Na década de 60 chegaram ao Brasil algumas teorias nem sempre bem entendidas e bem aplicadas. O "é proibido proibir", junto com uma espécie de vale-tudo. Alguns psicólogos e educadores nos disseram que não devíamos censurar nem limitar nossas crianças: elas ficariam traumatizadas. Tudo passava a ser permitido, achávamos graça das piores más-criações como se fossem sinal de inteligência ou personalidade. "Meu filho tem uma personalidade forte" queria dizer: "É mal-educado, grosseiro, não consigo lidar com ele". Resultado, crianças e adolescentes insuportáveis, pais confusos e professores atônitos: como controlar a má-criação dos que chegam às escolas, se uma censura séria por uma atitude grave pode provocar indignação e até processo de parte dos pais? Quem agora acharia graça seria eu, mas não é de rir.
Ilustração Atômica Studio |
Gente de bom senso advertiu, muitos ignoraram, mas os pais que não entraram nessa mantiveram famílias em que reina um convívio afetuoso com respeito, civilidade e bom humor. Negar a necessidade de ordem e disciplina promove hostilidade, grosseria e angústia. Os pais, por mais moderninhos que sejam, no fundo sabem que algo vai mal. Quem dá forma ao mundo ainda informe de uma criança e um pré-adolescente são os adultos. Se eles se guiarem por receitas negativas de como educar – possivelmente não educando –, a agres-sividade e a inquietação dos filhos crescerão mais e mais, na medida em que eles se sentirem desprotegidos e desamados, porque ninguém se importa em lhes dar limites. Falta de limites, acreditem, é sentida e funciona como desinteresse.
Um não é necessário na hora certa, e mais que isso: é saudável e prepara bem mais para a realidade da vida (que não é sempre gentil, mas dá muita porrada) do que a negligência de uma educação liberal demais, que é deseducação. Quem ama cuida, repito interminavelmente, porque acredito nisso. Cuidar dá trabalho, é responsabilidade, e nem sempre é agradável ou divertido. Pobres pais atormentados, pobres professores insultados, e colegas maltratados. Mas, sobretudo, pobres crianças e jovenzinhos malcriados, que vão demorar bem mais para encontrar seu lugar no grupo, na comunidade, na sociedade maior, e no vasto mundo.
Não acho graça nesse assunto. Meus anos de vida e vivência mostraram que a meninada, que faz na escola ou nas ruas e festas uma baderna que ultrapassa o divertimento natural ao seu desenvolvimento mental e emocional, geralmente vem de casas onde tudo vale. Onde os filhos mandam e os pais se encolhem, ou estão mais preocupados em ser jovenzinhos, fortões, divertidos ou gostosas do que em ser para os filhos de qualquer idade algo mais do que caras legais: aquela figura à qual, na hora do problema mais sério, os filhos podem recorrer porque nela vão encontrar segurança, proteção, ombro, colo, uma boa escuta e uma boa palavra.
Não precisamos muito mais do que isso para vir a ser jovens adultos produtivos, razoavelmente bem inseridos em nosso meio, com capacidade de trabalho, crescimento, convívio saudável e companheirismo e, mais que tudo, isso que vem faltando em famílias, escolas e salas de aula: uma visão esperançosa das coisas. Nesta época da correria, do barulho, da altíssima competitividade, da perplexidade com novos padrões – às vezes confusos depois de se terem quebrado os antigos, que em geral já não serviam –, temos muita agitação, mas precisamos de mais alegria.