O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, em encontro reservado ontem com um grupo de deputados, relatou a existência de uma espécie de consórcio formado por juízes e delegados que, no futuro, poderia agir como uma "milícia", abalando os alicerces da Justiça. Mendes, segundo afirmaram deputados ao Estado, disse que há casos em que o juiz, consorciado a delegados, passa a fazer a instrução do inquérito, colhendo provas, muitas vezes direcionando essa captação de provas, e depois julgando. O juiz, nesse esquema, acaba exercendo papel de polícia e se afasta de sua missão de julgar.
No entendimento de um dos parlamentares presentes no encontro, essa espécie de milícia jurídico-policial relatada por Mendes favorece o aparecimento dos "justiceiros", que se sentem acima da lei, e instauram um clima de terror. Mendes teria dito que o grupo possui comportamento paramilitar e parajurídico e que, no futuro, tornaria-se uma "milícia".
De acordo com deputados, Mendes comentou que as varas especializadas, como a de combate à lavagem de dinheiro, são mais suscetíveis ao aparecimento desse tipo de "consórcio" porque o convívio entre juiz e delegados é mais freqüente.
Outro deputado que estava no encontro entendeu que Mendes, ao usar o termo "milícia", referia-se a uma espécie de força-tarefa que acaba interferindo na atividade da Justiça porque alguns juízes se sentem com um aparato muito poderoso nas mãos. Segundo contaram deputados, o resultado de investigações pode acabar sem efeito por causa desse processo irregular conduzido pelo juiz.
A conversa com sete deputados da CPI dos Grampos e da Comissão de Segurança Pública foi reservada. Os parlamentares foram ao Supremo convidar Mendes para falar nas duas comissões sobre a escuta telefônica que gravou uma conversa dele com o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Mendes manifestou disposição em aceitar o convite, mas ressaltou que antes ouvirá a opinião dos ministros do STF.
Segundo deputados, Mendes afirmou que a suspeita de que suas conversas estariam sendo monitoradas vem desde o ano passado, na época da Operação Navalha, investigação de desvio de dinheiro de obras públicas deflagrada pela Polícia Federal. De acordo com os deputados, Mendes está indignado com o episódio do grampo porque atingiu a instituição.
Procurado pela reportagem, o presidente do STF afirmou que jamais mencionou a palavra milícia. Mendes reconheceu ter dito aos deputados que as varas que lidam com lavagem de dinheiro, da forma como funcionam hoje, podem provocar uma atuação conjunta entre juiz, procurador da República e delegado. Segundo ele, as atuações do juiz, do procurador e do delegado têm de ser separadas.
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