Política
Cenário atual Miriam Leitão
O GLOBO
A crise se espalha de forma diferente pela economia. A venda de caminhões está 20% menor. Mesmo com a redução do IPI, os brasileiros estão comprando 69 mil carros a menos por mês. O setor de computadores acha que venderá as mesmas 12 milhões de unidades, interrompendo o crescimento de 20% ao ano. Os supermercados achavam que ficariam no empate, mas desistiram de fazer previsão.
A situação está mudando muito. Alguns setores continuam com previsões mais otimistas, porque foram os mais dinâmicos nos últimos anos; outros despencaram; outros precisam exagerar as previsões de queda para fortalecer o lobby junto ao governo por ajuda.
Produtos cujas vendas cresceram muito nos últimos anos não têm previsões de queda. Mas não crescer já é um mau resultado. O mercado de computadores no Brasil só fez crescer durante mais de uma década. Os brasileiros compravam 650 mil computadores por ano no primeiro ano do governo Fernando Henrique. No último, compravam 3,3 milhões de computadores. Este número caiu para 3,06 milhões em 2003 e, aí, começou o enorme boom. No ano passado, os brasileiros compraram 12 milhões de computadores. Para 2009, a previsão da Abinee é de que as vendas não vão subir, nem cair, mas mudará o mix: vai cair a venda de desktop e aumentar a de notebooks, e o setor vai fechar nas mesmas 12 milhões de unidades.
Os brasileiros compraram 9,2 mil caminhões em novembro de 2008 e, em fevereiro deste ano, 6,4 mil. No primeiro bimestre, as vendas foram 20% menores que no primeiro bimestre do ano passado. Em veículos leves, o tombo do pico ao ponto mais baixo foi enorme. Em julho, foram vendidos 288 mil veículos. O melhor mês. Em novembro, foram 178 mil. A redução foi de 110 mil veículos. Mas julho tinha sido excepcional. Melhor ficar com o número de setembro, quando foram vendidos 269 mil carros. Depois de cair em outubro e novembro, o governo acudiu o setor com a redução de IPI. Melhorou, mas ainda está vendendo 69 mil veículos a menos do que em setembro.
Um setor que sempre foi dinâmico, e que cresce todos os trimestres desde o começo dos anos 90, é o de celular. Agora, está crescendo menos. Pegando só o número de acessos, o Brasil terminou 2008 com 150,6 milhões de acessos. Para se ter uma ideia do dinamismo do setor, em 1999 o país tinha 15 milhões de acessos. Multiplicou por dez neste período. Em fevereiro deste ano, segundo a Anatel, o Brasil tinha 152,3 milhões de acessos. Em novas linhas, foram 1,7 milhão no primeiro bimestre deste ano - sendo 415,9 mil em fevereiro -, contra 3,1 milhões no mesmo período do ano passado. A produção de aparelhos, que acompanhou a expansão do setor de telefonia móvel, está agora com estoques. Há estoques de aparelhos também nas operadoras e a indústria quer esperar março acabar, para só então arriscar as previsões para este ano.
Nos supermercados, a situação está confusa ainda. O presidente da Abras, Sussumu Honda, disse a Leonardo Zanelli, da coluna, que até o ano passado o setor vinha crescendo sempre acima do PIB. Agora não sabe o que vai acontecer. No começo do ano, as previsões eram de um crescimento de 2% a 2,5%, mas eles preferiram suspender até junho qualquer previsão. Alimentos continuam vendendo por serem sempre os últimos itens a saírem de qualquer lista de compras e porque a queda dos preços das commodities provocou deflação em alguns preços. Mas perecíveis, ele admite, é o segmento que está sentindo mais. A esperança dos supermercados é o volume de dinheiro que vem para a economia com o aumento do salário mínimo. Na indústria de alimentos, os laticínios estão com queda na produção, mas outros setores, como chocolates, conservas vegetais, massas e temperos, registram alta neste início de ano.
Em algumas áreas a crise parece aguda. As siderúrgicas estão com vários fornos parados. Uma delas, de cinco, está com três desligados. Um desastre completo. Isso pelo fenômeno que já comentei aqui na coluna: o setor vinha crescendo muito, acelerou a produção, não previu a crise. As compras de bens finais caíram, os distribuidores estavam estocados e a maior parte da demanda atual por aço está sendo atendida pelos distribuidores. A siderurgia teve que cortar drasticamente a produção até o fim da desova dos estoques. A indústria, de forma geral, está com uma utilização da capacidade instalada em níveis piores que em 2003, que foi um ano recessivo.
Os exportadores venderão menos, a preços menores, e com crédito mais curto e mais caro. O Banco Central está usando as reservas para financiá-los. Mas, segundo Roberto Giannetti da Fonseca, os bancos, que pegaram essas reservas, subiram os juros nas linhas de financiamento e encurtaram os ACCs de 180 para 60 dias. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) está prevendo que o saldo comercial ficará em R$17 bilhões, dos R$29 bilhões atuais. Mas a exportação vai cair 20%. Só que, de novo, com várias diferenças. Commodities metálicas com preços bem menores. O alumínio chega a estar com um preço 50% menor. As commodities agrícolas sofrerão menos, porque as vendas vão continuar. Mas os produtos que não são cotados em bolsa, mas negociados no mercado físico, tiveram quedas maiores. A carne, por exemplo, teve uma queda de 35%.
Quem conversa com as empresas e setores percebe que a marca desta crise é mesmo a imprevisibilidade.
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