O interior da Terra pode esconder oceanos
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O interior da Terra pode esconder oceanos


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Um mistério no centro da Terra

Pesquisa americana que sugere a existência de água 
nas profundezas do planeta parece nascida de uma 
das aventuras fantásticas de Júlio Verne


Leandro Narloch

Divulgação
No coração do planeta
Cena do filme Viagem ao Centro da Terra, de 2008. O fascínio de um mundo desconhecido
sob nossos pés

Em Viagem ao Centro da Terra, o clássico de Júlio Verne, um grupo de aventureiros desce por uma fenda na crosta terrestre e encontra um mundo inteiramente novo, dentro de um espaço oco existente no centro do planeta. Nesse universo subterrâneo há ilhas, um oceano e até um sistema misterioso de iluminação. O francês Verne, que morreu em 1905, escreveu sobre viagens ao fundo do mar, à Lua e pelos ares muito antes que o submarino moderno, o foguete e o avião fossem inventados. Agora parece que ele também estava correto, pelo menos em parte, sobre a existência de um mar no interior da Terra. Um estudo produzido por cientistas da Universidade Estadual do Oregon, nos Estados Unidos, divulgado na quinta-feira passada, sugere a existência de grandes quantidades de água entre 250 e 650 quilômetros abaixo da crosta terrestre. Não são lagos nem cascatas encantadoras como os da ficção científica de Verne. Mas, de qualquer forma, a pesquisa revela a presença de água em profundidades antes inimagináveis.

O objetivo dos oceanógrafos era fazer uma análise inédita da condutividade elétrica do manto terrestre, em profundidades que chegaram a 1 600 quilômetros. O manto é a camada viscosa, com quase 3 000 quilômetros de espessura, que separa a superfície do núcleo sólido da Terra. O estudo mediu a condutividade em 59 pontos do planeta. Percebeu-se então que em certas partes do manto a capacidade de conduzir energia é dez vezes maior do que em outras áreas. "É provável que haja água no interior das rochas, já que ela é um ótimo condutor de eletricidade", disse a VEJA o americano Adam Schultz, geólogo e um dos autores da pesquisa.

A explicação para a existência dessa umidade está relacionada ao movimento das placas tectônicas, os blocos rígidos que sustentam a superfície da Terra. As placas se moveram e se chocaram, separando os continentes, formando cordilheiras e áreas de subducção – quando uma placa empurra outra para baixo. A placa que afunda leva para as profundezas elementos da superfície, como a umidade e até mesmo água do mar. A água só é liberada se a placa tectônica derreter, formando o magma, as rochas incandescentes que alimentam vulcões. Se isso não acontecer, ela permanecerá entre as rochas.

No mapa-múndi criado pelos pesquisadores, as áreas que abrigariam água nas profundezas são justamente as repletas de vulcões e terremotos, como a costa oeste americana, o norte do Oceano Pacífico e o Japão. "Pensávamos que havia perto de um centésimo de água dentro das rochas do manto. Uma condutividade elétrica tão alta sugere que a quantidade de água possa ser dez vezes maior", diz o geofísico Marcelo Assumpção, da Universidade de São Paulo. Os pesquisadores não conseguem determinar o tamanho das porções de água nem a forma que ela teria. Mas, devido às elevadas pressão e temperatura, dificilmente permaneceria em forma líquida. A presença de água é a explicação mais fascinante para a alta condutividade dessas regiões, mas não é a única possível. O manto terrestre é uma mistura heterogênea de rochas pastosas, formada por minerais diferentes. Em áreas com maior presença de carbono, a condutividade elétrica é tão alta quanto em rochas úmidas. Como Júlio Verne mostrou, o centro da Terra é repleto de mistérios.

Com reportagem de Paula Neiva


Oceanos submersos

Os pontos brancos e verdes indicam as 59 regiões do planeta onde os pesquisadores da Universidade Estadual de Oregon mediram a condutividade elétrica do manto terrestre

As áreas em laranja do mapa são as que têm condutividade elétrica mais alta. Elas abrigariam água entre 250 e 650 quilômetros abaixo do fundo do mar

A pesquisa foi feita com uma espécie de tomografia do campo magnético até a profundidade de 1 600 quilômetros. Para evitar interferências, o estudo evitou medições perto dos polos magnéticos da Terra





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