Ronaldo foi conquistado pelo Corinthians no grito. Primeiro, no grito que diz: "Aqui tem um bando de louco/ Louco por ti, Corinthians". Segundo, no grito que a diretoria deu para tê-lo em 2009 – ano seguinte ao de sua passagem pela Série B, ano anterior ao da comemoração de seu centenário. Os relatos de quem acompanhou as negociações são unânimes em um ponto: enquanto o Flamengo contava ter o craque simplesmente por ser flamenguista, estar lá em seu centro de treinamento e declarar sua vontade de ficar, o Corinthians fez uma proposta concreta, agressiva e... definitiva. O Flamengo, em uma palavra, bobeou. O Corinthians abriu suas portas e camisas para os patrocinadores que Ronaldo trouxe e ainda trará, e isso é algo que se deve ter sempre em conta: mais que uma contratação do Corinthians, Ronaldo é agora um parceiro dele.
O que também está claro é que ele queria um clube de grande torcida. Em setembro, durante entrevista, ouvi dele que a torcida do Corinthians só poderia ser comparada com a do Flamengo, logo depois de uma TV mostrar a Fiel cantando justamente "Aqui tem um bando de louco". Convenhamos, Ronaldo não tem nada a provar para ninguém, mas isso é algo que falta em sua carreira: a idolatria em algum grande clube brasileiro. Ele arrebentou no Cruzeiro em 1993, com um gol por partida, só que mal deu tempo de se tornar um ídolo e ele partiu para a mais bem-sucedida carreira internacional de um craque brasileiro, em termos de títulos individuais e coletivos. (Só Ronaldo tem duas Bolas de Ouro e três Fifa Players desde que esses prêmios existem.)
Mas o Corinthians não fez apenas uma "jogada de marketing". Não trouxe um garoto-propaganda que pensa em jogar com o nome; trouxe um craque em recuperação, um centroavante que foi artilheiro em quatro países diferentes e é o segundo maior da história da seleção, atrás somente de Pelé, e que ainda sabe fazer gols como ninguém. Mesmo no Milan, onde jogou pouquíssimo, anotou nada menos que sete gols nas dez primeiras partidas, índice que nem Ronaldinho nem Pato podem ostentar. O problema é que não é isso que se quer dele, nem o que ele mesmo quer. Desde 2005 Ronaldo não emenda uma temporada "cheia", isto é, sem ficar meses sem atuar por causa de lesões. E esse é seu maior sonho agora: fazer um 2009 bom, de escassas ausências e muitos gols, com algum título de preferência. Aí ele poderá olhar para 2010 e pensar: vou disputar a Libertadores pelo Timão e, quem sabe, a Copa da África do Sul pela seleção.
O que ele quer, em outras palavras, é encerrar a carreira no Brasil em alto estilo, daqui a dois ou três anos. Que ninguém espere, porém, que ele volte a ser propriamente "O Fenômeno", apelido que ganhou da torcida da Inter de Milão em 1997 quando foi o melhor jogador do Campeonato Italiano e o vencedor da Copa da Uefa. O Ronaldo desse ano e do Barcelona não pode ser igualado nem por ele mesmo: já não tem explosão e agilidade para isso, por causa de sua idade e de seu histórico de contusões e sobrepeso. O que é razoável, então, esperar dele? Depois de dois ou três meses de treino e adaptação, pode ser importante no Paulista e no Brasileirão com uma boa média de gols, acima de 0,5 por partida. Ele pode fazer mais pelo Corinthians do que Adriano fez pelo São Paulo. Precisa, no entanto, contar com paciência da torcida no início.
O maior inimigo de Ronaldo não é a pressão, não é a falta de motivação, não é a noite, não são os compromissos publicitários, não é nem mesmo o peso. É a possibilidade de lesões. Desde 2002, por causa do longo processo de recuperação, sua massa muscular cresceu e o equilíbrio dela ficou mais e mais delicado, atingindo ironicamente aquilo que lhe era mais característico: o arranque em ziguezague, a combinação de velocidade e drible. Mas, se mantiver o porcentual de gordura adequado e for bem monitorado pelos fisiologistas, ele pode enfim ter uma vida regular de atleta – o "resto" vem de sua técnica ímpar e subestimada. O possível time no qual vai jogar não é nenhum Barcelona ou Milan, mas é bem competitivo em sua terra: Felipe, Chicão, William e Escudero; Túlio, Alessandro, Douglas, Morais e André Santos; Dentinho e Ronaldo. Jean, Elias, Cristian, Jorge Henrique, Herrera, Diogo e (talvez) Brandão seriam reservas. Mano Menezes terá doces problemas a resolver...
Jogando 50% do que jogava no auge, ou 80% do que jogou nas duas primeiras temporadas de Real Madrid (2002-04), Ronaldo já será melhor do que todos os outros atacantes que atuam no futebol nacional. Uma vitória ele já conquistou: mostrar o desejo por um desafio, não por uma "aposentadoria em atividade". E ver tantas pessoas na mídia dizendo que ele foi o maior jogador do mundo nos últimos 15 anos – como Zidane e Ronaldinho já disseram tantas vezes, para não falar de Kaká e Marcos – é outro golaço. Se ele e o clube, cuja estrutura o impressionou bastante, tiverem seriedade comparável com a festa feita nos últimos dias, o ano de ambos pode ser grande.