Política
Celso Ming -A garfada do ICMS
O ESTADO DE S PAULO
A voracidade dos Estados está aprofundando o estatuto da substituição tributária na arrecadação do ICMS. E isso está provocando graves distorções.
Embora pareça, este não é um assunto complicado. Substituição tributária é um mecanismo que transfere a arrecadação de um imposto para o início da cadeia produtiva: em vez de cobrar na loja, cobra-se na indústria.
Um tormento dos governos estaduais é cobrar o ICMS no varejo, onde a sonegação é enorme.
Assim, a partir de 1989, em vez de cobrar o tributo no posto de gasolina, o Estado de São Paulo passou a cobrá-lo na refinaria de petróleo ou na usina de álcool. E, nos dois últimos anos, esse procedimento foi estendido a 23 setores, proporcionando, em plena crise, nada menos que R$ 3 bilhões de arrecadação adicional, em 12 meses, ou 4% a mais.
Para saber quanto cobrar de imposto no varejo, o Fisco estadual tem de arbitrar um preço. São incomensuráveis os casos em que a cobrança fica escorchante. Em qualquer liquidação, feirão de fim de semana ou promoção, os preços ao consumidor podem cair a menos da metade. Mas na indústria o imposto já foi recolhido na base dos 100%.
Para definir o preço, as Secretarias da Fazenda encomendam pesquisas de mercado, que sempre estão atrasadas e não levam em conta fatos novos ou fatores sazonais. Embora possa cair o dólar, afundar os preços das commodities - como tem ocorrido - ou na meia estação o setor têxtil tenha de liquidar linhas de verão, a derrubada do preço final não é vista pelo arrecadador.
Até junho, o Fisco paulista se comprometia a devolver o que cobrasse a mais. Mas deixou de fazê-lo com base em lei editada em dezembro. O coordenador de Administração Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, Otavio Fineis Junior, explica que essa lei veio para combater outros tipos de sonegação: muitos comerciantes manipulavam os preços para obter créditos mais altos. Por exemplo, no negócio com um carro novo, a concessionária atribuía valor menor ao carro zero e compensava a diferença no carro usado dado como entrada, que não leva ICMS. Outro caso: supermercados que tinham postos de gasolina baixavam os preços para alavancar as vendas e depois iam buscar ressarcimento.
Há dias, o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, denunciou outra distorção. A prática da substituição tributária pelos governos estaduais, revelou, impediu a queda dos preços dos aparelhos domésticos beneficiados pela redução do IPI, porque a cobrança do ICMS na indústria corroeu o capital de giro do setor.
Distorções desses e de outros tipos estão levando o comércio a a recorrer à Justiça. Mas a briga judicial será complicada, pois o artigo 150 da Constituição define que o governo só é obrigado ao ressarcimento se a venda não ocorrer (ausência do "fato gerador presumido"). Nos casos de preço mais baixo, a devolução depende de legislação estadual.
O advogado Ives Gandra Martins explica que, do ponto de vista do Fisco, nada é melhor do que a substituição tributária. Há mais fiscalização e a mordida do imposto pode mudar a qualquer hora. Mas adverte que o contribuinte sai prejudicado: "Ele é obrigado a se autofinanciar em ambiente de crise para antecipar o imposto, em vez de pagá-lo quando estivesse recebendo", diz.
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