Nas favelas, no senado/ Sujeira pra todo lado/ Ninguém respeita a constituição/ Mas todos acreditam no futuro da nação /Que país é esse?
Embora tenham sido feitas na década de 80, em um outro momento político e social, essas –e muitas outras – canções da Legião Urbana soam como atuais. E, por isso, elas ainda despertam interesse nas gerações atuais. Não é a toa que os discos da banda – que nunca saíram de catálogo- vendem cerca de 250 mil cópias por ano.
Por isso, é preciso se comemorar a iniciativa da gravadora EMI em (re-)colocar nas lojas, no próximo dia 25 de outubro, os oito álbuns de carreira da banda (discos de estúdio) em três formatos diferentes: digipak, caixa de luxo e vinil. São eles Legião Urbana (1984), Dois (1986), Que País é este (1987), As Quatro Estações (1989), V (1991), Descobrimento do Brasil (1993), A Tempestade (1996) e Uma Outra Estação (1997). As novas edições ainda trazem mais de 80 fotos inéditas e textos escritos exclusivamente para esses lançamentos.
A opção pelos três formatos – essa é a primeira vez que toda a discografia de uma banda nacional está disponível dessa forma, ao mesmo tempo – é uma grande sacada. O digipak – aquele formato que lembra as capas dos antigos LP – agrada quem ainda tem o hábito de comprar CD e, quase sempre, podem ser encontradas em preços mais convidativos. Os da Legião vão custar R$ 29, 90, preço sugerido pela gravadora, e podem ser comprados separadamente. Eles também podem ser adquiridos juntos no box que a gravadora chama de “caixa de luxo” por R$ 350.
Mas o grande charme desses relançamentos são os LPs – formato que tem ganhado cada vez mais adeptos. Além de trazer mais fotos, remetem à emoção (para quem viveu isso, claro) de ter nas mãos o disco de sua banda preferida. Claro, hoje em dia você pode ter um CD nas mãos, mas o LP é diferente!
Vale lembrar também que essa é a primeira vez que Uma Outra Estação e A Tempestade, lançados já na era do CD – saem em long play.
Em cada álbum, Christiana Fuscaldo, responsável pelos textos, conta histórias dos bastidores das gravações e ressalta declarações da trupe que ajudam a ilustrar cada momento. Em Dois, de 1986, ela ressalta a inquietude de Renato, destacando a seguinte declaração do poeta: “Ao passo que estamos nos distanciando do referencial externo – governo, política, estado, poluição – neste segundo a gente está superinteriorizando. Não temos mais músicas como Soldado e O Reggae, porque a gente já falou daquilo ali. Não vou ficar a vida inteira falando da escola, agora estamos falando do relacionamento emocional e afetivo das pessoas. No primeiro disco, a gente teve que bater na porta com muita força. Com o segundo, a gente pode falar as coisas sem precisar ficar gritando, porque a porta já está aberta”.
Embora a Legião tenha sido cercada por algumas histórias de brigas envolvendo seus integrantes (e qual banda não briga?), Dado revela, no texto que acompanha o CD Que país é este, que o ambiente de gravação tinha momentos bastante agradáveis, como quando a banda jogava vôlei dentro do estúdio. “Fazíamos uma quadra com fita crepe e três rebatedores, cada um com uma janelinha. Usávamos uma bola dente de leite. Enquanto o pessoal estava mixando o disco no aquário, o campeonato comia solto. Fazia fila no corredor par jogar”.
Os textos também revelam momentos pessoais dos integrantes da Legião. No encarte de O Descobrimento do Brasil, sexto álbum da banda, está escrito: “A Legião Urbana entrou numa nova fase. Com Renato Russo “tratado” (das drogas) (…) e todo mundo mais otimista, a banda estava se redescobrindo. (…) Muito dos dramas foram celebrados nas letras. Em Vinte e Nove, por exemplo, ele cita seu problema com o álcool: “Me embriaguei morrendo vinte e nove vezes”. E “Só por hoje” remete ao famoso lema dos Alcoólicos Anônimos, frequentado por Renato”
Talvez os fãs tentem imaginar o que seria o Renato ou o que seria a Legião nos dias atuais. Mas isso não é importante. O mais valoroso é que a obra da banda ainda ecoa com verdade e atinge em cheio as novas gerações.
(Danilo Casaletti)"