ergueram uma faixa, que dizia ?Mais Armas, Mais Fome?, além de bandeiras negras, e palavras de ordem gritadas.

Com o enorme aparato de repressão, fardados ou à paisana, não demorou muito para o ?pau comer?. Faixas, bandeiras e folhetos foram recolhidos pelos esbirros. Só não aconteceram prisões pelo receio do governo temer um tumulto generalizado.

Apesar da intimidação, os libertários continuaram protestando aos gritos, que se perdiam no meio da multidão.

E assim começa a história dos atos antimilitaristas nessa data ?cívica?, se espalhando rapidamente por várias cidades do Brasil.

300 libertários presos e torturados em São Paulo

Agora estamos em 1987. Em São Paulo, resolvemos organizar um ato antimilitarista no dia do desfile militar, para dar continuação ao ato de Brasília. Quem estava puxando o protesto éramos nós, do Coletivo Libertário, que tinha participado da mani de BSB. Nessa época atuava nesse grupo, que era um dos mais ativos do Brasil.

Na verdade, o ato que tínhamos organizado era contra o armamentismo e contra a miséria existente no país. Tratava-se de uma manifestação pacifica, isto estava bem explicito nos cartazes e folhetos que confeccionamos, pois já temíamos a repressão.

Bem, dias antes do ato, o folheto de convocação da mani caiu nas mãos do Redson, do Cólera, uma banda punk, que tinha um programa na rádio 89 FM, com bastante audiência. Nesse período, o movimento punk numericamente tinha uma força, as bandas punks tocavam em algumas rádios, existia uma agitação punk, o skate estava na moda... Dizem que foi o segundo ?boom? punk no Brasil.

Enfim...

O Redson, que tinha um perfil pacifista, gostou do texto, e leu na rádio, dando todas as dicas, local de concentração etc. Tínhamos marcado a concentração na estação Ponte Pequena do metrô. Não deu outra, no dia do ato, apareceram centenas de punks, libertários, skatistas. Mas também a polícia, que armou um dos maiores cercos repressivos aos libertários na história desse país. Nunca tinha visto algo igual. Praticamente em todas as estações do metrô tinha um grupo de policiais detendo pessoas com visual punk.

Eu, por sorte, não fui pego, pois não andava de visual. Porém, se fosse estaria frito, já que as faixas e folhetos para serem distribuídos na mani estavam comigo. Mas eu vi companheiros ficarem nus em praça pública para averiguação.

Os punks nem desciam do metrô e já eram jogados em caminhões da Polícia Militar, amarrados e levados para alguma delegacia. Nessas delegacias eram agredidos, torturados, tinham seus moicanos cortados. Eram obrigados a fazer a limpeza das delegacias, mulheres eram assediadas por policiais. Foi um horror! Só depois de muitas horas de humilhações que o pessoal foi solto. Mas alguns punks, como o punk Revolta, ficaram dias presos, sem sabermos onde estava detido.

Foi uma loucura, pois não tínhamos nenhuma estrutura de advogados, contatos... Foi desesperador não fazer nada, só esperar o tempo passar para que os companheiros fossem soltos. A manifestação mesmo nem aconteceu.

Moésio Rebouças

Folheto de convocação do ato

A consciência dos brasileiros fica suja ao permitir que no nosso país sejam feitos desfiles enaltecendo o desenvolvimento enaltecendo o desenvolvimento bélico. Devemos nos envergonhar por sermos o 3º maior exportador de armamentos leves do planeta. Assim é que ajudamos a se manterem no poder ditadores que armam suas polícias contra seus povos.

Assim é que nos alimentamos de guerras fatricidas em outros países enquanto a fome e a miséria social se tornam realidades cada vez mais presentes entre nós.

Toda riqueza vem do trabalho! Deveríamos orientar nossa força produtiva comum ao desenvolvimento do individuo e da coletividade, ao invés disso, 85% do resultado de nosso esforço comum se dirige à indústria bélica.

Quem é que se beneficia com o fabrico, exposição e venda de armas? Militares, políticos e banqueiros!!!

Eles fazem as guerras em que os melhores filhos do povo morrem como bucha de canhão.

Assim, de acordo com a nossa posição, convocamos uma manifestação pacífica, que acontecerá no dia do desfile militar de São Paulo, 7 de setembro. Concentração a partir das 8:00 horas da manhã na Estação Ponte Pequena do metrô.

Apelamos à participação de todas as pessoas que aspirem a uma sociedade livre e igualitária. Preparem suas faixas, fanzines, panfletos...

CONTRA ESTA SOCIEDADE MILITARIZADA

DESOBEDIÊNCIA CIVIL

Coletivo Libertário



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