O Estado de S. Paulo - 22/08/2012 |
No mesmo dia em que recusaram a proposta de reajuste salarial de 15,8% oferecida pelo governo e anunciaram uma nova onda de paralisações nos mais variados setores da administração pública, as lideranças sindicais do funcionalismo federal reclamaram da reação do Palácio do Planalto, que obrigou Ministérios, autarquias e fundações federais a cortarem o ponto dos servidores em greve. A determinação foi dada na segunda quinzena de junho, quando as primeiras categorias do funcionalismo federal cruzaram os braços. Mas, acostumados ao tratamento leniente que lhes era dispensado na época do governo Lula, os sindicatos do funcionalismo subestimaram a presidente Dilma Rousseff, estimularam outras categorias a entrar em greve, no mês de julho, e não acreditaram que a ordem para o corte integral do ponto era para valer. O resultado é que, no último dia de pagamento, milhares de servidores tiveram descontados todos os dias não trabalhados em julho. Nas contas do Ministério do Planejamento, o número de servidores que tiveram o holerite quase zerado ficou em torno de 70 mil a 80 mil. Nos cálculos da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), 300 mil funcionários públicos tiveram corte integral dos salários. Inconformados, eles impetraram ontem uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), exigindo seus "direitos". Os grevistas, indignados, acusam o governo de descumprir um pacto informal firmado com governos anteriores e que até agora era desconhecido pela sociedade. Pelo acordo, quando os servidores públicos fazem greves de longa duração, o governo desconta, no máximo, sete dias não trabalhados. Com isso, as autoridades governamentais podem passar para a opinião pública a imagem de que foram duras, e os grevistas não sofrem prejuízos. "O que vamos contestar na Justiça é o corte integral. Queremos negociar o ponto, mas o mínimo que o governo tem de manter é o que vinha fazendo nos anos anteriores", diz o secretário-geral da Condsef, Josemilton Costa, como se a greve sem desconto dos dias não trabalhados fosse direito adquirido. Tão absurdas quanto a pretensão de exigir nos tribunais o cumprimento de um acordo - se é que se pode dar esse nome a um arranjo imoral e ilegal - são as justificativas dos líderes sindicais do funcionalismo. Se não receberem por todos os dias que deixaram de trabalhar, afirmam eles, os servidores não terão como pagar aluguel e condomínio, fazer as compras do mês e até pagar pensão alimentícia. "Isso dá cadeia", diz Costa, esquecendo-se dos efeitos nocivos causados para toda a sociedade pela chantagem praticada por servidores grevistas, para tentar obter reajustes salariais que o País não tem condições de pagar. Por causa das operações-padrão realizadas por servidores da Polícia Federal, Receita Federal e Agência Nacional de Vigilância Sanitária, navios não puderam carregar ou descarregar mercadorias. Como decorrência, pacientes ficaram sem remédios de uso continuado que não são fabricados no País e empresas ficaram sem insumos para produzir. Cidadãos tiveram negado o direito de ir e vir, por causa da suspensão da emissão de passaportes, dos congestionamentos nos aeroportos e do bloqueio das estradas. E o atraso na liberação de produtos de exportação prejudicou as empresas num momento em que, por causa da crise, é cada vez mais difícil exportar. A Associação de Comércio Exterior do Brasil estima em US$ 12 milhões por dia a perda financeira das empresas, somente com armazenagem. Quando alegam que os grevistas que tiveram o ponto cortado não poderão pagar aluguel, supermercado e pensões alimentares, por causa do corte integral do ponto, as lideranças sindicais do funcionalismo dão a dimensão de seu cinismo. São as mesmas lideranças que, depois de terem desacatado a proibição de realização de operações-padrão determinada na semana passada pelo STJ, agora batem nas portas do STF, reclamando do corte do ponto - o que é previsto por lei - e acusando o governo de tentar negociar "pondo a faca no pescoço". |