PÃO E ROSAS
			 
			As crianças precisam de pão e de rosas.
			O pão do corpo, que mantém o indivíduo em boa saúde fisiológica. 
			 
			O  pão do espírito, que você chama de instrução, conhecimentos, conquistas  técnicas, esse mínimo sem o qual corremos o risco de não conseguir a  desejável saúde intelectual.
			 
			E das rosas também – não por luxo, mas por necessidade vital.
			 
			Observo  o meu cão. Claro, precisa comer e beber para não ter fome e não ficar  desesperado, com a língua de fora. Mas tem mais necessidade ainda de uma  carícia do dono, de uma palavra de simpatia ou, às vezes, só de uma  palavra; do afeto que lhe dá o sentimento do lugar, o qual desejaria  muito grande, que ocupa no mundo em que vive; de correr por entre as  moitas ou só uivar demoradamente nas noites de luar, talvez para ouvir  ressoar a própria voz, como se ela abalasse magnificamente o universo.
			 
			As  crianças têm necessidade de pão, do pão do corpo e do pão do espírito,  mas necessitam ainda mais do seu olhar, da sua voz, do seu pensamento e  da sua promessa. Precisam sentir que encontraram, em você e na sua  escola, a ressonância de falar com alguém que as escute, de escrever a  alguém que as leia ou as compreenda, de produzir alguma coisa de útil e  de belo que é a expressão de tudo o que trazem nelas de generoso e de  superior.
			 
			Essa  nova intimidade estabelecida pelo trabalho entre o adulto e a criança,  esse novo grafismo aparentemente sem objeto, valorizado pela matéria ou  pela cor, esse texto eternizado pela imprensa, esse poema que é o  cântico da alma, esse cântico que é como um apelo do ser para o afeto  que nos ultrapassa – é de tudo isso que vive a criança, normalmente  alimentada de pão e conhecimentos, é tudo isso que a engrandece e a  idealiza, que lhe abre o coração e o espírito. 
			 
			A  planta tem necessidade de sol e de céu azul, o animal não degenerado  pela domestificação não sabe viver sem o ar puro da liberdade. 
			A criança precisa de pão e de rosas.
			 
			(Célestin Freinet, Pedagogia do Bom Senso, p. 104-105 )