O Globo |
17/9/2008 |
A crise que tomou conta da economia americana está transtornando a campanha eleitoral, sem que os dois candidatos principais tenham condições de dar respostas consistentes aos desafios que terão pela frente, se eleitos. O candidato democrata Barack Obama conseguiu, não por ação própria, tirar da sua frente a vice republicana Sarah Palin e reverter o ambiente político a seu favor. Mas, além de culpar a administração Bush e, por osmose, McCain, pela crise, não tem nenhum plano consistente para apresentar ao eleitor, a não ser a promessa de corte de impostos para a classe média. Como seu vice, senador Joe Biden, foi escolhido para preencher uma falha sua na política externa, não há ninguém na campanha para ajudá-lo em outro ponto fraco, a economia. Mais uma vez a senadora Hillary Clinton é lembrada como uma alternativa mais útil à candidatura Obama neste momento de crise econômica. Ela, colada ao sucesso do governo do marido Bill Clinton na rearrumação da economia, já havia se mostrado durante as primárias mais efetiva ao lidar com aspectos da crise imobiliária do que Obama. Embora tenha tido acessos de populismo econômico, ao defender a redução do preço da gasolina durante o verão, tendo sido criticada por Obama. O candidato republicano John McCain já havia confessado durante as primárias que não entendia muito de economia, e tinha para orientá-lo Phill Graham, um economista defensor radical da desregulamentação da economia, a ponto de ter criado um problema político para a campanha, ao acusar os cidadãos americanos de terem se transformado em um bando de "choramingões" no início da crise imobiliária. O comentário acabou obrigando-o a sair oficialmente da campanha, mas há informações de que ele continua tendo voz ativa na parte econômica. Como Sarah Palin não preenche esse espaço vazio na campanha - ela preencheu outros, especialmente na direita fundamentalista dos republicanos -, resta a McCain tentar reinventar-se. E ele está usando surpreendentemente um tom populista que nada tem a ver consigo, e nem com o Partido Republicano. Há exemplos de candidatos a presidente que escolheram Wall Street como o grande inimigo, mas geralmente são democratas. Franklin Roosevelt, assumindo em meio à Grande Depressão, criticava os "inescrupulosos trocadores de dinheiro", e Harry Truman, assumindo o governo com a morte de Roosevelt, seguiu na mesma batida acusando "os sanguessugas que têm escritório em Wall Street". Buscando ficar longe de George W. Bush, especialmente no que se refere à economia, McCain tem se ligado a outros republicanos que tiveram mais sucesso a seu tempo, como Ronald Reagan. Ou então outro Roosevelt, o Teddy, seu grande herói que, paradoxalmente, tornou-se o presidente mais novo dos Estados Unidos, ao assumir o cargo aos 42 anos, com a morte de William Mckinley. McCain será, aos 72 anos, o presidente mais velho, caso seja eleito. Mas ele se vê refletido na imagem de independente de Roosevelt, um verdadeiro "maverick". Mas a linguagem de McCain sobre a crise financeira de Wall Street não se encaixa em nenhum manual republicano, e abre imensas incoerências em sua campanha, a começar por ele próprio, que nunca antes tivera nenhum tipo de atitude no Congresso a favor de uma regulamentação mais dura no mercado financeiro. Quando ele se refere aos "gatos gordos" de Wall Street, que saem dos empregos com os bolsos forrados de dinheiro por pacotes de indenizações milionárias de empresas falidas, ele finge esquecer que uma de suas principais assessoras econômicas é Carly Fiorina, que saiu com U$42 milhões do cargo de CEO da empresa de informática Hewlett Packard. Os dois candidatos, aliás, têm problemas em tratar do assunto, já que estão sendo regiamente financiados por empresas de Wall Street, embora de maneira indireta, devido às regras da eleição americana que impedem que empresas financiem diretamente candidatos. O ex-CEO da Fannie Mae, Jim Johnson, foi um dos responsáveis pela escolha do vice do Obama. De acordo com diversos levantamentos, empresas de investimento doaram milhões de dólares para ambas as campanhas. Empregados da Merryl Linch e seus familiares, o banco que foi vendido antes de quebrar para o Bank of America, doaram cerca de U$300 mil para a campanha de McCain, mais de U$100 mil do que doaram a Obama, de acordo com o Centro de Política Conseqüent, uma ONG independente. Já os empregados do Lehman Brothers, antes de quebrar, haviam doado três vezes mais para a campanha democrata. A vitória dos democratas nas eleições congressuais, após a reeleição de Bush em 2004, foi marcada por acentuados tons populistas, que nos EUA tem mais a ver com uma certa irresponsabilidade fiscal, uma política fiscal mais frouxa, gastar mais e tributar mais. A primeira coisa que os republicanos fazem ao chegar ao poder é cortar imposto dos mais ricos, enquanto os democratas procuram oferecer isenções de impostos para a grande classe média americana. Os democratas teriam competido como verdadeiros "populistas econômicos", e foram muito criticados por deixarem que o populismo superasse a ideologia. Nesta fase da campanha presidencial, quem está tentando atuar como populista econômico é o candidato republicano John McCain. Está transformando sua candidatura num monstro disforme, que aceita o fundamentalismo religioso e o populismo econômico. Ele disse certa vez que preferia perder a eleição a perder uma guerra por seu país. Nesta reta final, está mostrando que faz tudo para vencer a eleição presidencial. |