Companheiros Luiz Garcia
Política

Companheiros Luiz Garcia


O Globo - 17/07/2009
 

 

Os ingleses costumam dizer, há séculos, que a política cria estranhos companheiros de cama: "strange bedfellows". É expressão inocente de qualquer conotação libidinosa. Uma tradução bastante correta seria "companheiros de viagem". 

De viagem ou do que for, é notável o companheirismo declarado entre o presidente Lula e o senador Fernando Collor. Significa que Lula, espírito magnânimo e cheio de fé na capacidade de recuperação dos pecadores, despreza hoje tudo o que já soube e já sentiu em relação ao alagoano. 

Esqueceu, por exemplo, que o aliado de hoje botou a economia brasileira de pernas para o ar com um plano econômico que nem a sua ministra da Fazenda, a hoje sumida Zélia Cardoso de Mello, parecia entender direito. Também lhe fugiu da memória o detalhe de que Collor sofreu impeachment do Congresso - provocado por acusações de corrupção em larga escala - e teve de renunciar para não ser deposto. 

O Supremo Tribunal Federal condenou Collor à perda dos direitos políticos por oito anos, tempo que ele passou num doce exílio em Miami. Tudo isso faz parte de um passado que, pelo visto, não deixou mossa na memória de Lula. Nem amargura, nem pé-atrás. Uma foto na primeira página do GLOBO de quarta-feira mostra o par de "strange bedfellows" em abraço caloroso e sorridente. 

Disse Lula, textualmente: "Quero aqui fazer justiça ao comportamento do senador Collor e do senador Renan que têm dado sustentação muito grande aos trabalhos do governo no Senado." Para ele, a sua amizade com os dois alagoanos é o oposto do que sempre se viu no Brasil, algo que Lula definiu como "a política da camaradagem, dos amigos... o Brasil sofria o desmazelo dos eleitos." 

Até parece que Collor e Renan, um do PTB, outro do PMDB, seriam de partidos adversários do governo. É preciso contar isso aos petebistas e peemedebistas. Muitos ficarão espantadíssimos; diversos, até magoados. 

Para o eleitor distante, os políticos escolhem como quiserem os companheiros de eleição e de gestão. Mas cada aliado não leva consigo apenas sua ajuda e sua fidelidade: carrega nas costas também sua biografia, que pode incluir, com peso negativo, capítulos sujos desacompanhados de arrependimento. 

Lula aceita e celebra publicamente a adesão de homens como Collor e Renan. Mas, junto com os contingentes eleitorais que os dois oferecem, vai também a biografia de cada um, com todas as virtudes e todos os pecados desacompanhados de arrependimento.




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