Política
Mais que desemprego Celso Ming
O ESTADO DE S. PAULO
O desemprego é cruel porque solapa um dos mais importantes valores do homem: a dignidade. Dezenas de utopias e de arquiteturas sociais foram construídas ao longo dos séculos com o objetivo de imunizar a sociedade dessa praga. Especialmente na Europa Ocidental os governos trataram de prover seus países de mecanismos de contenção dos choques provocados pela falta de trabalho: seguro-desemprego, bolsa-alimentação, previdência social e por aí vai. Alguns observam que os resultados não são expressivos. Outro jeito de avaliá-los é levar em conta os enormes estragos econômicos, sociais e principalmente políticos que sobreviriam se toda essa estrutura de seguridade social não tivesse sido montada. Ontem, a Eurostat, o organismo da União Europeia encarregado da elaboração de estatísticas econômicas, mostrou que, em abril, nada menos que 101 entre cada 1.000 cidadãos em atividade na área do euro (16 países) não conseguiram encontrar ocupação remunerada. É a pior situação em 12 anos. (Veja o gráfico.) Reduzir tudo a efeito natural da atual crise é simplismo. Flagelos assim são como os desastres de avião: sempre têm múltiplas causas. O crescente desemprego no mundo rico foi acentuado pela crise, mas é bem mais do que isso. É o resultado de algumas degradações acumuladas nas últimas décadas: perda de competitividade da indústria, rápido envelhecimento da população, custo elevado da mão de obra, falta de reformas políticas e econômicas. Paradoxalmente, a crise do desemprego tende a se acentuar pelos fatores que pretendiam atenuar seu impacto. Assim como a antecipação da aposentadoria pretendia abrir vagas aos mais jovens, mas tudo o que produziu foi a deterioração das finanças dos sistemas previdenciários, os mecanismos de seguro social vêm ajudando a criar enormes rombos, que, por sua vez, atiram as finanças públicas ao endividamento e à insolvência (e não apenas à falta de liquidez), como parece ser o caso da Grécia e talvez o de Portugal e Espanha. E aí chegamos a uma situação em que os instrumentos de defesa do emprego criam mais desemprego. A deterioração da credibilidade do euro é fator que, por si só, contribui para a redução do poder aquisitivo do trabalhador. Não falta quem aposte em que a moeda mais fraca será fator decisivo na virada do jogo, na medida em que proporciona a recuperação da competitividade do produto europeu. Mas essa faca não corta apenas desse lado. Também deteriora o patrimônio dos fundos de pensão e da poupança. Assim, sabota o futuro do trabalhador. As lideranças políticas europeias não conseguem sair do estado de perplexidade. Como aconteceu nos últimos seis meses, produziram foguetórios retóricos. E, quando tentaram ir além, como quando, em maio, instituíram um bolão de resgate avaliado em ? 750 bilhões (US$ 950 bilhões), não conseguiram convencer ninguém de que os recursos existem. Alguns vêm advertindo que falta liderança. O problema é que a falta de liderança transparece como sintoma de mal mais profundo: o de que o próprio sistema social-democrata com todo seu aparato de defesa econômica e social já não consegue fornecer respostas rápidas e, sobretudo, eficazes para a crise, seja qual for o nome usado para designá-la. Com força Os resultados da balança comercial nos cinco primeiros meses do ano desmentem as apostas dos mais pessimistas. Em 12 meses, as exportações cresceram a um ritmo de 28,7% ao ano. Nada mal para este tempo de crise. E a disparada das importações, de 42,5%, continua refletindo o forte consumo interno. Sem decepcionar Os produtos líderes do crescimento exportador são as commodities (minério de ferro, soja e petróleo). Mas não dá para desprezar o resultado apresentado pelos manufaturados: crescimento de 19,4%.
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