Sempre que as estatísticas mostram um baque nas exportações, como em 2009, o governo Lula desfila declarações de intenção de que passará a dar prioridade às exportações. Mas, na prática, faz o contrário.
No início de dezembro, o presidente Lula disse que se surpreendeu ao incentivar tanto a demanda interna: "Jamais pensei que eu ia para a TV fazer apologia do consumo. Na juventude, eu era contra a sociedade consumista" (7 de dezembro).
Talvez o presidente se surpreenda ainda mais se alguém lhe disser que seu governo não sabe o que quer: não sabe se estimula o consumo interno ou se estimula as exportações.
A primeira reação será dizer que não há contradição nisso. As políticas que incentivam o consumo interno favoreceriam também as exportações.
Mas não é assim. O dólar mais baixo, por exemplo, aumenta o salário real interno, barateia as importações, empurra o trabalhador às compras e desestimula as exportações. Mais brasileiros comprando, por sua vez, deixa menos sobras para a exportação. Isto é, mais consumo reduz o excedente exportável.
O governo Lula estimula o consumo de muitas formas: por meio da desoneração fiscal (redução de impostos), pelo incentivo ao crédito e, sobretudo, pela disparada das despesas públicas (de 17% em 2009, num cenário de quebra de arrecadação de 4%).
Essa disparada contempla mais os fatores de renda do que o investimento, porque dá prioridade à expansão do quadro dos funcionários públicos federais, que ganham dez vezes mais que os do setor privado, e ao aumento dos gastos com aposentadoria.
O impulso inicial da redução de impostos teve por objetivo enfrentar a crise e, dessa forma, pode ser considerada parte de uma política anticíclica. Mas, de uns meses para cá, não faz mais sentido dizer que é preciso reforçar a política anticrise. Na verdade, essa desoneração atende a nítidos objetivos político-eleitorais.
O governo não se mostra nem um pouco interessado em desonerar as exportações nem de impostos, nem de encargos trabalhistas, nem do excesso de burocracia. Só agora começa a montar linhas de crédito para garantir financiamento ao comprador de produtos brasileiros dentro da filosofia do Eximbank e, ainda assim, com recursos limitados a R$ 10 bilhões. Nem os créditos da Lei Kandir chegam aos exportadores. O governo Lula passou sete anos do seu mandato (e certamente completará os oito) sem desenvolver um esforço consistente para fechar acordos comerciais que aumentassem o mercado externo para o Brasil. E a permissividade com que trata as lambanças comerciais dos vizinhos, especialmente as da Argentina, mostra que os interesses do exportador passam longe do Palácio do Planalto.
Toda a máquina industrial do País está voltada a atender preferencialmente à demanda interna. A indústria de ponta é de capital estrangeiro, cujos investimentos visam também a aumentar a capacidade de produzir para o mercado interno. E, ao canalizar capitais para o Brasil, contribui para a valorização do real, que incentiva ainda mais o consumo.
Não há nada de especialmente errado nisso, desde que a arrumação da economia e a política que a apoia sejam consistentes. Mas não venha o governo dizer que é um campeão na estimulação do exportador brasileiro.
Confira
Escada abaixo - Depois de ter atingido o preço recorde de US$ 1.226 por onça-troy (28,349 gramas), no dia 2 de dezembro, o ouro perfaz agora o caminho de volta. De lá para cá, as cotações caíram 8,8%. Ontem, fecharam a US$ 1.118,60. Apenas a expectativa de que dentro de alguns meses o Fed (banco central americano) comece a puxar pelos juros pode derrubar ainda mais os preços.
Falta pouco - O pico histórico do Índice Bovespa aconteceu em 20 de maio de 2008: 73.833,6 pontos. A partir do fechamento de ontem, 70.239,8 pontos, uma alta de apenas 5,12% já seria suficiente para quebrar o recorde anterior