Política
Câmbio não gerou recessão na indústria - CLAUDIA SAFATLE
VALOR ECONÔMICO - 14/09
A recessão na indústria foi produto da queda dos investimentos e não, como indica o senso comum, da valorização da taxa de câmbio.
"Foi a forte redução do crescimento do investimento, e não uma suposta "desindustrialização", que reduziu tanto o crescimento da produção industrial", asseguram os economistas Franklin Serrano e Ricardo Summa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no estudo "A Desaceleração Rudimentar da Economia Brasileira desde 2011".
No mesmo texto, eles abordam outro aspecto controverso do debate econômico: a inflação não é de demanda, mas de custos.
O real apreciado ajudou na expansão da economia
Em um trabalho bastante crítico em vários aspectos da política econômica do governo, eles sustentam que a apreciação do câmbio, ao contrário do que se imagina, tem efeito expansionista sobre a atividade econômica.
"O câmbio valorizado foi importante para o aumento dos salários reais e, portanto, para o crescimento do consumo das famílias, e a evidência no período 2004-2010 deixa claro que a valorização cambial, por mais que possa agravar os problemas de competitividade externa e do saldo da balança comercial, tem tido claramente um efeito expansionista tanto sobre o produção industrial quanto sobre o PIB", dizem.
Eles explicam que a principal causa da recessão industrial no início deste ano foi a desaceleração geral da demanda, que atingiu mais a indústria do que outros setores da economia, porque o investimento (público e privado) teve redução mais acentuada a partir de 2011.
Vindos da mesma escola do secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, há pontos de convergência entre os autores e o secretário, seja na avaliação do peso dos investimentos sobre a produção industrial ou no entendimento de que a inflação não é resultante do excesso de demanda, mas sim de fatores externos (preços das commodities e câmbio).
No fim do ano passado, Barbosa defendeu, no governo, que o foco da política econômica em 2012 deveria se centrar na expansão dos investimentos, ainda que isso custasse algum afrouxamento fiscal. Foi voto vencido. Menos de um ano depois, a presidente Dilma Rousseff recolocou a questão e a ação do governo, nas últimas semanas, se mostra voltada para medidas destinadas a animar os investimentos.
A ligação da produção industrial com a taxa de investimento é direta. Segundo o secretário, cerca de 52% do investimento consiste em produtos da indústria manufatureira. "Quando o investimento cai, cai também a demanda por produtos industriais".
Segundo dados do Panorama Fiscal do Ipea, citados no estudo dos dois economistas, o investimento da administração pública cresceu 14,8% em média entre 2004 a 2010. No ano passado, houve queda real de 12%, o que implicou redução nominal desses investimentos. Nas empresas estatais, o crescimento médio do investimento caiu de 14% para 8,6% em igual período.
Os investimentos em capital fixo (público e privado) saíram de uma expansão média de 9,2% entre 2004 e 2010, e de um crescimento de 21,3% em 2010, para apenas 4,7% em 2011. Um freio dramático ocorreu na indústria de máquinas e equipamentos, que deixou um crescimento de 30,4% em 2010 para 6% em 2011.
"Apesar da taxa de câmbio real ter relevância (bem menor do que normalmente se considera, mas isso é tema para outra discussão) para a competitividade externa de nossa indústria, fica difícil não ver que a principal causa da queda drástica do crescimento da produção da indústria manufatureira - de 10,14% em 2010 para apenas 0,13% em 2011 - foi a grande redução do crescimento do investimento no período, especialmente no componente máquinas e equipamentos, tanto privado quanto público", afirmam Serrano e Summa.
Os efeitos da desaceleração da economia em 2011 atingiram mais intensamente o investimento privado no primeiro trimestre deste ano.
Barbosa assinala que a queda no investimento afetou tanto as importações quanto a produção interna. "E a valorização do câmbio fez com que a produção que restou vazasse para o resto do mundo."
A desvalorização a partir de março, que levou o câmbio para a casa dos R$ 2,05, ajudou a estancar o vazamento, mas o novo patamar do câmbio ainda é uma taxa bem apreciada para o padrão histórico, salienta o secretário. Sobre o futuro da política cambial, ele diz apenas: "Não vamos deixar apreciar demais".
Se o diagnóstico do estudo dos economistas da UFRJ estiver correto, só o aumento do investimento fará a indústria reagir. "O empresário não investe porque o governo pediu nem porque a taxa de juros está baixa. O empresário investe se tiver demanda", diz Barbosa.
Aos que criticam o modelo por estar centrado no consumo, ele responde: " Se não houver consumo, não haverá investimentos". O Estado, assegura, vai aumentar os investimentos e o consumo, que se desacelerou no segundo trimestre, deve se recuperar e puxar a demanda industrial, acredita o secretário.
Serrano e Summa, porém, não alimentam a mesma convicção. Desonerações e redução de custos tendem a não ter efeito nenhum sobre as decisões de investimento, a não ser que a empresa esteja à beira da falência. Para a grande maioria, porém, as recentes medidas do governo servirão para as empresas aumentarem as margens de lucro.
Sobre a inflação, as opiniões dos dois economistas e do secretário convergem. Os autores argumentam que, a despeito da forte queda na expansão da demanda e do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2010 e 2011, a inflação aumentou de um ano para outro por efeito dos preços das commodities e do câmbio.
"A aceleração da inflação no fim de 2010 e início de 2011 decorreu mais de fatores externos do que da demanda. Tanto que saímos de um crescimento de 7,5% em 2010 para um crescimento de 1,5% este ano e o IPCA não cai. Como vamos crescer abaixo do potencial, não há inflação de demanda", avalia Barbosa
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