O Estado de S. Paulo - 13/06/2012 |
A taxa de desemprego no Brasil está em níveis muito baixos para os padrões históricos do País e para os padrões internacionais: menos de 6% da força de trabalho. Este baixo nível de desemprego, combinado a outros indicadores, sugere que o mercado de trabalho do País já ultrapassou o nível de pleno emprego, ou seja, um nível no qual os trabalhadores que desejam estar empregados e que aceitam um nível salarial compatível com sua produtividade já conseguiram emprego. Mas por que a taxa de pleno emprego não seria mais próxima de zero? Uma primeira razão é o fato de que as pessoas trocam de emprego com frequência e, entre sair de um emprego e encontrar outro, ficam desempregadas. Este desemprego friccional tende a aumentar quanto mais aquecido estiver o mercado de trabalho. Neste caso, ainda que as empresas demitam menos, o incentivo para o trabalhador trocar de emprego aumenta, pois fica mais fácil conseguir um novo emprego. Este incentivo é muito forte no Brasil onde o trabalhador recebe um "prêmio" monetário (aviso prévio, retirada do FGTS, multa de 40% sobre o FGTS, seguro-desemprego, etc.) ao ser demitido. Por esta razão, a rotatividade é muito elevada no País, o que aumenta a taxa de desemprego de pleno emprego. Em 2010, a soma do número de admissões e desligamentos de trabalhadores com vínculos formais de emprego foi maior do que o número médio de postos de trabalho formais existente no País (116%). E, ainda mais importante como sintoma de um mercado de trabalho aquecido, a rotatividade está aumentando, tendo passado de 90% em 1996 para 116% em 2010. Um segundo fator que faz com que a taxa de desemprego de pleno emprego seja relativamente elevada no Brasil é o alto custo de demissão, o que faz com que a taxa de desemprego de jovens, sem curso secundário completo, seja muito alta. Como a produtividade desses jovens é desconhecida por parte dos empregadores e como é caro demitir trabalhadores, as empresas oferecem salários relativamente baixos para evitar custos elevados de demissão no futuro. O resultado é que os jovens permanecem mais tempo buscando emprego e, portanto, desempregados. Porém, o sinal mais claro e mais preocupante de que ultrapassamos o nível de pleno emprego é o comportamento dos salários nominais e reais e da taxa de desemprego. À medida que a economia se aproxima do pleno emprego, os ganhos salariais se aceleram, a redução da taxa de desemprego fica mais lenta e são incorporados ao mercado de trabalho trabalhadores com produtividade cada vez menor. Isto é exatamente o que está ocorrendo no mercado de trabalho brasileiro. Em geral, quando isso ocorre, as empresas tentam repassar os aumentos de custos para os preços, gerando mais inflação. Entretanto, com o excesso de oferta hoje existente no mundo em razão da crise econômica, os preços dos bens importados estão em queda e a concorrência inviabiliza qualquer aumento de preço de bens industriais (exceto quando ocorre desvalorizações do real). Se, por um lado, isso evita pressões inflacionárias mais fortes, por outro aumenta o custo real do trabalho, reduz as margens de lucros e a taxa de investimento. Daí a queda da produção e do investimento da indústria desde o segundo trimestre de 2011, o que já afeta a geração de empregos no setor. Eventualmente, a queda do emprego industrial deve atingir outros setores da economia, levando o mercado de trabalho de volta ao equilíbrio e reduzindo as pressões salariais. Tentar abortar este processo de ajuste do mercado de trabalho com políticas de incentivo ao consumo, sem atacar os problemas estruturais que estão afetando a taxa de investimento e a produtividade, vai manter as pressões salariais por mais tempo e reduzir ainda mais a competitividade da indústria. Essa estratégia poderá até prolongar a agonia do setor industrial, mas, sem políticas voltadas à retomada dos investimentos e ganhos de produtividade, não conseguirá evitar o aumento da taxa de desemprego. JOSÉ MÁRCIO, CAMARGO, PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA DA OPUS INVESTIMENTOS |