Polícia vê descontrole nos gastos do Banco do Brasil com publicidade,
apontados como principal fonte do esquema
Dinheiro repassado para agência de operador do esquema foi desviado
para empresas fantasmas
ANDREZA MATAIS
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
O relatório final da Polícia Federal sobre a origem do dinheiro do
mensalão aponta total descontrole nos gastos do Banco do Brasil com
publicidade e propõe que um inquérito apure o "incrível poder
discricionário" dos diretores do banco para indicar empresas que são
"agraciadas com recursos públicos".
O relatório confirma que recursos repassados pelo BB foram uma das
principais fontes do mensalão, um esquema montado para compra de apoio
político no Congresso que foi revelado pela Folha em 2005, no primeiro
mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Assinado pelo delegado Luís Zampronha, o relatório afirma que o desvio
de recursos do BB para o esquema "somente seria possível com a
participação ativa de membros da instituição financeira". A Folha teve
acesso à íntegra do relatório da PF.
O documento apresenta as conclusões de um inquérito aberto em 2007,
após a apresentação da denúncia que deu origem ao processo do mensalão
no STF (Supremo Tribunal Federal). A PF entregou o novo relatório em
fevereiro ao Supremo, que o submeteu à análise da Procuradoria-Geral
da República.
Segundo a polícia, entre 2001 e 2005, o BB retirou R$ 151,9 milhões de
sua cota no Fundo Visanet, criado por vários bancos para promover a
bandeira de cartões Visa.
Desse total, R$ 91,9 milhões foram repassados à DNA Propaganda, uma
das agências de publicidade do empresário Marcos Valério -acusado de
ser o principal operador do mensalão.
A polícia concluiu que parte do dinheiro jamais chegou aos
destinatários finais indicados nos documentos apresentados pela
agência e foi desviada por Valério, seus sócios e funcionários.
Outra parte foi destinada a negócios fictícios ou empresas que não
comprovaram a realização dos serviços para os quais foram contratadas.
Entre as 15 empresas que mais receberam recursos do Visanet em 2003,
há empresas que não existiam formalmente na época dos repasses, como a
Carre Airports, que ficou com R$ 1 milhão.
Há casos em que a DNA, por meio de manobras contábeis e bancárias, se
"apropriou" diretamente de recursos destinados a ações de marketing do
BB. Em 2003, a DNA retirou, como "bônus", R$ 579 mil de um contrato de
R$ 2,5 milhões assinado com uma casa de shows.
A PF também encontrou empresas, como a Editora Guia, que aparecem nas
planilhas com mais recursos do que elas dizem ter recebido.
Há, por fim, empresas que, segundo a PF, não apresentaram documentos
que "comprovem a efetiva veiculação de publicidade". O relatório
menciona entre elas a TV Globo, que recebeu R$ 2,8 milhões em 2003
para "publicidade futura".
O fundo Visanet, criado em 2001 e extinto em novembro de 2005, foi
formado por 26 bancos, mas os gastos realizados pela DNA e examinados
pela PF estavam sob responsabilidade do BB.
O então diretor de marketing do BB, Henrique Pizzolato, filiado ao PT,
havia trabalhado na campanha que elegeu o presidente Lula em 2002.
Segundo a PF, ele tinha total autonomia para escolher os beneficiários
dos recursos que administrava.
Segundo a polícia, os valores desviados dos contratos com o BB eram
usados por Valério para abater parcelas de dois empréstimos que ele
tomou nos bancos Rural e BMG para repassar ao PT.