MERVAL PEREIRA - Crise interfere na política
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MERVAL PEREIRA - Crise interfere na política


É sintomática da mudança dos ventos políticos a decisão do Partido Socialista Brasileiro (PSB) de lançar a candidatura do deputado federal Ciro Gomes à Presidência, mesmo com o presidente Lula centrando todos os seus esforços na candidatura da ministra Dilma Rousseff, uma invenção tirada do fundo da cartola, já que o PT, especialmente por culpa dele, não tem nome de peso para disputar com naturalidade a sucessão presidencial. O PSB teme que a crise econômica enfraqueça a candidatura de Dilma e acha que Ciro, que já foi ministro da Fazenda no Plano Real, pode ser uma alternativa mais sólida.

Lula nunca foi um líder que deixasse crescer à sua sombra outras lideranças partidárias e quem tentou enfrentá-lo dentro do PT acabou morrendo politicamente, como foi o caso dos hoje senadores Cristovam Buarque e Eduardo Suplicy. Na eleição de 2002, os dois defenderam que Lula, depois de derrotado duas vezes por Fernando Henrique Cardoso no primeiro turno, não se apresentasse mais como candidato a presidente, dando lugar a outros políticos do PT. Suplicy chegou ao ponto de disputar com Lula prévias dentro do partido, sofrendo uma derrota formidável.

O lançamento de uma mulher para sua sucessão foi um golpe de mestre de Lula, que criou um fato político novo com uma ministra que não tem carreira política própria e, em tese, será uma fiel seguidora de suas orientações.

A popularidade excepcional de Lula também ajudou a fazer com que o PT engolisse a candidatura imposta, e os partidos aliados a vissem como uma solução natural.

Mas a crise econômica, tão forte que começa a afetar a vida no interior do país, com estados e municípios sofrendo com a queda de arrecadação, também começa a mostrar seus dentes afiados aqui no país.

A perspectiva de um crescimento negativo da economia brasileira este ano, a cada dia mais confirmada, e as dificuldades para deslanchar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma criação de marketing político, mais para alavancar a candidatura oficial do que para combater os efeitos da crise, começam a fortalecer as resistências à candidatura de Dilma.

O PAC foi lançado antes que a crise econômica ficasse explícita em setembro do ano passado, e não tem, portanto, nada a ver com um plano de políticas públicas para minorar os seus efeitos.

Ele era mais um programa de ação política para expor publicamente a imagem de boa administradora de Dilma Rousseff. Agora, momento em que teria que se transformar em um gerador de investimentos e empregos, revela toda a sua fragilidade.

No primeiro trimestre do ano, como mostrou reportagem do GLOBO, os investimentos do governo corresponderam a apenas 7,5% do total previsto para 2009, e mesmo assim porque nesta conta estão computados os gastos previstos para o ano passado que somente agora foram executados, os famosos "restos a pagar".

Se consideradas apenas as despesas do ano, a execução é de míseros 0,7% do orçamento geral. Os números, por si só, falam da incapacidade do governo de executar seus próprios programas de obras, o que não será uma boa propaganda para uma eventual campanha de Dilma Rousseff.

Com a crise econômica pressionando o cidadão comum, é previsível que a popularidade do presidente Lula não termine o ano com a força com que se apresentava até recentemente, e esse decréscimo terá reflexos não apenas no índice da sua candidata preferida à sucessão.

É possível que, assim como o PSB já começa a se rebelar contra a estratégia oficial de ter apenas um candidato da base aliada, o próprio PT encontre forças para rejeitar a candidatura de Dilma, que nunca foi a preferida do establishment partidário.

A percepção que começa a se generalizar é a de que os índices que a ministra ostenta nas pesquisas de opinião não indicam que ela tenha um futuro fácil na campanha presidencial, especialmente se o apoio do "cara" for relativizado pelos efeitos da crise econômica.

No seu melhor cenário, a ministra Dilma Rousseff aparece com um máximo de 18% da preferência, mesmo estando em evidência há mais de um ano, apresentada por Lula como "a mãe do PAC" no Rio, no lançamento das obras em favelas, em março do ano passado.

Segundo uma pesquisa recente do Vox Populi, nada menos que 49% dos entrevistados sabem que ela é a candidata de Lula, mas apenas 30% têm informações sobre ela.

A transferência de votos, mesmo sem se levar em conta os problemas econômicos, é um dos mistérios da política. E, pelo que as pesquisas de opinião estão mostrando, há um teto para essa transferência automática, seja qual for o candidato, que parece estar na casa dos 15%.

Para ir além disso, o candidato oficial terá que se valer da máquina partidária e de sua trajetória política pessoal, o que não favorece a ministra Dilma, que tem na biografia apenas sua luta armada na resistência à ditadura, o que não a distingue de tantos outros que nunca conseguiram ter votos suficientes para se eleger.

O PT pode tirar do fundo de sua cartola o nome do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, se ele for absolvido pelo Supremo Tribunal Federal da acusação de ter sido o mandante da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa.

Mas não bastará que o Supremo não o processe. Será preciso que a sociedade civil aceite a decisão e se convença de que ele realmente nada teve com aquela agressão ao direito individual de um homem do povo que se colocou no seu caminho quando ainda era o todo-poderoso ministro da Fazenda.

Essa percepção popular com relação a um abuso de poder chocante poderá ser testada no lançamento da candidatura de Palocci para o governo de São Paulo, que já está sendo preparada pelo PT paulista.




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