MERVAL PEREIRA - União dos opostos
Política

MERVAL PEREIRA - União dos opostos


NOVA YORK. Não há partido com melhor sensibilidade para sentir para que lado os ventos estão soprando do que o PMDB, e os movimentos na aliança governamental mostram que a biruta do partido já está mudando de direção, não tão depressa que faça os diversos grupos que estão dentro do governo perderem os últimos suspiros de poder, nem tão devagar que não permita um realinhamento para a sucessão de 2010 em boas condições políticas. A disputa pela presidência do Senado é um bom indicativo disso.

Tudo parece conspirar para que se repita com o PT, e não como farsa, a crise política que quebrou a união do PSDB e do então PFL e ajudou a derrota do PSDB na eleição de 2002.

As sucessões das presidências da Câmara e do Senado já mostram que, mais uma vez, poderão fazer vítimas na aliança governamental.

A sucessão da Câmara, que opôs o então PFL ao PSDB, foi o início do fim da aliança política que em 2002 deveria ter apoiado José Serra à sucessão de Fernando Henrique, e acabou com as principais lideranças do PFL nos braços de Lula.

O deputado Inocêncio Oliveira, que era o candidato do PFL para assumir a Câmara num rodízio previamente combinado, foi surpreendido por uma ação de bastidores do tucano Aécio Neves, desestabilizando a aliança. Quando o então presidente Fernando Henrique soube da articulação, ela já estava consumada.

Desta vez, por acordo, o PMDB, que tem o direito de presidir as duas Casas por ter as maiores bancadas, está exigindo o rodízio na Câmara, que o PT dirige por concessão do PMDB.

Mas, para que o rodízio entre os dois principais partidos de apoio ao governo permaneça valendo, havia a presunção de que o PMDB deixaria o PT assumir a presidência do Senado.

O veto de Renan Calheiros ao candidato natural do PT, o senador Tião Viana, está apenas dando início ao processo de disputa intensa que, ao que tudo indica, o PMDB revigorado nas urnas municipais vai desencadear contra o PT.

Pode ser até que a decisão do PMDB de lançar candidatura própria não se viabilize por falta de nomes de consenso dentro do próprio partido, mas apenas a manobra que está acontecendo já demonstra a impossibilidade de manter essa união PTPMDB até a eleição de 2010 sem um racha tradicional.

O presidente do PMDB, Michel Temer, de amplo acesso nas hostes oposicionistas, já tem garantido o apoio do PT para a presidência da Câmara, mas se o PMDB do Senado não aceitar o rodízio, também a disputa na Câmara ficará sem parâmetros, dando margem a que um novo fenômeno Severino Cavalcanti surja, com o apoio do baixo clero ao candidato autônomo Ciro Nogueira, do PP.

No Senado, para se eleger candidato do governo, o petista Tião Vianna depende mais dos acordos que vem fechando com o PSDB do que do apoio do PMDB, que busca em José Sarney uma alternativa partidária ao desejo do Palácio do Planalto.

Embora as coligações das últimas eleições municipais sugiram um forte alinhamento do PMDB com o PT, alianças entre PSDB e PMDB não são armações políticas banais. Muito embora o PT tenha participado de mais de 40% das vitórias de candidatos do PMDB, o PSDB esteve presente em cerca de 32% delas.

A freqüência de alianças entre os três maiores partidos teve a preponderância de alianças entre o PMDB e o PSDB. Na maioria dos estados do Norte-Nordeste, no entanto, o PMDB está muito mais fortemente aliado ao PT, por conveniências regionais que já estão se desencontrando, como é o caso da Bahia, onde o líder peemedebista Geddel Vieira Lima, embora ministro da Integração Nacional, mantém um desentendimento cordial com o governador petista Jaques Wagner, a quem derrotou na eleição para a prefeitura de Salvador.

Por sua vez, os três partidos de oposição, PSDB, DEM e PPS, que acabam de oficializar uma aliança política para a eleição de 2010, saíram das eleições municipais como a maior força política, com 1.416 prefeituras.

O presidente Lula teve recentemente o exemplo concreto de como sua base parlamentar tão grande quanto heterogênea não funciona quando há indefinição quanto ao futuro político.

Mesmo batendo seu próprio recorde de popularidade, atingindo 70% na última pesquisa do Datafolha, o presidente Lula já não tem a capacidade de ditar o comportamento de seus aliados, como na tentativa de aprovar uma reforma tributária que não agrada a governadores fortes politicamente como o de São Paulo, José Serra, que posa com Lula e defende a reforma tributária, mas mexe seus pauzinhos, inclusive no próprio PT, para inviabilizar sua aprovação.

Os próximos meses serão cruciais para os planos futuros do governo. Agora que já se sabe pelo próprio médico Lula que o paciente Brasil “sifu”, é só esperar pelos sinais da crise que chegarão mais explicitamente no primeiro trimestre do próximo ano para vermos a quantas andará o projeto sucessório oficial.

Lula, que também tem olfato de caçador, já sentiu a mudança dos ventos, e trata de se aproximar de José Serra, provável candidato do PSDB e por enquanto líder das pesquisas de opinião, para eventualmente fazer uma transição tão cordial quanto a sua com Fernando Henrique, caso se caracterize inviável uma candidatura oficial.

Serra também trata Lula a pires de leite, tendo até mesmo discordado publicamente de Fernando Henrique para defendê-lo de seus ataques, na certeza de que enquanto a crise econômica não roer sua popularidade — se é que vai mesmo roer —, o presidente será um personagem importante na sucessão presidencial, e não tê-lo como inimigo pode ser fundamental.



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