Durante seis anos, entre 2007 e 2013, 30 operadores financeiros vinculados a 15 dos maiores bancos globais manipularam um dos principais indicadores econômicos do Brasil — a taxa de câmbio, preço-chave para investimentos e comércio exterior. Eles fizeram acordos para influenciar cotações do real, dólar e outras moedas. Dividiam-se em dois grupos no sistema de chat da agência Bloomberg: um autodenominava-se “A Máfia”, outro identificava-se como “O Cartel”.
Flagradas nos EUA, as casas bancárias acabaram multadas em US$ 5,6 bilhões. Em junho uma delas foi à Procuradoria, em São Paulo. Fez acordos de leniência e delação premiada.
O caso foi repassado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que viu nas provas recebidas “fortes indícios de condutas anticompetitivas” e “de infração à ordem econômica”. O processo avança sob sigilo.
O Cade lista 11 protagonistas da manipulação de cotações da moeda brasileira: Banco Standard de Investimentos, Barclays, Citigroup, Deutsche Bank, HSBC, Merrill Lynch, Morgan Stanley, Nomura, Royal Bank of Canada, Standard Chartered e UBS.
Atribui a oito as maquinações com moedas estrangeiras: Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Barclays, Citigroup, Credit Suisse, HSBC, JP Morgan Chase, Royal Bank of Scotland e UBS.
Indicia por conspiração, via chat, os operadores Alexandre Gertel Nogueira, Sergio Correia Zanini, Alexandre Santos, Christoph Durst, Christopher Ashton, Colin Devereux, Daniel Evans, Daniel Yuzo Shimada Kajiya, Eduardo Hargreaves, Fábio Ramalho, Felipe Leitão, Fernando Pais, Frank Cahill, James Witt, James Wynne, John Erratt, José Aloisio Teles Jr., Marco Christen, Mark Clark, Martin Tschachtli, Matthew J. Gardiner, Michael Weston, Niall O’Riordan, Pablo Frisanco Oliveira, Paul Nash, Renato Lustosa Giffoni, Ralf Klonowski, Richard Gibbons, Richard Usher e Rohan Ramchandani.
Segundo o Cade, eles fizeram acordos para fixar a diferença (spread) entre o valor de compra e venda de moedas, potencializando lucros dos bancos e os prejuízos dos clientes. Combinaram cotações falsas e negociaram moedas a preços específicos, cartelizados. Atuaram para bloquear outros operadores (brokers) no mercado de câmbio do Brasil, concorrentes ou que se recusaram a aceitar influência. Compartilharam informações sobre os negócios de clientes, incluindo contratos, fluxo de recursos, ordens de negociação, preços, posições confidenciais, estratégias e objetivos.
Coordenaram, também, operações prévias às colheitas de safras agrícolas, para influenciar os índices de referência num “movimento de mercado”, alterando as cotações dos produtos.
A federação dos bancos alega que a taxa de câmbio (PTax) é apurada e divulgada pelo BC a partir de informações de mais de 180 instituições num mercado com movimentação média de US$ 6 bilhões por dia, “o que torna praticamente impossível sua manipulação”.
Exportadores que se sentem prejudicados vislumbraram manobra governamental para esvaziar a investigação. Recorreram ao senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que levou o caso ao Senado. Não se conhece, ainda, a extensão dos danos às empresas e pessoas físicas no Brasil. É certo, porém, que o cartel e a máfia causaram perdas bilionárias.