O dilema de Lula no segundo turno
Política

O dilema de Lula no segundo turno


O dilema de Lula

O risco de herdar uma derrota política em São Paulo
faz o presidente rever sua participação no segundo
turno das eleições, que deve ser pequena e discreta


Otávio Cabral

Ricardo Stuckert/PR
DE OLHOS BEM ABERTOS
Lula, em audiência com Dilma e Serra no Planalto: imagem de cordialidade que irritou Marta e o PT

Há duas maneiras de visualizar o resultado das eleições municipais tendo o Palácio do Planalto como referencial. De fora para dentro, o governo pode comemorar uma vitória estrondosa ao eleger 4.048 dos 5 563 prefeitos, incluindo os candidatos dos partidos aliados. De dentro para fora, o sucesso é relativo. Nas três cidades mais importantes do país, onde também estão os três maiores colégios eleitorais, a paisagem é de derrota. Em São Paulo, a ex-ministra Marta Suplicy, do PT, que contou com o apoio direto de Lula, chega ao segundo turno fragilizada pelo impressionante desempenho do atual prefeito, Gilberto Kassab, do DEM. No Rio de Janeiro, Lula terá dois desafetos disputando o segundo turno: Eduardo Paes, do PMDB (aliado recente e digerível por ter sido o sub-relator da CPI dos Correios, leia-se mensalão), e Fernando Gabeira, do PV. Em Belo Horizonte, Lula abençoou a aliança entre o PT e o PSDB em torno do candidato Marcio Lacerda, que, apesar de ter avançado, enfrentará uma eleição muito difícil. O apoio do presidente, ainda assim, é considerado por alguns como decisivo. É na disputa paulistana, porém, que Lula enfrenta seu maior dilema. Envolver-se diretamente no pleito representaria a antecipação do provável embate entre ele e o governador de São Paulo, José Serra, na campanha presidencial de 2010. O primeiro turno já deu ao governo algumas pistas sobre os riscos de uma decisão errada.

"Lula tinha a expectativa de usar sua popularidade para transferir votos e ser o grande eleitor das principais cidades. Como a expectativa foi frustrada, pode-se considerar que o presidente colheu um fracasso político no primeiro turno", analisa o cientista político Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise, autor do livro A Cabeça do Eleitor. Para evitar uma derrota ainda maior, o governo optou pela cautela. Os ministros estão liberados para participar das campanhas, mas Lula, por enquanto, adotará um comportamento discreto. No próximo dia 26, haverá segundo turno em 29 cidades. Em dezesseis delas, o presidente não pretende passar nem perto, já que a disputa envolve representantes de partidos aliados. Nas outras treze, ele deve se limitar a gravar mensagens de apoio e a participar de eventos fechados. Sua estratégia foi definida após a divulgação da pesquisa que apontou Marta 17 pontos atrás de Kassab. O PT passou a pressionar Lula para que mergulhasse na campanha de Marta. Mas o presidente recusou. Fez apenas uma gravação protocolar para o programa de TV e, como parte dessa estratégia, na sexta-feira acompanhou a candidata petista a um encontro com pastores evangélicos. Alegando problemas de agenda, recusou-se a participar de um comício.

Gustavo Miranda/Ag. Globo
DE OLHOS FECHADOS
O ministro José Múcio: distância de onde houver disputa entre aliados

Um episódio ocorrido no primeiro turno influenciou a decisão do presidente de manter uma distância estratégica na campanha paulistana. Em setembro, por pressão do PT, Lula foi a Natal tentar socorrer a candidata Fátima Bezerra, que estava em dificuldades eleitorais. No palanque, ele atacou a candidata rival, Micarla de Sousa, do PV, sua família e um dos patrocinadores políticos da campanha, o senador José Agripino, líder do DEM. Micarla, porém, venceu no primeiro turno. A oposição aproveitou para nacionalizar a vitória em Natal, atrelando o resultado da eleição à presença de Lula na cidade. Na terça-feira passada, o senador Agripino passou mais de duas horas discursando na tribuna do Senado e recebendo elogios por ter derrotado o presidente. Irritado, Lula reconheceu que sua atitude deu à oposição discurso para um evento político sem nenhuma importância. "Ninguém vai me empurrar outra Micarla", desabafou.

Há ainda outro componente que serve como justificativa para o presidente restringir sua participação nas eleições: o risco de criar área de atrito entre os aliados, principalmente os do PMDB. O partido mais poderoso do Congresso ratificou nas urnas a condição de legenda com mais prefeitos e deve se consolidar de agora em diante como sócio majoritário do governo. Assim, onde houver um peemedebista na disputa, Lula se afastará, mesmo onde gostaria de apoiar um velho companheiro de partido – como em Salvador, onde o petista Walter Pinheiro disputa contra o atual prefeito, João Henrique, do PMDB. "O governo não pode passar nem pelo espaço aéreo das cidades onde há disputa entre dois partidos da base", afirma o ministro das Relações Institucionais, José Múcio. A agenda oficial também ajudou Lula a se distanciar do segundo turno. Ele viaja neste domingo ao exterior, retornando apenas às vésperas do fim da campanha. Na semana passada, Lula deixou-se fotografar em seu gabinete, descontraído, acompanhado da ministra Dilma Rousseff e do governador José Serra, os dois principais candidatos à sua sucessão. O encontro, oficialmente, era para discutir uma obra ferroviária no estado. A imagem irritou Marta Suplicy e os petistas, mas o objetivo dela era mostrar que, apesar do dilema, o presidente está acima de assuntos "menores".




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