Cresce pressão para governo conter a valorização do real Valor Econômico -Editorial
Política

Cresce pressão para governo conter a valorização do real Valor Econômico -Editorial


17/09/2010



O exemplo do Japão jogou mais lenha na fogueira da discussão a respeito da valorização do real. Pela primeira vez em seis anos, o governo japonês interveio fortemente no câmbio nesta semana. A venda de 1 trilhão de ienes fez a moeda cair 3%, depois de atingir a maior cotação em 15 anos.

A ação unilateral recebeu críticas generalizadas dos Estados Unidos e da União Europeia porque enfraquece as tentativas de se pressionar a China para abandonar a política de câmbio deprimido. A realidade é que um câmbio depreciado turbina as exportações e ajuda na recuperação econômica.

A desvalorização do dólar, em consequência do enfraquecimento da economia americana e dos juros perto do zero, é uma dificuldade extra.

Mercados emergentes cuja economia estão em melhor situação, que têm câmbio flutuante, juros elevados, como o Brasil, estão sendo particularmente afetados porque recebem um fluxo intenso de capital, o que acentua a apreciação cambial.

Mas o arsenal de instrumentos do Brasil para enfrentar o problema é limitado, dentro das regras atuais de câmbio flutuante, com mínimas intervenções. A principal delas é a compra da moeda americana. Desde maio de 2009, o Banco Central (BC) compra dólares no mercado com o objetivo oficial de apenas absorver os excedentes, sem interferir na cotação. Foram enxugados US$ 24,038 bilhões no ano passado; e US$ 19,42 bilhões neste ano até 10 de setembro.

A atuação do BC vem mantendo o real praticamente estabilizado, embora em níveis históricos elevados. Em setembro, porém, o início da venda de ações da Petrobras fez o real subir 2,4% até agora, com a expectativa de grande ingresso de capital externo para a compra dos papéis. Nos dez primeiros dias de setembro, o BC chegou a realizar dois leilões diários de compra de dólares para segurar a cotação da moeda americana e foram adquiridos US$ 815 milhões.

O resultado foi pífio. Calcula-se que 20% a 30% dos R$ 128 bilhões obtidos com a venda das ações virão do exterior, o que significa a entrada de US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões.

Na contramão, o Tesouro foi ao mercado internacional e captou US$ 550 milhões com a venda de títulos. Mas isso é até pouco quando comparado com o fluxo de recursos de outras fontes. Nos dez primeiros dias de setembro, o saldo do fluxo cambial ficou positivo em US$ 2,114 bilhões. O número vai aumentar consideravelmente nos próximos dias com o início da reservas de ações da Petrobras.

A política de compra de dólares tem contraindicações. Uma delas é o custo de esterilizar os reais injetados na economia. O enxugamento do dinheiro custa o equivalente à taxa básica Selic, atualmente em 10,75%, bem mais do que os juros obtidos na aplicação das reservas no mercado internacional.

Outro problema é incentivar os bancos que estão apostando na valorização do real. As posições vendidas em dólar dos bancos estão ao redor de US$ 13 bilhões, quase seis vezes mais do que os US$ 2,983 bilhões de abril, quando os bancos começaram a se posicionar contra o BC. Há ainda posições vendidas no mercado futuro ao redor de US$ 12 bilhões.

Por isso, foi fugaz o impacto no mercado das declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que afirmou que o governo tem "cacife" para comprar dólares. Mantega disse que o governo tem condições de neutralizar o impacto da capitalização da Petrobras no mercado de câmbio com os R$ 16 bilhões que o Fundo Soberano possui em carteira e também com recursos ilimitados provenientes do Tesouro. Mais simples, porém, será fechar o câmbio da venda das ações da Petrobras fora do mercado. É o que o BC costuma fazer com grandes operações, como a da venda dos papéis do Santander em 2009. Essas operações fora de mercado não afetam a cotação e os recursos vão diretamente para as reservas.

A Fazenda não esconde que estuda outras alternativas como as operações de "swap" reverso, que equivalem à compra de dólares no mercado futuro. Outra alternativa seria inibir as posições vendidas de câmbio dos bancos, possivelmente com maiores exigências de capital para bancar esse tipo de negócio.

A realidade é que o governo vem usando o arsenal de medidas para conter o câmbio com parcimônia, quando comparado com as práticas internacionais. Ao menos até o fechamento da capitalização da Petrobras e as eleições, nada drástico deverá ocorrer.



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