Começo por dizer que não sou economista e os conhecimentos que tenho sobre tal ciência são limitados. As minhas opiniões acerca de questões económicas revelam, portanto, a profundidade e limitações que podem ser esperadas de um leigo. Mas se calhar, em momentos de autêntico turbilhão, arriscaria dizer que a simplicidade da análise leiga pode lançar algumas luzes interessantes sobre o que se está a passar. Derrubar complexidades de forma simplória pode ajudar a devolver alguma sanidade ao que à partida parece inatingível.
Posto isto, feita esta ressalva, façamos então o esforço de analisar com os olhos de leigo (os meus, neste caso) o que se passou esta semana. Comecemos por um enquadramento. Há pouco mais de um ano atrás, assistimos à implosão de uma gigantesca crise. A
crise de uma vida, como alguns desde logo sublinharam. Rogaram-se então pragas em uníssono contra o sistema financeiro internacional vigente, os perigos dos mercados desregulados e a opressiva ditadura da especulação sem fronteiras. Os líderes mais improváveis juraram reformar as leis do sistema vigente, apostando na regulação e tentando assim devolver alguma segurança (e um pouco de racionalidade, já agora) às lógicas dos mercados internacionais.
Mas eis que, pouco tempo depois, tudo parece ter sido esquecido. Uma onda de amnésia varreu com certeza as mentes dos líderes mundiais. O sistema continua a funcionar em todo o seu esplendor e (vejam lá que chatice...) Portugal foi agora apanhado bem no meio de uma tempestade. Que azar o nosso... Tempestade esta que, curiosamente, não foi motivada por uma falência de uma qualquer empresa portuguesa, por uma diminuição abrupta do consumo ou por uma qualquer falsificação dos números da economia nacional. Aconteceu sim porque os mercados andam nervosos. Andam inquietos, coitados, procurando aconselhamento nos mesmos consultórios - agências de rating - que deixaram a economia mundial em pantanas há um ano e meio atrás. Depois do ataque especulativo aos títulos da dívida Grega, foram aconselhados a descarregar o seu stress em Portugal.
É fantástica a (falta de) racionalidade do que se está a passar. É formidável verificar como economias inteiras podem tombar à custa de nervosismos e inquietações de uma espécie de ente supremo (que consta ter mãos invisíveis) conhecido como
O Mercado. E é ainda mais interessante verificar como os adoradores d'
O Mercado justificam os danos por Ele provocados como um expectável castigo divino e purificador contra quem ousou duvidar do caminho para a felicidade que
Ele oferece. Só sobrevivem aqueles que não pecaram, que levaram uma vida segundo os ensinamentos sagrados. É muito à frente, sem dúvida.
Mas o desafio último será, portanto, explicar este filme de série B ao cidadão comum. Não só aquele que percebe pouco de economia, mas aquele que vê a austeridade não através da televisão ou jornais mas da sua carteira. Explicar que tudo isto se passa porque os mercados andam nervosos e ansiosos. Se eu der esta explicação à minha vizinha do 2º esquerdo (pessoa já de idade), ela certamente aconselhará um cházinho de tília e uma boa noite de sono para esses Srs. Mercados. No caso do meu vizinho do 1º andar, homem simples e prático, a resposta é capaz de ser um pouco diferente: "
Morgados? Quem são esses Morgados? Devem ser uns grandes filhos da mãe... E ninguém lhes limpa o sebo, caramba?". A simplicidade costuma revelar grande sabedoria.
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