Política
Apagão logístico - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADÃO - 05/08
Congestionamento nas estradas, enormes filas de caminhões nos portos, navios parados ao largo à espera de espaço para atracar, falta de espaço nos armazéns e prejuízos assustadores - este cenário é bem conhecido, mas o quadro poderá ser pior no próximo ano, avisam produtores rurais e líderes do agronegócio. O apagão logístico há vários anos previsto por especialistas e empresários do setor poderá finalmente ocorrer, se a próxima colheita de grãos e oleaginosas for tão boa quanto se espera. Boa parte da segunda safra de milho deste ano ainda estará nos armazéns, no começo de 2013, quando os plantadores de soja precisarem de espaço para acomodar uma produção provavelmente recorde, por enquanto estimada em 80 milhões de toneladas.
A "safrinha", nome tradicional da segunda safra de milho, deve totalizar 34,6 milhões de toneladas, estima a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Empresários, técnicos e dirigentes de associações de vários Estados produtores, entrevistados pela Agência Estado, traçaram mais uma vez o velho quadro paradoxal: notícias de boas colheitas são prenúncios de muita dor de cabeça para produtores, processadores e exportadores.
O agronegócio continua dando uma ampla contribuição para o saldo comercial do País. Mesmo com a queda de preços de vários produtos, no primeiro semestre, o setor manteve um superávit de US$ 36,7 bilhões entre janeiro e junho e de US$ 79,4 bilhões em 12 meses, segundo o levantamento mensal do Ministério da Agricultura. Os problemas de logística são parte da rotina do agronegócio e tendem a ficar cada vez mais graves, porque os investimentos em conservação e expansão da infraestrutura nem de longe acompanham o crescimento do volume colhido.
Neste ano e no próximo, a quebra da produção americana, por causa da seca, abre perspectivas de bons negócios para os produtores brasileiros, por causa da alta de preços no mercado internacional. As cotações são atraentes para quem dispõe do chamado milho safrinha, normalmente plantado depois da colheita da soja, e para quem planeja o plantio da próxima safra de verão.
A área destinada à soja, segundo estimativas correntes, deverá ser 10% maior que a da temporada 2011-2012. Dirigentes e técnicos de associações de produtores de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná já apontam dificuldades para o escoamento do milho recém-colhido ou em processo de colheita. Os armazéns são insuficientes.
Além disso, as velhas dificuldades logísticas foram agravadas pelas greves de servidores da Receita Federal e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, nos últimos dias, pela paralisação de caminhoneiros.
A ameaça de greve de mais uma categoria, a dos fiscais federais agropecuários, era apontada, na sexta-feira, como mais uma preocupação para produtores e exportadores.
Alguns técnicos preveem escassez de caminhões para a próxima safra de verão. É um recado para a indústria e para os bancos financiadores de equipamentos. Mas o aumento da oferta de caminhões só resolverá parte do problema. É preciso cuidar das vias de transporte. A recuperação da Rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), hoje em muito más condições, criaria uma alternativa mais econômica para escoamento de 30% da produção mato-grossense, sugeriu o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso, segundo a Agência Estado. Especialistas poderiam multiplicar os exemplos de obras necessárias para baratear a movimentação das safras. Investimentos em hidrovias, outra possibilidade citada com frequência, permitiriam transportar a produção do Centro-Oeste para os portos da Região Norte e evitar o longo e caro trajeto até os terminais do Sudeste e do Sul.
Para cuidar do risco do apagão logístico, no entanto, o governo precisará enfrentar uma deficiência interna - o apagão de sua capacidade de planejamento, de administração e de execução de projetos. A quase paralisia do Ministério dos Transportes, depois da faxina parcial do ano passado, é apenas um dos sintomas do problema. As disfunções da máquina federal ameaçam travar o setor mais competitivo da economia nacional, o agronegócio.
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