29/8/2008 |
Como quem diz que está fazendo a sua parte, o governo acaba de levar ao Congresso uma proposta de reforma política que se desdobrará em cinco projetos de lei e uma emenda constitucional, a serem encaminhados depois das eleições municipais. As questões abrangidas são as de sempre - sistema eleitoral, financiamento de campanhas, fidelidade partidária, cláusula de barreira -, com uma novidade: a questão dos chamados “fichas-sujas”. Numa iniciativa que terá a aprovação da sociedade, o Planalto quer tornar inelegíveis os candidatos que tenham sido condenados em decisão colegiada (não de um juiz apenas), seja qual for a instância judicial. No começo do mês, como se recorda, o Supremo Tribunal Federal (STF), considerando que a lei das inelegibilidades é omissa a respeito, decidiu que os políticos que sofrem processos só perdem o direito de se candidatar se tiverem sido condenados em sentença inapelável. O governo pretende vedar a brecha na legislação. Não está nada claro, porém, o destino do projeto - aliás, a dúvida se estende a quase todos os demais itens da proposta do Planalto. A relutância do Congresso em mudar as regras do jogo pelas quais os seus membros se elegeram parece invencível, para desalento dos reformistas dos principais partidos. É de recear que não seja diferente desta vez, menos, como não poderia deixar de ser, em relação ao ponto que fala diretamente ao interesse dos próprios políticos, por abrandar a lei da fidelidade partidária. No começo do ano, a Justiça Eleitoral e o STF, ao entender que os mandatos legislativos pertencem aos partidos e não aos eleitos, puseram fim à farra do entra-e-sai pelas legendas, punindo os transgressores com a perda do mandato. Agora o Planalto propõe a infidelidade com data marcada: apenas nos anos eleitorais, até a sete meses da votação. A norma impediria a habitual dança das cadeiras entre o pleito e a posse dos novos governos, que assim engordam as suas bancadas. A reforma apresentada ao Congresso revive a cláusula de barreira ou de desempenho. Emenda constitucional prevê que deixarão de ter existência parlamentar os partidos que não obtiverem, na eleição para a Câmara dos Deputados, 1% dos votos válidos em pelo menos 1/3 dos Estados, com um mínimo de 0,5% em cada um. Calcula-se que, nessa hipótese, mais da metade dos atuais 27 partidos brasileiros sairia de cena. Seriam preservadas, de toda forma, as pequenas agremiações históricas, como o PC do B. “A idéia é extinguir os partidos-mercadoria, que só existem para negociar tempo de TV”, diz o ministro da Justiça, Tarso Genro. Ocorre que uma limitação mais severa - patamar de 5% dos votos - foi aprovada em 1995 para entrar em vigor em 2006, mas o Supremo a julgou inconstitucional por ferir o direito das minorias. A lei condenada não distinguia entre partidos históricos e de aluguel. A rigor, a cláusula de desempenho se tornaria supérflua se viesse a ser aprovada a proposta - que não é nova - de proibir as coligações nas eleições proporcionais, em que as siglas de aluguel mercadejam os seus minutos no horário gratuito em troca de vagas na chapa comum. Sem isso, os pseudopartidos dificilmente elegeriam algum representante - e a fragmentação política teria os dias contados. Também para combater as “alianças interesseiras”, segundo Genro, o Planalto quer que nas eleições majoritárias o tempo de rádio e TV de cada coligação seja aquele a que tem direito o maior partido da chapa, e não mais a soma dos tempos das siglas coligadas. Estranhamente, porque no ano passado a Câmara derrubou projeto semelhante, o governo sugere a adoção do voto em listas partidárias fechadas, no lugar do voto em candidatos individuais, para deputado e vereador. Até os articuladores políticos governistas duvidam que a mudança seja aprovada. Para o presidente Lula, de todo modo, o mais importante é a implantação do financiamento público exclusivo das campanhas. Ele vetou o plano inicial de também oferecer ao Congresso a alternativa de um sistema misto, público e privado, como existe nos Estados Unidos. Pesquisas atestam que a idéia de gastar dinheiro do contribuinte para eleger políticos - que é como a opinião pública define a questão - é rejeitada pela grande maioria dos brasileiros. |