Os incomodados que me perdoem. Não dá para passar batido, neste espaço de opinião, sobre o que considero – cada um a seu modo e em seu respectivo contexto - dois dos fatos jornalísticos mais interessantes, relevantes e dignos de análises nesta penúltima semana de janeiro de 2013 para não esquecer.
1: A monumental barrigada do respeitável jornal espanhol El País, ao divulgar na página web e na capa de sua nobre e acatada edição impressa, quinta-feira (24), foto bizarra de um cidadão entubado, careca (vale neste caso estranho observar o detalhe em linguagem crua e politicamente incorreta), identificado como o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, moribundo em leito hospitalar de Havana, Cuba.
Um caso gritante e nada exemplar, logo se vê, do desejo submerso atropelando o fato e a verdade que está "no olho da cara".
2- O polêmico (pode parecer óbvia, mas não há palavra mais apropriada neste caso) e desconcertante pronunciamento da presidente da República, Dilma Rousseff, em rede nacional de TV e Rádio, um dia antes.
Primor de peça de oratória política, comunicação e propaganda de governo, objetivando alcançar vários objetivos com uma paulada só, a saber:
A) Anunciar para usuários comuns e grandes consumidores industriais de energia, a redução significativa para o bolso e o caixa, da conta mensal de luz, a valer a partir de quinta-feira (24);
B) bater duro na cabeça dos reativos "pessimistas" e "alarmistas" - leia-se oposicionistas e adversários em geral, mas principalmente os tucanos FHC, Serra e Aécio Neves - ;
C) lançar com toda pompa, circunstância e largo alcance no País e lá fora, a campanha de reeleição, com quase dois anos de antecedência, da atual ocupante do Palácio do Planalto, na disputa presidencial das eleições de 2014.
"Eta ferro!", como gostam de gritar os cariocas diante de situações como estas duas, anotadas no correr dos últimos sete dias.
No caso da estranhíssima - e até agora mal explicada barrigada do El País - já se pode visualizar devastadoras consequências, mesmo aqui no Brasil, onde a chamada "grande imprensa", neste caso, opta por forte guinada em relação ao tratamento informativo e de opinião dado a delicados episódios políticos recentes.
Prefere guardar uma espécie de "silêncio piedoso" (ou seria "silêncio corporativista" ) diante do malfeito do co-irmão espanhol, como se dizia antigamente na imprensa baiana.
Primeiro, no terreno delicado da perda de credibilidade (pior condenação que um jornal pode sofrer) para o importante diário editado em Madri - mas de ampla penetração e relevo na Europa, América Latina e Estados Unidos, entre outros rincões mais ou menos democráticos.
Depois, no plano mais rasteiro (embora não menos demolidor), do golpe financeiro sofrido nos últimos dias por uma empresa jornalística que já se arrasta em crise prolongada, em um dos países europeus mais próximos da bancarrota, sufocado por dificuldade que parece interminável na nação imperial de Rajoy e do Rei Juan Carlos.
Este último, igualmente em baixa de prestígio e credibilidade, desde a queda na desastrada caçada de elefantes na África, longe das vistas da Rainha Sofia. A exemplo da Espanha gloriosa de outros tempos, o rei também tem atualmente dificuldades sérias para se reabilitar.
No caso de repercussão mundial desta semana, depois de constatar que o careca da foto não era Hugo Chávez, El País montou gigantesca e cara operação de emergência para amenizar os efeitos da catástrofe: meia hora depois de publicada, retirou do ar a imagem no portal web do diário.
Ainda, durante a madrugada, parou as máquinas (fato raríssimo em qualquer grande jornal do mundo) para retirar a imagem da primeira página de sua acreditada edição impressa, imprimindo em seguida uma nova edição, mas sem impedir que alguns exemplares com a foto falsa chegassem aos quiosques de Madri.
Só quem já viveu a experiência de uma grande redação, no fechamento de uma edição e rodagem nas máquinas das oficinas de grande jornal ou revista, sabe exatamente o que uma operação como esta significa em termos de tensão, desgaste emocional e custos financeiros monumentais.
E quantas cabeças rolam durante e depois de uma situação semelhante à que El País precisou enfrentar. E quantas seguem rolando ainda, muito tempo depois de tudo passado.
Talvez seja o frio na espinha, diante da simples imaginação do caso, o que silencia muita gente que não costuma ter papas nas línguas diante de um teclado de computador. Na Espanha ou no Brasil.
No caso do pronunciamento oficial da presidente Dilma, em rede nacional de televisão e rádio, não se conhece ainda consequências maiores e concretas, além das palmas pressurosas e foguetes barulhentos de petistas e governistas em geral, e do choro e ranger de dentes de tucanos e oposicionistas.
Ou do bafafá que rola no pró e contra na imprensa, que mais parece coisa de arquibancada e gerais em dia de Fla x Flu.
Mas é certo, pode apostar, que a exemplo da foto falsa de Chávez na primeira página do El País, ainda se falará muito, nos próximos dias, dos olhos faiscantes e das palavras ditas, como chicotadas, por Dilma esta semana na tela da TV, ao defender seu governo e começar a campanha para ficar mais quatro anos na cadeira principal de mando no Palácio do Planalto.
A conferir.
Vitor Hugo Soares é jornalista. E-mail: [email protected]