Olhando à frente, o x da questão econômica é a recuperação da taxa de investimento do Brasil, ou seja, da proporção dos investimentos nos gastos globais, que têm caído sistematicamente desde os anos setenta, e, com ela, a taxa de crescimento do PIB, em forte contraste com o desempenho dos tigres asiáticos e da China. Houve alguma recuperação na fase de bonança 2002-2008, mas a crise internacional recolocou o tema de volta na ordem do dia. Depois, em breve haverá um novo governo no país, e esse é um tema prioritário em qualquer campanha eleitoral. Em suma, depois de tantos anos de secura, o que fazer para o Brasil voltar a crescer de forma sustentada acima da média mundial? Do lado dos investimentos privados (onde, para os fins deste artigo, inclui-se a Petrobras), a principal restrição ao crescimento não seria a escassez de poupança interna, notória no Brasil, para financiálos (o que não quer dizer que um maior esforço de poupança não ajudaria). Numa economia emergente fortemente integrada com o exterior, a parcela da taxa de investimento relativa ao setor privado depende, basicamente, de estímulos econômicos e de que o governo remova vários entraves que inibem a sua expansão.
E m q u e p e s e e s s e s obstáculos, e diante da inundação de recursos oriundos do exterior na recente fase de bonança, houve forte queda das taxas de juros, ao lado da apreciação cambial e da queda das taxas do Risco Brasil. Em resposta, os investimentos privados cresceram mais que o PIB, e houve forte ingresso de poupança externa.
Já no tocante aos investimentos públicos, o problema da escassez de poupança interna se revela com toda a força, e tem de ser equacionado.
Diante de muitos anos sem prioridade aos investimentos públicos, o mínimo que é preciso investir em áreas não atrativas para a inversão privada é muito expressivo.
Isso vale particularmente para vários segmentos do setor de infraestrutura de transportes, embora não faça sentido para setores como o de mineração, por exemplo.
Sem esses investimentos, os custos aumentam e a economia cresce menos. Sem eles, os gargalos tenderão a se multiplicar e o c a o s q u e s e v ê i n s t a l a d o , p o r exemplo, em todas as modalidades da área de transportes tende a se perpetuar. (As pesquisas rodoviárias da CNT — Confederação Nacional dos Transportes — têm mostrado que o parque rodoviário brasileiro deve ser um dos piores do mundo ocidental.) Do outro lado, a União instituiu as parcerias público-privadas, mas não parece querer implementálas (além de abandonar o esforço de desestatização), “bate cabeças” na área de concessões, e em todas as esferas do setor público brasileiro é baixa a parcela das receitas que é poupada. Finalmente, diante da herança de vários anos de crise fiscal, é também muito baixa sua capacidade de endividamento.
Não há, assim, como fugir do aumento da taxa de poupança pública. Mas isso não é tudo. Especialmente na área federal, o setor público precisa recuperar o mais rapidamente possível suas capacidades de planejamento e gestão, c o m p l e t a m e n t e d e s t r u í d a s e m muitos anos de encolhimento e abandono dos investimentos públicos.
O governo custou a acordar para o óbvio, mas os entraves criados pela ação do Tribunal de Contas da União no andamento dos investimentos federais em parte se devem à ocupação de espaço na administração pública federal por outro poder que se cansou de ver o descaso com que o assunto era tratado.
Como podem faltar recursos públicos para investimento se a carga tributária brasileira é uma das maiores do mundo? Pela opção política de transformar o orçamento da União em uma grande folha d e p a g a m e n t o s , o u um verdadeiro repositório de transferências a pessoas e outros gastos correntes, algo que deveria ser rediscutido. Não dá para aceitar passivamente a hipótese citada por Samuel Pessôa em sua instigante entrevista no Estadão (dia 2/11, p.B3) de que a sociedade brasileira, relativamente ao PIB, quer consumir muito acima da média mundial, e ponto final. Portanto, a única saída é atrair recursos de fora. Primeiro, porque o país fica sem opções próprias de política de crescimento econômico. Segundo, porque internar recursos externos de monta significa apreciar significativamente a taxa de câmbio, o que, curiosamente, os defensores do consumo exacerbado também desaprovam. E, terceiro, porque, se o setor público está em má situação financeira (a não ser que conte com o dinheiro do pré-sal já nos bolsos), e ainda tem de fazer muito investimento, não há como substituir poupança pública por dinheiro externo.
A União paga mais de quarenta milhões de algum tipo de contracheque, e consome com isso R$ 378 bilhões ou 76% do seu gasto total. Outro problema é a extrema rigidez desses gastos e a discutível relevância de uma parcela deles.
Esse modelo, oriundo da Constituição de 1988, é claramente incompatível com uma taxa de crescimento mais alta da economia e da oferta de empregos para os cidadãos que acorrem todos os dias aos milhares no truncado mercado de trabalho brasileiro.
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