A presidente Dilma Rousseff passou a campanha eleitoral garantindo que
não faria nenhum ajuste fiscal, que seria desnecessário. Mas, nos
primeiros dias de governo, já anunciou um inevitável corte de gastos,
além de ter criado uma comissão coordenada pelo empresário Jorge
Gerdau para introduzir no governo o sistema de gestão por metas.
É justamente o caminho sugerido pelo trabalho conjunto do cientista
político Fernando Abrucio, o coordenador do programa "Estado para
resultados" do governo de Minas Gerais, Tadeu Barreto, e o diretor da
Macroplan, Gustavo Morelli, em um dos capítulos do livro "2022
Propostas para um Brasil Melhor no Ano do Bicentenário", que está
sendo lançado na próxima quinta-feira no Rio.
Os autores apresentam uma agenda para o aperfeiçoamento da gestão
pública no país, com o objetivo de corrigir fragilidades históricas
ainda perceptíveis, de modo a conseguir que o Brasil possa crescer
mais rapidamente de forma sustentável.
Complementando as análises dos cenários possíveis para o futuro do
país, abrangendo os próximos 11 anos, quando o Brasil completará 200
anos de independência, o livro "2022 Propostas para um Brasil Melhor
no Ano do Bicentenário", organizado pelos economistas Fábio Giambiagi
, do BNDES, e Claudio Porto, da consultoria Macroplan, dedica esse
capítulo inteiramente à questão da gestão pública, destacando a
importância central de políticas públicas competentes para a superação
de uma série de desafios nacionais. Para os organizadores da obra, não
há dúvidas de que alguns dos velhos dilemas e problemas da economia
brasileira estão presentes no cenário atual e precisam ser
enfrentados. O Brasil, segundo Giambiagi, "se encontra em plena
transição, de uma situação ainda com problemas próprios de países
emergentes, para outra que poderá alcançar uma maior abertura e
inserção global da nossa economia".
Os autores destacam que a evolução recente da gestão pública tem
marcos muito positivos, como a reforma da gestão pública de 1995, o
PPA de 2000-2003 e a Lei de Responsabilidade Fiscal, no governo de
Fernando Henrique Cardoso.
Os avanços da agenda de gestão pública no governo Lula ocorreram de
forma fragmentada, segundo os autores. Enquanto bons resultados foram
alcançados na gestão do Bolsa Família e com a criação de fóruns de
discussão das prioridades governamentais, como o Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social e as conferências setoriais, "não
houve diretrizes gerais para toda a administração pública".
Um dos maiores retrocessos, na minha opinião, ocorreu na gestão da
máquina do Estado, e não é à toa que os autores sugerem uma maior
profissionalização do serviço público, com intercambio de talentos com
o setor privado - "para oxigenar a administração pública" -,
intensificação dos processos de avaliação de desempenho e a redução de
cargos comissionados.
O caso da interferência do governo na direção da Vale, forçando a
demissão do seu presidente, Roger Agnelli, por suposto desentrosamento
entre os planos da companhia privada e os objetivos econômicos
estratégicos do governo, mostra que, ao contrário, é o governo que
quer interferir nas empresas privadas.
Outra questão grave é o aparelhamento da máquina estatal com
indicações políticas, com a vergonhosa divisão de cargos entre os
partidos da base aliada, especialmente PT e PMDB.
Segundo Abrucio "não é possível ter, em pleno século XXI, mais de 20
mil cargos comissionados na administração pública direta e múltiplas
indicações políticas nas empresas públicas e nos fundos de pensão. O
montante de indicações de livre provimento por parte do Executivo não
encontra paralelo em nenhum país desenvolvido, abrindo brechas para
ineficiência e corrupção".
O desafio, dizem os autores, está em avançar nos resultados com os
mesmos recursos materiais, humanos e financeiros disponíveis, sendo a
inovação na gestão um elemento fundamental para produzir impactos
positivos.
Entre algumas inovações que poderiam ser assimiladas para a melhoria
da gestão pública no Brasil, estão a disseminação do modelo da
administração pública por metas e indicadores, "uma inovação que ainda
tem uso restrito e é de pequena assimilação junto à classe política",
assim como a forte expansão do chamado "governo eletrônico".
Os autores recomendam ainda a efetivação de parcerias público
privadas. Nesse aspecto, o governo parece ter acordado para a
impossibilidade de realizar sozinho as obras de infraestrutura nas
estradas, aeroportos e portos do país, necessárias não apenas para a
realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, mas
também para o desenvolvimento sustentável da economia.
A atuação conjunta, ou o repasse de tarefas ao setor privado, pode ser
uma maneira de fortalecer a ação governamental, em vez de
enfraquecê-la, analisam os autores do artigo sobre gestão pública. "É
preciso superar o debate privatismo versus estatismo".
Já Claudio Porto adverte que a possibilidade de um futuro otimista ou
desastroso pode ser sintetizada em um conceito: gestão estratégica.
"Uma década é tempo suficiente para que certas políticas amadureçam e
apresentem resultados", afirma. E isso requer uma concertação entre as
principais lideranças públicas e privadas do país em torno de uma
visão estratégica de longo prazo para o país.
FONTE: O GLOBO