Política
Martha Medeiros na manhã de domingo
Coisa de adolescente Martha Medeiros
"Que insistência tola a nossa ao afirmar, cada vez que vivemos algo novo e excitante, que estamos em surto de adolescência. Isso sim é falta de maturidade Uma amiga minha, separada, com três filhos para criar e que já não esperava mais nada da vida, me conta que está trocando e-mails com um empresário charmoso, uma surpresa que caiu do céu de uma hora pra outra. Ela me diz com todas as letras: "Estou me sentindo uma adolescente!"
Numa cena de novela, outro dia, o mesmo texto: mulher recém-separada, mais de 50 anos, declarando-se apaixonada feito... feito o quê? Feito uma advogada, feito uma manicure, feito uma professora? Não, feito uma adolescente.
Qualquer pessoa que já se considere carta fora do baralho do amor, quando cruza com alguém que seguiu à risca os conselhos do "personal paquera" e recebe uma cantada, logo fica nostálgica e pensa: "ah, se fosse nos velhos tempos".
Velhos tempos?? Mas que autoboicote! Certa está Bia Kuhn, psicanalista amiga minha, que diz que o inconsciente não usa calendário: os desejos de ontem seguem pulsando anarquicamente dentro da gente, com a mesma intensidade em qualquer época da vida.
Agimos como se apenas os adolescentes tivessem o direito de vibrar. Como se adrenalina correndo nas veias fosse um direito exclusivo deles. Como se homens e mulheres maduros não pudessem se divertir, não pudessem azarar sem compromisso, não pudessem se presentear com instantes de total curtição. Quem declarou que isso é um desajuste?
Nós mesmos, quem mais.
Está na hora de reconhecermos que entusiasmo não é coisa de adolescente: é coisa de gente grande. Vou além: é coisa de gente velha, inclusive. Coisa de adolescente é depender de ajuda financeira dos pais, passar a madrugada bebendo cerveja nas calçadas, andar sempre em turma. E até isso não é propriedade privada deles. Mas entusiasmo, vibração, paixonite? Que insistência tola a nossa ao afirmar, cada vez que vivemos algo novo e excitante, que estamos em surto de adolescência. Isso sim é falta de maturidade. Os maduros de verdade sabem que estão sujeitos a vibrações aos 30, aos 40, aos 60 anos. Alguém está morto aí? Se estiver, não responda que tenho medo de fantasma.
Sei que é difícil mudar um hábito, mas vou tentar nunca mais dizer que um entusiasmo é "coisa de adolescente". É desrespeito com os adolescentes, porque dá a entender que tudo o que lhes acontece é frugal e sem consistência. E um desrespeito conosco: se a gente pensar que já viveu tudo o que tinha pra viver, que não há mais surpresas nem vertigens pela frente, que graça terá acordar amanhã de manhã?"
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