Maurren Maggi, ouro olímpico, desempregada
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Maurren Maggi, ouro olímpico, desempregada


VEJA

Nem ela tem lugar garantido

Lailson Santos
UM LEÃO POR DIA
Maurren Maggi: depois da medalha de ouro em Pequim, em busca de clube


Pouco mais de um ano depois de conquistar a medalha de ouro no salto em distância na Olimpíada de Pequim, Maurren Maggi encontra-se em situação igual à de vários atletas iniciantes no Brasil: está desempregada. O clube onde treinava, o Rede Atletismo, desistiu de investir em equipes adultas e não renovou o contrato com ela e com outros vinte atletas. Enquanto seu treinador, Nélio Moura, está à procura de um novo clube, Maurren, de 33 anos, se recupera de uma artroscopia no joelho direito. Na semana passada, ela recebeu o repórter Ronaldo Soares num resort em São Sebastião, onde descansava com a filha, Sophia, de 4 anos.

CAMPEÃ DESEMPREGADA
É inadmissível o que aconteceu comigo. O que se tem de melhor hoje no atletismo é a minha medalha, e o que eu posso fazer ainda pelo Brasil. Isso é ruim para um país que vai sediar uma Olimpíada. Mas creio que o desemprego seja uma situação momentânea, porque acredito muito no meu potencial e já há outros clubes interessados. É uma questão de tempo voltar a ter um clube. Eu não estaria descansando à beira-mar agora se não tivesse essa certeza. Estaria batendo de porta em porta.

PISTA ESBURACADA
Não há uma estrutura para o esporte em todo o país. Assim como há várias pessoas competentes e capazes no grupo em que eu treino, em São Paulo, tenho certeza de que existem muitos outros atletas capazes Brasil afora. Temos de buscar essas pessoas que estão por aí e brigar por uma estrutura melhor, para que as futuras gerações não tenham de passar pelo que a gente vem passando. A Keila Costa competia onde não tinha pista nem nada, era terra batida. Eu mesma não tinha uma pista de atletismo em São Carlos, treinava numa pista esburacada. No Ibirapuera, onde treinamos atualmente, a pista não está em boas condições, e vou continuar brigando para que ela seja reformada.

RIO 2016
Para sediar a Olimpíada, o Brasil precisa melhorar sua estrutura esportiva e adotar iniciativas de promoção do esporte já a partir do ano que vem. O atleta não pode começar a ser preparado um ano antes de uma Olimpíada. Será muito ruim para o Brasil se em 2016 algum atleta disser "eu cheguei até aqui, mas não tive as condições adequadas".

Adrian Dennis/AFP
SUPERAÇÃO
A contusão que a tirou do Mundial: retorno só em 2010


INTERCÂMBIO
O Brasil tem material humano de sobra. Uma coisa que poderia funcionar bem seria intensificar os campings, que são especializações feitas por treinadores menos tarimbados com treinadores já consagrados, como os de São Paulo. É uma troca de experiências, em que o treinador interessado passa o conhecimento adqui-rido para seus atletas Brasil afora. É uma forma de multiplicar o conhecimento no esporte. Cuba e Alemanha, por exemplo, funcionam assim, com polos irradiadores de saber esportivo.

AVANÇO DO DOPING NO BRASIL
Talvez tenham acontecido tantos casos neste ano porque o controle está mais rigoroso. No atletismo, há testes periódicos. Na semana passada, fiz um exame antidoping às 6h30. Estou com o joelho operado e sem competir, mas mesmo assim tive de fazer. A agência responsável pelo controle antidoping vem sem avisar previamente. Acho isso fantástico, é bom para o esporte. Os atletas que estão entre os cinquenta melhores do mundo podem ficar espertos, porque a qualquer dia vão bater à porta da casa deles e acordá-los para fazer o teste.

DAIANE DOS SANTOS
Prefiro não comentar o caso dela. É muito recente, não conversei com ela, só temos contato quando nos encontramos nas competições. O que sei é que a culpa é sempre do atleta. Ele é responsável por tudo o que encontram em seu organismo. Se você vai tomar um chá que alguém ofereceu, tem de estar ciente de que, se fizerem um exame, poderá dar positivo. E isso vai render dois anos de suspensão. Há casos de contaminação (doping involuntário), como o que aconteceu comigo, mas isso não exime ninguém de responsabilidade, mostra como o controle é rigoroso.

PRECAUÇÕES
Sou muito vaidosa. Não gosto de voltar a esse assunto, mas fui pega no doping por causa da minha vaidade. Estava fazendo uma sessão de depilação na virilha, passei uma pomada que não podia e deu nisso. Foi um descuido meu. Hoje em dia, o cuidado é tanto que até gloss e batom eu tenho de investigar para saber se têm substância proibida. Toda hora ligo para meu treinador, Nélio Moura, perguntando o que pode ou não. Meu maquiador é louco para botar um colírio nos meus olhos para deixá-los branquinhos nas fotos. Mas não tem jeito. Eu saio com olhos vermelhos mesmo. Não pode usar colírio, não pode tomar remédio. Estou me curando de uma gripe em que fiquei duas semanas tomando uma pastilha que era a única permitida, para não ter de usar anti-inflamatório.

FUNDO DO POÇO
Cheguei ao fundo do poço nos dois anos e meio em que fiquei fora do esporte por causa do doping. Fiquei sem chão. Num caso desses, você não tem mais cabeça, não há nada que possa ajudar. Mas de repente comecei a subir. Não subi devagar, subi para ser campeã pan-americana e campeã olímpica. A explicação para isso é minha filha, Sophia. Graças a ela encontrei forças para ser uma campeã olímpica. Lembro que, quando voltei para as pistas, eu olhava para o rostinho dela, ainda bebê, e me sentia motivada.

RITUAL DE PREPARAÇÃO
Da minha preparação sempre faz parte ouvir música e rezar antes de entrar na pista. Como sou muito vaidosa, também me preparo da melhor maneira possível no sentido estético. Uso batom, gloss e coloco a melhor roupa. Eu me acho linda quando vou entrar na pista. Olho-me no espelho e fico louca por mim. Digo para mim mesma: "Nossa, como você está gostosa. Maurren, você vai arrasar hoje".

A VIDA NA VILA OLÍMPICA
Numa vila olímpica, a concentração é total. Mas claro que rola uma paquerinha. Corpo bonito de homem e corpo bonito de mulher no mesmo lugar... Sou apaixonada pelo Roger Federer, ele é meu ídolo. Em Pequim, eu queria tirar foto com ele na vila olímpica, mas não quis atrapalhar a concentração. Queria poder falar para ele: "Olha, você tem a prata e eu tenho o ouro". O Federer não teve a oportunidade de me conhecer, de conhecer uma campeã olímpica.

MULHER INDEPENDENTE
Acho que o homem ainda tem um pouco de medo da mulher independente, que sobressai. Nesse sentido, a medalha pesa. Estou solteira ainda, mas por opção. Acho que o homem da minha vida ainda não apareceu.




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