Acredito que estejamos vivendo uma dolorosa fase de cura dos desequilíbrios do passado
Nesta primeira coluna de 2012, não posso deixar de fazer minhas previsões para o ano que se inicia. Essa responsabilidade, que já é pesada e difícil em tempos normais, fica ainda mais delicada em momentos de grandes incertezas como o que vamos viver em 2012.
Depois de quatro anos de crise, antigas referências de análise econômica estão desgastadas e sem credibilidade.
Por isso, nós, economistas, navegamos em momentos quase revolucionários, quando a ruptura de valores, já estabelecidos e aceitos como válidos pelos mercados, deixa um grande vazio analítico.
Dou um exemplo desse fenômeno: os dados de dez recessões que ocorreram nas economias desenvolvidas nas últimas décadas apontam para um período médio de dois anos entre o pico e o vale dos ciclos de ajuste. Na crise que se iniciou em fins de 2007, a queda do PIB dos Estados Unidos chegou a quatro anos e serão necessários mais dois para que a economia entre em velocidade de cruzeiro novamente.
Os analistas e os economistas estão sendo obrigados a entrar no metabolismo das economias de mercado para tentar entender o que está acontecendo nesse mundo novo e, com isso, terem condições de fazer algumas previsões.
Sem as regras de bolo que o pensamento neoclássico dava a seus seguidores e sem o treinamento necessário para entender a dinâmica microeconômica dos mercados, vivem momentos de grande insegurança.
Alguns, principalmente os vinculados à maioria dos "hedge funds", jogaram a toalha e mergulharam em um niilismo muito engraçado.
Por outro lado, os economistas vinculados ao pensamento mais heterodoxo vivem momentos de euforia por entenderem que a crise atual resgata o papel dominante do Estado na economia de um país e mostra os perigos do chamado neoliberalismo anglo-saxão. A súbita paixão de alguns deles pela política econômica da Argentina peronista mostra, para mim, que entenderam muito pouco da crise que vivemos e qual o papel do Estado nas economias de mercado no novo século.
Como sempre mantive uma posição equidistante desses dois extremos, tentando aplicar ao mundo de hoje os ensinamentos de Keynes, minha visão sobre o ano de 2012 é menos pessimista. Acredito em uma recuperação lenta e gradual das economias mais importantes, principalmente em razão das políticas adotadas em vários países.
Esse prognóstico vale inclusive para a Europa. Com isso, não trabalho com uma depressão econômica e uma ruptura no sistema bancário dos países desenvolvidos. Em outras palavras, acredito que estejamos vivendo uma dolorosa fase de cura dos desequilíbrios do passado e que deve durar ainda alguns anos. Mas o capitalismo não vai entrar em colapso, como muitos pensam.
No caso do Brasil, mantenho a visão de que vamos continuar crescendo entre 3% e 3,3%, com uma taxa menor nos dois primeiros trimestres do ano e uma aceleração na sua segunda metade.
Graças à queda dos preços das commodities por conta da crise no exterior, vamos ter um alívio na inflação ao longo do ano, o que vai permitir ao BC reduzir os juros Selic para até 9,5% ao ano. Nessa questão, fico com o economista Fabio Ramos, da Quest, que trabalha com um IPCA de 5,2% para 2012.
A fonte principal do crescimento continuará a vir do consumo interno, sustentado pelo aumento dos salários, do emprego e do crédito ao consumo. Nesse cenário, o Brasil vai continuar a receber volumes expressivos de investimentos internacionais e, com isso, conseguir complementar nossa escassa poupança interna e permitir manter um nível decente de investimentos.
Finalmente trabalho com a hipótese de um pouso suave da economia chinesa, com a reaceleração de seu crescimento na parte final do ano. Nesse cenário, os termos de troca do Brasil voltarão ao nível que tem prevalecido nos últimos tempos, mantendo a força de nossas exportações e garantindo a manutenção de um deficit em conta-corrente abaixo dos 3% do PIB.
Essa visão sobre a China é um ponto importante para meu cenário de crescimento no Brasil e espero estar certo em relação a ele.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 69, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).