Política
A Alemanha ressuscita seu fascínio pela Rússia GILLES LAPOUGE
O Estado de S. Paulo - 14/04/2010
Acordo para ajudar a Grécia expôs as fissuras na aliança da França com a Alemanha, que cada vez mais volta seus olhos ao imenso mercado em construção no Leste Europeu
A União Europeia (UE) finalmente conseguiu, não sem ranger os dentes, reunir-se para dar à asfixiada Grécia a promessa de um balão de oxigênio. Por quanto tempo essa promessa fará efeito e manterá a cabeça da Grécia fora da água? O acordo foi obtido ao preço de novas fissuras, e algumas rachaduras, no interior da Europa. Ele deu pretexto para Alemanha e França trocarem as pequenas farpas que hoje constituem a base de seu diálogo. Pois não é que a ministra francesa da Economia, Christine Lagarde, recriminou a Alemanha por pagar pouco a seus assalariados?
Há uma inflexão capital na história da Europa. A União Europeia só saiu do limbo, outrora, graças à aliança estreita, agregadora, franca, que ligava a Alemanha e a França havia 50 anos. Essa aliança está em baixa atualmente. Está evidente que para Berlim a França é agora uma parceira entre outras.
Para que direção a Alemanha está olhando? Para os Estados Unidos, para a China, para os outros países europeus, é claro, que absorvem uma parte das exportações alemãs. Mas um novo cliente, que não pertence à União Europeia, ganha importância dia após dia: a Rússia.
Quando a principal empresa da área nuclear europeia, a francesa Areva, propôs à alemã Siemens para juntarem seu know how numa central nuclear de terceira geração, a empresa alemã, embora bem implantada na França, se esquivou e olhou para a Rússia. Esse é um reflexo comum na Alemanha.
As indústrias alemãs estão de olho no imenso mercado em construção que é a Rússia.
Como explicar isso? Primeiro, a Alemanha não quer limitar suas ambições a esta Europa dos 27 que é caótica, sempre irritada, e cujos "elos fracos" pedem regularmente que a rica Alemanha os tire do buraco onde sua preguiça os lançou (exemplo: a Grécia). Para um espírito racional, pragmático, essa Europa é desconcertante. Nem se sabe mais quem a dirige.
Ademais, existe na Alemanha um verdadeiro fascínio pelo Leste. Esse "tropismo" é antigo. Foram os alemães que, nos séculos 18 e 19, atraíram para a Europa aquele império "oriental" que era a Rússia dos antigos czares. E foi uma princesa alemã, Catarina a Grande, que europeizou a sociedade russa no período das "Luzes".
Essa atração, a despeito da guerra atroz que Hitler moveu aos soviéticos, jamais desapareceu. Um fato recente nos ocorre, neste momento em que a Alemanha parece buscar novos caminhos diplomáticos e econômicos. Trata-se da atitude do antecessor da chanceler Angela Merkel.
O chanceler socialista Gerhard Schroeder, 30 dias apenas após deixar o poder, foi parar no conselho de administração do gigantesco projeto de oleoduto concebido e gerido por uma das empresas caras a Putin, a Gazprom.
Na época, atribuiu-se a pressa de Schroeder à cupidez. Talvez essa cupidez estivesse a serviço de uma das obsessões da Alemanha.
/ TRADUÇÃO DE CELSO M. PACIORNIK
É CORRESPONDENTE EM PARIS
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