Fábio Portela
Julia Moraes/Folha Imagem | ESQUERDA E DIREITA |
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• Quadro: As obras sob suspeitas |
A Camargo Corrêa, uma das maiores empreiteiras do Brasil, sempre se declarou apartidária. Com isso, queria dizer que jamais colocaria seu peso empresarial – e sua milionária conta bancária – a serviço do projeto de poder deste ou daquele partido político. Mas, a julgar pelas informações já reveladas pela Operação Castelo de Areia, da Polícia Federal (PF), o termo apartidário não se aplica. A Camargo Corrêa é, aparentemente, uma empresa multipartidária. Parece sempre disposta a abrir seus cofres para auxiliar qualquer político que lhe bata à porta, independentemente da coloração partidária – desde que, claro, possa cobrar no futuro uma retribuição, na forma de novos contratos para realizar obras públicas. É o ciclo vicioso da corrupção. Segundo informações da Operação Castelo de Areia, reveladas na semana passada pelo Ministério Público Federal, a Camargo Corrêa é suspeita de ter pago propina a integrantes de sete partidos. Da esquerda para a direita, são eles: PCdoB, PSB, PT, PMDB, PSDB, PR e DEM. O dinheiro teria sido entregue a deputados, senadores e funcionários públicos. A lista da propina, com os nomes dos supostos beneficiários, estava em um pen drive que pertencia a um dos diretores da empreiteira, Pietro Bianchi.
Os indícios do propinoduto são tão concretos que o Ministério Público pediu à Justiça a abertura de novas frentes de investigação, para esmiuçar a execução de catorze grandes obras públicas tocadas pela empresa. Já é possível ligar alguns nomes que aparecem na lista da propina às obras, mas é preciso aprofundar o trabalho. VEJA analisou os oito maiores projetos citados pelo Ministério Público. Todos têm orçamentos milionários (veja o quadro). Na maioria, a Camargo Corrêa receberá muito mais pelo trabalho do que o que havia sido acertado inicialmente. Por exemplo: as eclusas de Tucuruí começaram custando 230 milhões de reais, mas seu preço final ficará em 883 milhões de reais. Só se consegue esse aumento contando com a boa vontade de políticos e servidores dos órgãos encarregados de fiscalizar o projeto. Há também casos em que o Tribunal de Contas da União (TCU) descobriu indícios de sobrepreço. Um deles é o do metrô de Fortaleza, no qual foram apontados gastos de 133 milhões de reais sem justificativa.
Os problemas da Camargo Corrêa não se esgotam aí. Três de seus diretores devem responder a processos de evasão de divisas e lavagem de dinheiro, por terem enviado milhões de reais ilicitamente ao exterior. Além disso, a empresa será investigada pela tragédia do metrô de São Paulo. Em 2007, as obras de uma das estações ruíram, abrindo uma cratera gigantesca e matando sete pessoas. Suspeita-se que a empreiteira tenha dado propina a policiais e a um membro do Ministério Público que investigavam o acidente, para não ser responsabilizada pela tragédia. Por fim, há outras listas que podem se referir a outros pagamentos escusos e ainda serão escrutinadas. Em uma delas, o nome do presidente da Câmara, Michel Temer, do PMDB, aparece 21 vezes, ao lado de quantias que somam 345 000 dólares. Diante de tudo isso, a empresa reclamou do fato de não ter tido acesso a todos os documentos, gravações telefônicas, filmagens e arquivos de computador que sustentam a Operação Castelo de Areia e divulgou uma nota oficial: "A Camargo Corrêa está convicta da licitude da sua conduta e espera ter acesso a essas informações para que possa fazer sua defesa, direito que constitui base fundamental de um Estado democrático". Certamente a empreiteira tem o direito de conhecer os detalhes da operação para se defender quando for denunciada pelo Ministério Público, o que parece ser apenas questão de tempo. Mas a montanha de evidências que se avolumam contra ela é impressionante. Além de multipartidária, ela terá de ser "multiconvincente" para se livrar de todas as acusações.